Edit Template

“ É fundamental e é urgente termos uma política adequada que promova o acolhimento, integração e inclusão das pessoas que vêm viver para os Açores”, afirma Leoter Viegas

Com as alterações feitas à lei de imigração, a entrada de pessoas em Portugal, e consequentemente nos Açores, ficará mais dificultada. Pelo menos é essa a opinião de Leoter Viegas, presidente da AIPA, que revelou, ao Correio dos Açores, quais são as implicações que as alterações terão, como poderão influenciar a entrada de mão-de-obra nos Açores, bem como sublinhou que o número de pedidos de apoio à AIPA tem aumentado.

Correio dos Açores – Como é que as alterações que foram feitas à lei de imigração podem prejudicar a vinda de mais pessoas para os Açores?
Leoter Viegas (Presidente da AIPA) – O que mais nos aflige nesta alteração da lei de estrangeiros tem a ver com a preocupação do Governo em regular os fluxos migratórios em Portugal, regular e restringir também. Mas não há uma atenção às políticas de acolhimento, inclusão e integração dos imigrantes. Nós não estamos contra a regulação dos fluxos migratórios em Portugal, é preciso que haja regulação, é preciso que haja imigração regulada, segura e ordenada, mas o foco não pode ser somente na política de regulação dos fluxos, mas sim em políticas que também tenham a ver com inclusão dos imigrantes e serviço de apoio aos imigrantes. Tem de haver uma política que tenha a ver com integração, acesso dos imigrantes aos cuidados de saúde e à educação. Tem de haver apoio e maior investimento nas aulas e cursos de português para imigrantes, assim como desburocratização e maior facilidade dos imigrantes aos serviços públicos, nomeadamente a AIMA, o que não tem sido fácil, principalmente no território continental português. Toda essa política deveria ser uma política devidamente integrada. E por isso, nós defendemos também uma política mais justa, equilibrada e moderada para os imigrantes. Relativamente alteração específica da lei. Basicamente houve três alterações: tem a ver com o fim de visto de procura trabalho para alguns imigrantes, porque os imigrantes que têm o visto gold continuam a ter; o fim da possibilidade dos imigrantes da CPLP entrarem com qualquer tipo de visto, de forma legal, em Portugal e depois no território português obter a residência da CPLP terminou. Qualquer imigrante da CPLP, se quiser obter uma autorização de residência da CPLP, deve entrar com o visto de residência. E uma terceira alteração tem a ver com reagrupamento familiar e esta é, na nossa opinião, a alteração mais significativa uma vez que tem a ver com o facto de os imigrantes para pedirem reagrupamento familiar terão que ir residir em Portugal a pelo menos dois anos. A excepção a esta obrigatoriedade são os imigrantes que têm filhos a seu cargo, podem pedir reagrupamento familiar antes de dois anos. Por outro lado, os imigrantes que têm maridos ou esposas, têm que residir em Portugal, para pedir o reagrupamento familiar, pelo menos durante 15 meses e terão que comprovar que a relação já existia há pelo menos 12 meses. Essas três alterações são alterações significativas.
A questão que se coloca é, por exemplo, relativamente à questão do visto de procura de trabalho, o Governo diz que é somente para pessoas altamente qualificadas e pessoas que tenham que visto Gold. A questão é: o que é ser altamente qualificado? Estamos a falar de cientistas, engenheiros, médicos, advogados, economistas ou pessoas especialistas em inteligência artificial? Um imigrante que seja um bom pedreiro, bom marceneiro ou bom carpinteiro não é uma pessoa qualificada? Portanto, há aqui ainda essa questão que deve ser regular e deve ser esclarecida. Mas o foco principal, em nosso entender, deve ser outro. Mesmo imigrantes que residem em Portugal, têm imensas dificuldades na renovação dos seus títulos de residência, inclusive nos Açores existem algumas situações assim. E isto acontece porque há excesso de burocracia. A AIMA, no continente particularmente, não funciona de forma eficaz para que os imigrantes possam renovar a tempo e hora a sua alteração de residência.
Temos pessoas que residem nos Açores e que andam há um ano à espera do seu cartão. Já fizeram o pagamento, já fizeram todo o processo e estão à espera que o cartão chegue a casa há um ano. Isso cria uma indecisão, uma incerteza nos imigrantes. Um imigrante nessa situação não pode sair do país porque não tem o seu cartão de residência. E depois, por outro lado, alguns imigrantes esperam muito tempo para o agendamento. O que para nós é preocupante porque esses imigrantes, apesar de existir um decreto-lei que diz que todo documento caducado é válido até 15 de Outubro, e hoje é dia 7, estamos à espera que haja um novo decreto-lei para prorrogar o documento dos imigrantes.
Porque se as pessoas não têm acesso rápido à AIMA para renovar os seus documentos, obviamente, que ficam numa situação de enorme fragilidade social.

