O Teatro Micaelense acolhe o Fórum da Administração Pública Regional (APR) 2025, um encontro realizado ao abrigo do Plano de Recuperação e Resiliência (PRR) que reúne dirigentes, especialistas e representantes de instituições nacionais e internacionais para reflectir sobre o futuro da Administração Pública Regional dos Açores. O evento, que decorre até hoje no Teatro Micaelense, aborda temas como os novos modelos de trabalho, o rejuvenescimento dos recursos humanos e a inovação nos serviços públicos.
O Secretário Regional das Finanças, Planeamento e Administração Pública, Duarte Freitas, presidiu à sessão de abertura do Fórum da APR. O governante declarou que a modernização da Administração Pública Regional “não é uma opção, mas sim uma necessidade”.
“Modernizar é também simplificar, é aproximar os serviços públicos da vida real, é transformar a burocracia em confiança e o tempo de espera em tempo real. Quando falamos em modernizar, falamos de respeito: respeito pelo poder dos cidadãos, pelas suas necessidades e pela confiança que nos transmitem”, afirmou.
Relativamente ao PRR, Duarte Freitas afirmou que o programa financiado por fundos europeus tem ajudado a dar “um salto histórico na modernização e digitalização” da Administração Pública.
No que toca a números, o Secretário Regional indicou que estão a ser investidos 30,6 milhões de euros para “transformar estruturas e processos”. Neste sentido, anunciou que foram criadas 22 plataformas digitais e melhoradas 12 já existentes, o que permitiu o atendimento de mais de 100 mil cidadãos e empresas através do Centro de Contactos da APR, operado pela RIAC, e que a RIAC Móvel levou mais de 2 mil serviços até aos cidadãos.
De acordo com o governante, investiu-se ainda em 165 acções de formação, que capacitaram 1.400 dirigentes e trabalhadores. O CEFAPA – Centro de Formação da Administração Pública dos Açores registou 21.500 utilizadores na sua plataforma de gestão e formação. Freitas acrescentou que a nova Bolsa de Emprego Público dos Açores já permitiu 10.700 candidaturas a ofertas de emprego através de um processo mais simplificado.
A nível da INCUBA Açores, Freitas afirmou que o projecto incluiu mais de 7.700 participantes, “testando ideias que hoje são soluções concretas e outras que se vão abordar”. Segundo Duarte Freitas, a INCUBA terá no próximo ano instalações em Angra do Heroísmo Entre outros anúncios, destacou o investimento em cibersegurança, que “protege hoje 13 mil utilizadores do Governo Regional”.
Sobre a temática dos novos modelos de trabalho, do rejuvenescimento e das qualificações na AP, o Secretário Regional lembrou as mudanças de dinâmicas demográficas e laborais actualmente vigentes:
“A Administração Pública Regional nos anos 80 cresceu imenso. Muitos de nós estão, no momento, a chegar à fase final da sua vida profissional. Isso é um desafio e também uma oportunidade, mas temos que nos modernizar e temos que aproveitar a oportunidade para ter uma abordagem de planeamento do Emprego Público”.
O Secretário Regional afirmou que actualmente “existem trabalhadores mais qualificados, mais motivados e com melhores condições” e que foram “regularizados vínculos laborais e valorizadas carreiras”.
Duarte Freitas concluiu que a semana de quatro dias, o teletrabalho e o regime híbrido são “sinais de uma Administração Pública mais flexível”, e que uma Administração Pública com “melhor capacidade e maior realização profissional”, responderá também “melhor às necessidades”.
Semana de quatro dias
não envolve corte salarial
A primeira palestrante da manhã de ontem foi Rita Fontinhas, Professora Associada na Henley Business School, da Universidade de Reading (Reino Unido). Ela assume a coordenação científica do projecto-piloto da semana de quatro dias na Administração Pública Regional, que começará a ser implementada nos Açores a partir de Janeiro do próximo ano. Foi precisamente sobre a semana de quatro dias que Rita Fontinhas dedicou a sua intervenção.
Numa primeira abordagem, falou sobre a coordenação do projecto-piloto que dirigiu em Portugal, no sector privado. Ao todo, participaram 41 empresas, sendo que 20 já tinham iniciado o projecto voluntariamente e 21 aderiram com acompanhamento directo da coordenação, tendo o mesmo começado em Junho de 2023.
Tanto no sector privado como no sector público, Fontinhas assegura que um dos princípios fundamentais é a impossibilidade de existir corte salarial. Justifica que “corte salarial apenas existe no caso de trabalho parcial, o que neste caso não se implica”.
“Semana de quatro dias é uma medida, a nível da organização, de redução de tempo de trabalho para todos. Mas, claro, não podia ser nunca um corte salarial, sendo que em Portugal os salários já são baixos”, explica.
A professora universitária explicou que deve existir uma redução efectiva das horas semanais. No caso do projecto-piloto com empresas privadas, o mínimo passou a ser 36 horas semanais, em vez das anteriores 40 horas. A semana de quatro dias poderia ser aplicada de diferentes formas: quatro dias por semana, ou uma quinzena de nove dias (quatro dias de trabalho numa semana e cinco na seguinte). Sublinhou ainda que a adesão era sempre voluntária e reversível.
“A ideia é que a redução do tempo de trabalho fosse uma medida exactamente para a redução de recursos e implementação de novos processos que aumentem a produtividade”, fundamenta,
Os resultados, segundo a investigadora, foram muito positivos: registou-se uma redução média do horário de 13,7%, um aumento dos lucros em 72% e das receitas em 86% face ao ano anterior.
A investigadora destacou que 70% das pessoas afirmaram que o ritmo de trabalho aumentou, o que ao princípio gerou preocupação na análise dos resultados. Todavia, para as pessoas, a semana de quatro dias é preferível e a intensificação laboral é justificável.
A maioria dos participantes também referiu ter maior flexibilidade para tratar de assuntos pessoais, escolhendo o dia de folga consoante as necessidades, e reservando o fim de semana para a família ou lazer.
Implementação do projecto-piloto
na Administração Pública Regional
Rita Fontinhas salientou que os Açores são os sextos no mundo a implementar a semana de quatro dias, depois de experiências na Islândia, Escócia, Dubai (onde os testes ocorreram durante os meses de Verão) e no município de South Cambridge, em Inglaterra.
No caso da AP nos Açores, a redução será menor (das 35 horas para as 32 horas semanais) podendo ser feita em quatro dias ou quatro dias e meio, consoante a organização.
A professora explicou que a adesão é também voluntária e que o trabalhador pode ver qual o melhor modelo para si.
De acordo com Fontinhas, antes da implementação, já foi realizada uma reunião com os sindicatos e uma reunião com os dirigentes, para avaliar as possibilidades a nível de recursos humanos e financeiros. De momento, decorre a formação com os dirigentes e com as respectivas equipas nomeadas para a execução do projecto. O início do projecto-piloto da semana de quatro dias está previsto para Janeiro de 2026.
“Não há tanta autonomia no sector público como há no sector privado. Há especificidades legais mais rígidas. Mas vemos que estas regras são fundamentais para todos”, declara.
A académica finaliza, garantindo que o objectivo é que, no final, este seja “um exemplo potencialmente utilizado a nível mais alargado”, respeitando uma “avaliação rigorosa do impacto”, evitando assim a eventual “perda de produtividade”.
José Henrique Andrade