Fundada pelos irmãos Tiago Rosas e Francisco Rosas, a Palco de Ilusões desempenha funções de realização, produção e edição de projectos audiovisuais, como também efectuam trabalhos enquanto técnicos de luz e som. Com o ano de 2024 marcado pelo crescimento significativo da sua produção, para o presente ano – para além do lançamento do filme sobre a vida e obra de Alice Moderno – espera-se a produção do documentário baseado na história da electrificação dos Açores (em parceria com a EDA) e a pós-produção da nova ficção de Zeca Medeiros.
Correio dos Açores – “Alice – Mulher Moderna” é o seu novo filme, em que celebra a vida e obra de Alice Moderno. Para si, enquanto realizador desta obra, que importância tem esta figura na história da Região e do país?
Tiago Rosas (Palco de Ilusões) – A Palco de Ilusões foi contratada para fazer som e luz num evento da Câmara Municipal de Ponta Delgada que homenageava Alice Moderno. Ao passar pelo evento para apoiar a nossa equipa técnica, ouvi vários investigadores a descreverem esta figura extraordinária: professora, escritora, jornalista, primeira mulher a frequentar o Liceu de Ponta Delgada e uma defensora incansável dos direitos dos animais e das mulheres. Também descobri que partilhou a sua vida com Maria Evelina, uma relação que, ao contexto da época, reconheço como pioneira em muitos aspectos sociais.
Fiquei profundamente admirado com a sua história. Num mundo cada vez mais superficial, precisamos de exemplos como Alice Moderno — verdadeiros ícones que nos inspirem. Alice é, sem dúvida, uma heroína digna de reconhecimento.
O percurso até ao filme levou cerca de dois anos, envolvendo a obtenção de financiamento, pesquisa intensa na biblioteca e entrevistas. A Margarida Benevides já tinha feito um espectáculo sobre Alice Moderno, e decidimos unir esforços.
Foi criado o guião, adaptado o texto da Margarida e filmada uma visita guiada pelo professor Teófilo Braga aos locais mais emblemáticos da vida de Alice Moderno. A Margarida entregou-se completamente à personagem resultando para mim num quadro muito credível. Como sou admirador do trabalho da Catarina Raposo propus-lhe que fizesse a composição da banda sonora, uma parte essencial de qualquer filme. Agora, estamos muito próximos da estreia!
Que balanço faz de 2024? Como correu em termos de produção?
O ano de 2024 foi marcante para a Palco de Ilusões, com um crescimento significativo na produção, o que nos levou a contratar mais uma pessoa para a equipa.
Em 2025, iremos estrear vários projectos, como o filme “Alice – Mulher Moderna”, os documentários “Jean Sébastien Beurreu – Une Symphonie en Vert e Raizarte – Uma Janela para o Mundo”, ambos realizados por Francisco Rosas, e “O Mistério do Arquipélago Flutuante”, uma ficção musical de Zeca Medeiros.
Para além de realizarmos diversas transmissões online, trabalhámos em diversos outros projectos, incluindo videoclipes, a série “A Poesia é para Comer”, vídeoaulas de Viola da Terra com o Rafael Carvalho, e a gravação do VSTi (Tecnologia de Estudio Virtual) da Viola da Terra da ilha Terceira com Evandro Meneses. Foi um ano de muito trabalho e resultados gratificantes.
Que projectos tem em mente para este ano? Quais são os grandes objectivos?
Em 2025, além de finalizarmos a pós-produção do filme de Zeca Medeiros, que esperamos estrear em Abril, estamos a concluir a pré-produção de uma curta-metragem com fantoches baseada na lenda das Sete Cidades. Também estamos a desenvolver uma longa-metragem de ficção que explora a riqueza cultural em torno da nossa viola de dois corações e o documentário “Ilhas de Luz” baseado na história da electrificação dos Açores, em parceria com a EDA.
Estamos expectantes no resultado das alterações aos financiamentos do Governo para a cultura e as mudanças no RJAAC irão certamente determinar o futuro da produção cultural na Região. Não obstante, tencionamos continuar a crescer, abraçando mais projectos, mas sempre de forma a permanecermos como uma referência na produção audiovisual açoriana de qualidade.
Qual a sua visão sobre o panorama cultural em São Miguel?
Sempre existiram muitos criadores de arte com qualidade em São Miguel e nos Açores, acho mesmo que a insularidade é um factor que potencia a criatividade e a vontade de nos exprimirmos.
A cultura em São Miguel enfrenta desafios semelhantes ao restante arquipélago e país, que resultam da falta de visão estratégica por parte dos governantes. A cultura, quando encarada como investimento e não como custo, tem um potencial imenso como motor de desenvolvimento económico.
Investir em cultura e nos agentes culturais locais não só fortalece a nossa identidade, como também estimula a economia regional. O dinheiro investido permanece na Região, seja em remuneração dos agentes culturais, compras de materiais, ou consumo em restaurantes, pequeno comércio, etc. Cria-se um ciclo económico virtuoso, e sendo devidamente financiada, transforma-se numa indústria produtiva muito relevante.
Além disso, a cultura é um poderoso atractivo turístico. Em tempos onde qualquer destino está a poucas horas de distância, destacar-nos pela nossa identidade cultural atrai um público diferenciado, interessado e respeitador.
A promoção de produções culturais diferenciadas e de qualidade também contribui para divulgar a Região a nível global.
Algo que queira acrescentar
Recordo-me de uma entrevista ao Presidente da Câmara de Viena durante a pandemia. Quando questionado sobre quanto gastou com a ópera nessa altura particularmente difícil, respondeu: “Gastar? Nada! Isso é investimento. Cada euro investido multiplica-se por dez. Quem me dera ter mais recursos para investir em cultura!” É esta mentalidade que precisamos para entender que a cultura não é um custo, mas sim uma alavanca essencial para o progresso económico e social.
Tenho esperança que a Capital Portuguesa da Cultura em 2026, bem como a celebração dos 600 anos da descoberta dos Açores em 2027, sejam um pretexto para esta mudança de paradigma no financiamento da Cultura nos Açores.
José Henrique Andrade
