O jornal “Correio dos Açores”, do passado dia 29 de Agosto, na rubrica “reportagem”, oferece-nos uma excelente entrevista assinada pela jornalista Carla Dias, com o senhor Manuel Andrade “Pateta”, pescador em Rabo de Peixe e na Pesca ao Bacalhau na Terra Nova e Gronelândia.
O senhor Manuel Andrade é, certamente, um dos últimos ou, quiçá, o último Pescador Micaelense da Pesca ao Bacalhau vivo! Tendo eu uma admiração enorme por estes Bravos e Corajosos Homens, não resisti e lá fui bater à porta da sua residência.
Recebeu-me, acompanhado de duas filhas, com agrado e muita simpatia, um senhor bem-falante que, para os seus 82 anos de vida, tem uma lucidez invejável!
Fiquei encantado ao ouvir, de quem viveu e sentiu na pele, as vivências da Pesca ao Bacalhau e suas tormentas!
Manuel Andrade, um jovem que aos 23 anos de idade, parte para uma enorme aventura nas águas geladas da Gronelândia correndo sérios e enormes riscos de vida. Logo no início da campanha passa pelo maior pesadelo de um pescador nestas águas: perder-se do navio “base”. Foi, assim, durante uma noite e um dia, sozinho no seu pequeno “Dóri” entre o denso nevoeiro, o risco das correntes o afastarem para longe, do abalroamento de baleias ou de algum barco – manteve-se sereno, até ser encontrado e levado para o seu lugre – “O Oliveirense”. Chegando a bordo, por volta da uma hora da manhã, é acordado às quatro horas com os seus companheiros para a toma do pequeno-almoço e às cinco os “dóris” são arreados ao mar, iniciando-se a pescaria. Lá vai o jovem Manuel Andrade, como se nada se tivesse passado com ele. Precisa de pescar para ganhar o seu rendimento, não há tempo para lamentações nem medos!
Alan Villiers na sua reportagem à Campanha da Pesca ao Bacalhau em 1950, no lugre “Argus”, perguntou aos pescadores: “o que os movia para arriscarem a vida todos os dias na pesca ao bacalhau?” A resposta foi unânime: “Dar melhor qualidade de vida aos seus familiares”. Fiz a mesma pergunta ao Pescador Manuel Andrade e recebi a mesma resposta!
É lamentável que não tenhamos nesta ilha, nomeadamente, em Ponta Delgada, na Calheta Pêro de Teive, um Museu Marítimo.
O testemunho do senhor Manuel é riquíssimo! Não podemos perdê-lo! Deve ser registado para memória futura, não só na imprensa escrita como em áudio e imagem!
A nossa RTP/Açores, que tem vindo a fazer um bom trabalho nesta área, devia, com urgência, fazer este registo. Deixo aqui o meu apelo!
Ao senhor Manuel Andrade “Pateta” levei-lhe, em nome da memória dos Pescadores da Pesca ao Bacalhau da Calheta Pêro de Teive, o meu abraço e, presenteei-lhe com o meu último livro “A Confraria de São Pedro Gonçalves”. Foi um momento muito emocionante para ambas as partes!
Cada ano que passa assistimos, vergonhosamente, ao derrube e desaparecimento do nosso Património Material e Imaterial! Um povo que não conhece a sua História, o seu Passado não consegue construir o futuro!
Carlos A. C. César