Em sua opinião essas alterações que ocorreram à lei não vão dificultar, ainda mais, a entrada de pessoas em Portugal?
Obviamente que sim. Essa alteração à lei, no nosso entender, o que vai gerar é uma maior restrição dos imigrantes e vai gerar também a possibilidade de maior número de imigrantes serem notificados para abandonar o país. O que nós temos a assistido nos últimos tempos é a mudança de regras e de procedimentos, sucessivamente. Aquilo a que nós chamamos de mudar de regras a meio do jogo.
Anteriormente, e isso é um exemplo prático, um imigrante para obter uma autorização de residência ou para a renovar tinha que comprovar vários documentos: comprovativo de meio e subsistência (através de declaração de IRS, de nota de liquidação de IRS ou através do contrato de trabalho). Depois, tinha que provar também que tinha meio de subsistência (através do contrato de arrendamento ou do seu recibo, através de um atestado de resistência da junta de freguesia era suficiente provar). Mas, na semana passada, recebemos uma orientação de que atestado de residência emitido pela junta de freguesia já não é suficiente como meio comprovativo de alojamento. Solicitam ao imigrante caderneta predial dos senhorios, uma declaração do senhorio autenticado na conservatória, ou seja, um conjunto de documentos. Isto não está muito claro e, na nossa opinião, prejudica uma boa integração dos imigrantes. Corremos o risco de dar uma informação hoje e daqui a dois ou três dias essa informação está errada. Não há, no nosso entender, uma estabilidade e uma coerência nos procedimentos, o que vem a ser prejudicial.

Tendo em conta as alterações à lei, vai-se sentir, ainda mais, a falta de mão-de-obra?
Em Portugal, na Europa, e, obviamente, nos Açores, nós sofremos um problema que tem a ver com desertificação e envelhecimento da população, o que gera escassez de mão-de-obra em alguns sectores de actividade, principalmente os que estão ligados à restauração, ao turismo, ao comércio, à agricultura e à construção civil.
Nós, na semana passada, vimos uma estatística de que até 2100, Portugal pode vir a perder mais de 2 milhões de pessoas, onde estão incluídos os açorianos. E uma das formas, no nosso entender, de mitigar esse problema tem a ver com uma boa política de imigração.
Uma política de imigração que tem como foco o acolhimento, integração e inclusão dos imigrantes que vêm a viver para Portugal. Obviamente que os Açores têm uma economia que está a crescer e tem estado a criar emprego. Nos últimos dados de que tenho conhecimento, a taxa de desemprego nos Açores rondava os cinco por cento. Portanto é uma economia que precisa de pessoas para trabalhar. E muitas empresas têm dificuldade em encontrar localmente mão-de-obra disponível, recorrendo por isso, muitas vezes, a mão-de-obra imigrante. É importante que nós possamos criar condições para que esses imigrantes possam estar bem integrados na nossa Região e, desta forma, criar a riqueza para a própria Região e para o país.
E é sublinhar que a política de imigração e a política regulação dos fluxos imigratórios não depende do Governo Regional, mas sim do Governo da República. E é preciso dizer também que é a um nível regional, e ao contrário daquilo que se passa ao nível nacional, nós temos uma boa articulação entre o poder político, o poder autárquico e as organizações da sociedade civil. Aqui há essa rede de apoio onde conseguimos ter, nos Açores, uma política adequada de acolhimento dos imigrantes e de sensibilização na sociedade para as questões das imigrações. Mas é sempre possível fazermos mais, é sempre possível irmos mais além. Ir mais além significa, em primeiro lugar, possibilitar que os imigrantes possam contribuir para o fortalecimento da economia nos Açores. Porque essas pessoas vêm cá, exactamente, para isso. Vêm para trabalhar e para contribuir para o fortalecimento da economia dos Açores.
Logo é importante, é fundamental e é urgente termos uma política adequada que promova o acolhimento, integração e inclusão das pessoas que vêm viver para os Açores. E a AIPA está, e sempre esteve, disponível para contribuir tanto com o Governo Regional dos Açores, como com as Câmaras Municipais para agilizar esse processo, porque esta é a nossa missão.

