Apesar de não ter sido directamente afectado pelos anunciados cortes de verbas do Ministério da Educação a centros de investigação classificados com “Bom” ou “Muito Bom”, o Centro de Biotecnologia dos Açores viu o seu financiamento reduzido devido a uma descida na avaliação científica atribuída pelo FCT. Em entrevista ao ‘Correio dos Açores’, o director do CBA, Duarte Mendonça, explica que o centro vai contestar a classificação obtida, sublinhando que os critérios utilizados por painéis internacionais nem sempre reflectem a realidade insular.
Correio dos Açores – Fala-se de um corte abrupto no financiamento do Ministério da Educação a centros de investigação com avaliação de “Bom” e “Muito Bom”. Esta é uma realidade do CBA?
Duarte Mendonça (investigador e Director do Centro de Biotecnologia dos Açores) – A situação do CBA é um pouco diferente, porque, pelo que percebi, alguns centros que tiveram classificação de “Muito Bom” contestaram as notas e os montantes atribuídos. Como não foi esse o caso do CBA, não sei se estaremos exactamente na mesma situação.
Tentei perceber melhor o assunto, até porque fui surpreendido com essa questão ontem e não estava devidamente preparado. Falei especificamente do Centro de Biotecnologia, que obteve uma classificação inferior à que tinha anteriormente, e que, de facto, vamos contestar. Quanto aos centros que obtiveram “Muito Bom”, não posso comentar porque desconheço os valores em causa.
O que pude apurar é que a questão está relacionada com uma das componentes do financiamento — o financiamento base — onde existe uma discrepância relativamente aos centros classificados com “Excelente”.
No caso do CBA, a redução do financiamento deve-se directamente à classificação agora obtida. Refiro-me especificamente ao nosso centro, sem querer extrapolar para outros. Não queremos criar alarido, porque isto é uma questão de análise do painel de avaliação. Claro que consideramos que deveríamos ter uma classificação mais alta, mas, geralmente, estas avaliações são feitas por painéis internacionais, habituados a realidades que não correspondem necessariamente à nossa, aqui em Portugal.
Temos algumas dificuldades, nomeadamente na previsibilidade e nos montantes de financiamento. Manter equipas e ser competitivo torna-se ainda mais desafiante nos Açores, devido à nossa dimensão reduzida. Quando o financiamento não é regular — o que acontece tanto no plano nacional como regional — enfrentamos sérias limitações. Este é um problema recorrente, com um financiamento extremamente irregular e muitas vezes indivisível.
De que forma é que o CBA pretende enfrentar as respectivas adversidades?
O nosso trabalho passa não só por conhecer e estudar os nossos recursos naturais, mas, sobretudo, por valorizá-los e aproveitá-los para gerar valor para a Região. Esse é o nosso objectivo.
Contudo, a biotecnologia é uma área que exige recursos humanos e técnicos especializados. Se quisermos ser competitivos a nível internacional e gerar resultados significativos, não podemos depender de incertezas no financiamento, nem de apoios limitados, como infelizmente acontece na Região.
Se a Região quiser realmente aproveitar os seus recursos, tem de investir seriamente na ciência e na tecnologia, precisamente nas unidades de investigação que estão justamente a trabalhar nesse sentido.
Qual o papel deste centro de
investigação para os Açores?
O Centro de Biotecnologia, integrado na Universidade dos Açores, tem dois pólos de investigação: um em Angra do Heroísmo e outro em Ponta Delgada. Estamos vocacionados para a exploração biotecnológica dos recursos naturais dos Açores, com especial enfoque no seu potencial agrícola, bioindustrial, cosmético e até na área da saúde.
Quanto a projectos de investigação em curso ou a iniciar brevemente, há algum destaque?
Temos vários projectos, tanto a nível europeu como nacional, centrados no aproveitamento dos recursos naturais dos Açores — seja para a extracção de moléculas com aplicações cosméticas, seja no estudo e valorização dos recursos genéticos vegetais e animais da Região. O objectivo é melhorá-los e torná-los mais competitivos, quer no sector agrícola, quer noutros sectores de actividade.
Trabalhamos também em estreita colaboração com empresas. Temos, inclusive, membros dessas empresas a trabalhar nos nossos laboratórios, o que reforça a componente de transferência de conhecimento. Essa ligação com o sector empresarial é essencial para rentabilizar os recursos regionais.
Neste momento, contamos com 21 investigadores doutorados. Além disso, temos vários técnicos e jovens investigadores integrados através de diferentes programas. O nosso núcleo duro, contudo, é composto por esses 21 doutorados.
José Henrique Andrade