Paulo Ferreira, autor dos documentários “Açores, um novo desígnio” e dos episódios “Naturalmente Flores” e “Naturalmente Graciosa”, sente-se como “um filho de cada ilha por onde passa”. Obteve grandes audiências televisivas com os episódios sobre as Flores e a Graciosa, e no presente ano estreará o episódio sobre a ilha de São Jorge. O objectivo é filmar em todas as ilhas pois “a beleza natural dos Açores é distinta do resto do mundo”.
Correio dos Açores – Que trabalhos tem desenvolvido na Região?
Paulo Ferreira (realizador) – Os dois documentários que realizei, um sobre as Flores e outro sobre a Graciosa, têm sido parte de um processo contínuo. Anteriormente, realizei um primeiro projecto em quatro ilhas, que foi uma espécie de antevisão do potencial que eu poderia explorar em cada uma das ilhas do arquipélago. Esse projecto chama-se “Açores, um novo desígnio” e está disponível nas redes sociais. Foi uma primeira abordagem ao arquipélago.
Depois de conhecer essas ilhas, achei por bem criar uma série documental, que está a ser divulgada pela SIC – o documentário sobre as Flores também foi exibido pela RTP Açores. Desta série documental, primeiramente, produzi o documentário sobre as Flores, uma ilha que me é muito querida. É uma ilha muito natural, e, sendo que trabalho por várias partes do mundo e conheço outros locais, fiquei apaixonado pela sua natureza intocada. Grande parte da ilha ainda mantém essa característica de preservação.
Depois, realizei o documentário sobre a ilha Graciosa, que faz parte dessa série de documentários que tenho a intenção de concluir. Esta ilha também fascinou-me bastante, pois, apesar de ser pequena em termos de dimensão, é grande na sua diversidade e unicidade natural, tanto em fauna quanto em flora. Existem espécies únicas, que provavelmente irão dar origem a outro documentário sobre a ilha.
Actualmente, estou a trabalhar no documentário sobre a Ilha de São Jorge. Estou na fase de edição e espero que esteja concluído para ser divulgado no Dia da Terra, 22 de Abril, na própria ilha de São Jorge.
E como foi gravar este último projecto na ilha de São Jorge?
Cada ilha tem-me surpreendido, pois, quando se visita enquanto turista, não conseguimos conhecer profundamente o potencial de cada uma, nem as suas particularidades. Isso está muito presente na cultura e nas pessoas, no convívio humano que se estabelece nessas ilhas. Tem sido uma experiência excelente, porque tenho conhecido pessoas fantásticas e tenho ouvido e vivenciado histórias mirabolantes que, quem sabe, um dia irei publicar num livro. A Ilha de São Jorge é muito longa, grande e estreita, portanto geograficamente apresenta várias adversidades. Além disso, é muito distinta entre a parte norte e a parte sul do seu território.
Existe a intenção de gravar episódios em todas as ilhas, correcto?
Sim, este ano vou realizar mais uma recolha de imagens. Já estive na ilha do Pico há dois anos e vou regressar este ano para concluir o documentário. Provavelmente, no próximo ano, o documentário que irei produzir será sobre a ilha do Pico.
Qual tem sido o feedback do público? Como têm recebido estes documentários?
A nível de audiências televisivas, tem sido espectacular, pois os documentários têm superado algumas audiências habituais de programas da BBC e da National Geographic, que costumam ser exibidas antes do Jornal da Tarde. São programas com orçamentos milionários, e eu, com uma verba muito menor, consegui fazer um óptimo trabalho. Estamos a falar de um custo de produção de 12 a 15 mil euros para cada documentário. Este é um documentário português, e não estávamos habituados a ver documentários de natureza realizados em Portugal com esta qualidade.
A aceitação por parte das pessoas, especialmente dos açorianos, também tem sido boa. Como mencionei, tive contacto com muitas pessoas de diversos departamentos ligados à ciência e à natureza. Tenho recebido uma óptima aceitação e sinto-me quase como um filho de cada uma das ilhas. Posso contar-lhe uma história: no ano passado, enquanto recolhia imagens na ilha de São Jorge, aconteceu uma situação curiosa na Fajã do Sanguinhal – uma fajã praticamente abandonada. Estava a recolher imagens lá e, quando regressei, deparei-me com um tupperware com sopa quente, um pão e uma peça de fruta.
Que potencialidades vê nos Açores para a realização de documentários deste género?
Eu gostaria muito que os lugares mais naturais, com fauna e flora autóctones, fossem preservados. Por exemplo, na ilha Graciosa, existem espécies únicas, como uma ave da qual gostaria de fazer um documentário. Há plantas e aves restritas a determinados ilhéus, e seria importante que no futuro essas espécies fossem protegidas. Tratar as ilhas como um jardim pode atrair muitos turistas e deixar tudo muito bonito, contudo isso pode fazer com que se perca o conteúdo e a alma do arquipélago. A beleza natural dos Açores é distinta do resto do mundo.
José Henrique Andrade