Negócio de Mário Raposo resiste à crise e à pandemia

Na Rua do Peru sobrevive aquela que deverá ser a última taberna da cidade de Ponta Delgada

A Taberna Raposo é um negócio de Mário Raposo, de 61 anos de idade. O espaço já ali está há mais de 80 anos e o interior continua a cumprir a vocação da taberna, com barris de vinho.
O segredo da longevidade está na simplicidade do serviço, mas também daquilo que tem para oferecer. O cheiro a taberna só é entendido por quem lá anda, e no espaço detrás, surgem umas mesas onde os clientes, mais chegados, aproveitam a hora do almoço para degustarem o que trazem de casa, ocorrendo sempre uma amena cavaqueira sobre os mais diversos temas, mas também, e claro, acerca do futebol.
Na Taberna Raposo vende-se um pouco de tudo, desde cervejas, vinho tinto ou de cheiro e tabaco, e outras bebidas mais tradicionais.
A ausência de cozinha não lhe permite vender comida de panelas, a não ser alguns petiscos, como ovos cozidos, queijo da ilha ou branco, uma lata de atum ou sardinhas.

Vinho de cheiro

“O vinho de cheiro ainda se vende”, trazido de Vila Franca do Campo, apreciado pelos turistas, normalmente por ter graduação alcoólica baixa, encontrando-se enraizado na cultura açoriana, como as festas em louvor do Divino Espírito Santo, na gastronomia quando utilizado na confecção de pratos típicos. “Dá sempre um toque diferente”, assinala.
As Sextas-feiras e aos Sábados, são dias de maior afluência ao Mercado da Graça, mas nem por isso o negócio aumenta na Taberna Raposo, ao contrário do que acontecia no passado. “Os turistas entram aqui, mas não são assim muitos. Para além disso, não sei falar inglês e sempre deixo tirar uma ou outra fotografia, porque são curiosos”. Mesmo assim, “em dias de praça, sempre entra mais alguma pessoa”, confessa.
No espaço surgem fotografias de algumas equipas de futebol do passado, da Selecção Nacional, do Clube Futebol “Os Belenenses” ou do Benfica. “Meu pai era da equipa adepto da equipa do Restelo, que não do Belenenses SAD. Eu sou do Benfica, mas não sou fanático”.
O nosso interlocutor regista, do mesmo modo, que é natural da Freguesia da Fajã de Baixo. O seu pai era quem geria o negócio, mas depois de ter falecido, e como os irmãos não quiseram assumir as rédeas, Mário Raposo foi quem assumiu a actividade há 23 anos atrás.

Outras relíquias

Numa vitrina há ainda as famosas pastilhas Gorila, “tudo à moda antiga” e uma colecção de isqueiros, a maior parte deles que existiam outrora “e também umas canequinhas à maneira”, frisou.
As cabaças também são visíveis no espaço, que como se sabe serviam para guardar água, vinho ou aguardente, que os homens levavam para consumir nos campos, quando iam trabalhar.
Outras fotografias antigas recordam outros tempos, como por exemplo, a antiga Calheta de Pêro de Teve, que dava aos habitantes facilidades para importar ou exportar mantimentos e mais tarde para desenvolver a actividade da pesca.
Mário Raposo releva que gosta muito daquilo que faz, que aprendeu com o pai. No demais, sente que “tem os seus fiéis clientes”, muitos deles “amigos” que foi angariando ao longo dos anos. Há tempo ainda para uma ou outra partida de dominó ou de cartas, depois dos almoços e após beberem um “copinho de vinho”.
“Vamos andando assim, não é para ficar rico, que já não tenho idade para isso, mas dá para ir vivendo”, acrescenta.

Ofícios de outros tempos

O nosso entrevistado trabalhou no Mercado da Graça durante 17 anos, por contra de outrem. Na praça vendia fruta, mas também exportava, exercendo assim actividade remunerada ao serviço de uma entidade empregadora.
Muito antes disso, trabalhou nas famosas estufas da Freguesia da Fajã de Baixo, na sua terra natal, acabando ainda por confessar que tem uma estufa no seu quintal, fazendo assim “alguma coisa por fora, porque o negócio está fraco”.
Sobre a pandemia, “assustou”, mas tal como a maioria das pessoas “aprende-se a conviver com ela”.
Sem qualquer colaborador, o rosto da Taberna é Mário Raposo, que ali chega cedo (07h15), todos os dias, excepto Domingos, e fecha as portas às 20h00, sem pausa para o almoço.
O dia-a-dia de Mário Raposo é assim, e tal como frisa, “andando para a frente é que é bom, para trás mija a burra”.
A par de tudo o que faz, incluindo as lides da terra lá em casa, Mário Raposo é ainda um apaixonado pela caça, e por via disto também já conheceu a maioria das outras ilhas, que apelida de “irmãs”.

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