A AIPA tem recebido muitos pedidos de apoio?
Tem aumentado ao longo dos anos. Nós, nos Açores, fomos ver a evolução da população estrangeira nos Açores e estamos a falar de uma população onde o último dado disponível, que diz respeito ao ano de 2023, diz-nos que residiam nos Açores cerca de 6200 imigrantes, provenientes de mais de 98 países diferentes.
Mas os dados de 2024, e com a nossa experiência em 2025, acreditamos que esse número está totalmente ultrapassado. Nós estimamos que a população imigrante, a residir nos Açores, deverá rondar entre 8000 e as 9000 pessoas. O que não é problemático. Num total de 2400.000 mil pessoas que residem no arquipélago dos Açores, ter 9000 de estrangeiros não é problemático, até porque a esmagadora maioria dos imigrantes que vêm viver para os Açores estão a trabalhar ou estão a estudar. Portanto o que nós devemos ter aqui é, exactamente, essa política de integração.
A procura nos nossos gabinetes tem aumentado, como é óbvio. Nós temos um gabinete de apoio ao imigrante que funciona aqui em São Miguel, temos outro gabinete de apoio ao imigrante que funciona em Angra do Heroísmo, que nós chamamos o CLAIM (Centro Local de Apoio à Integração dos Migrantes) e também há um terceiro gabinete, do qual nós somos parceiros, com a Câmara Municipal da Madalena do Pico. Este gabinete tem um papel fundamental de receber os imigrantes, informá-los e encaminhá-los para os locais certos. Vamos imaginar que o imigrante chega cá e pretende regularizar a sua situação. Nós instruímos, informamos de todos os documentos que são necessários para se regularizar e encaminhamos para a AIMA. Um imigrante que chega cá e precisa de tirar o número de contribuinte, informamos-lhe de quais são os documentos necessários e encaminhamo-lo para as finanças. Um imigrante que tem um contrato de trabalho e que precise de se inscrever na Segurança Social, damos a indicação de todos os documentos necessários e depois encaminhamo-lo para a Segurança Social.
Este é o trabalho que nós fazemos aqui, na AIPA, de Segunda a Sexta-feira, das 9h00 da manhã até às 17h00. Temos tido uma média de atendimentos, em cada um dos gabinetes que referi acima, que varia entre os 25 a 30 por dia. Em 2024, por exemplo, realizamos mais de 6000 atendimentos e no presente ano, de 2025, já vamos em mais de 8000 atendimentos realizados nos três gabinetes de apoio de que dispomos nas três ilhas de São Miguel, Terceira e Pico.

    Frederico Figueiredo
Edit Template
Notícias Recentes
Melhor aluno do conjunto das licenciaturas de Economia e Gestão da Universidade dos Açores premiado pelo novobanco dos Açores
PS/Açores pede audição sobre demissões na EMA-Espaço e PPM acusa o Partido Socialista de difundir notícias falsas
Governo Regional quer fim da exclusão das Regiões Autónomas quanto ao Programa Regressar
Programa de Estratégias Marinhas destaca que estudo“científico sólido” das águas profundas dos Açores pode orientar políticas de conservação e ordenamento marítimo
Bloco de Esquerda queria uma comissão de inquérito sobre a eventual privatização do serviço de hemodiálise do HDES e o Governo garantiu que não está tomada qualquer decisão
Notícia Anterior
Proxima Notícia
Copyright 2023 Correio dos Açores