3 de maio de 2022

Refugiados? Só por catálogo

Louvar e enaltecer sem reservas e ambivalências a postura das várias nações europeias, nomeadamente as que fazem fronteira com a Ucrânia, em receber os refugiados que chegam aos milhares da martirizada Ucrânia.
Pena é que a mesma atitude não esteja a ser prosseguida em relação a outros refugiados.
Referimo-nos à Hungria e à Polónia. 
Curiosamente países governados por partidos populistas e de extrema - direita, com proximidades ao ditador Putin.
Ainda está bem presente a posição da Polónia em relação aos refugiados sírios e iraquianos retidos na fronteira deste país com a Bielo-Rússia.
Justo salientar a alteração politica da Polónia em relação aos refugiados, demarcando-se da Hungria.
Para tal não foi indiferente os milhões de ucranianos que rumaram às fronteiras polacas, logo nos primeiros dias de guerra.
É conhecida a política anti-emigrantes e de acolhimento aos refugiados do, novamente reeleito, Primeiro - Ministro Viktor Orbán da Hungria.
Política que o Papa Francisco não hesitou em criticar, na visita a Budapeste.
O Viktor, à semelhança de outros dos seus camaradas europeus, como Salvini, Le Pen, Abascal ou Ventura, que agora, por conveniente oportunismo eleitoral, se juntam ao coro dos democratas que têm vindo a apelar ao acolhimento dos refugiados ucranianos.
Lamenta-se a continuada postura de não acolhimento de refugiados de outras proveniências.
Insistem em apregoar o perigo que representam para a civilização ocidental e valores cristãos, para além da maioria terem ligações a grupos terroristas. 
Refugiados? Só por catálogo.
Caucasianos de pele clara e cristãos.
Estes movimentos nacionalistas radicais têm-se oposto às mensagens do Papa Francisco em prol dum tratamento humano e consentâneo com os ensinamentos evangélicos de Jesus.
Procuram, levianamente, isolar Francisco dos seus antecessores.
Seria recomendável recordar aos adeptos do xenofobismo os discursos de S. João Paulo II por altura dos diversos Congressos Mundiais sobre a Pastoral para os Migrantes e os Refugiados.
“Uma chaga vergonhosa da nossa época”. 
Refugiados foram, na sua própria Pátria, o povo timorense.
Em 1975 e durante o genocídio que se seguiu, nos fatídicos anos que duraram a ocupação indonésia.

 Lisboa 2022.
 A última diatribe racista e xenófoba, assumida por um deputado municipal do Chega.
Na respectiva assembleia municipal manifestava-se contra o acolhimento de refugiados da guerra na Ucrânia que não fossem “verdadeiros ucranianos”.
Isto porque na vaga de refugiados provenientes da Ucrânia, têm vindo a ser detectados alguns nepaleses, sírios, paquistaneses, bielorussos ou iraquianos.
Há anos radicados na Ucrânia e já com cidadania desse país.
Teve a resposta à altura da vereadora do PSD com o pelouro dos Direitos Humanos e Sociais, que classificou de racista e de absolutamente intolerável a posição do deputado.
Depois de enumerar os refugiados nessas condições, acrescentava:
“Se quiser faça as contas e diga-me o que é que faz a estas pessoas, porque olhando à sua cor de pele e olhando à sua cultura de origem, o senhor não as aceita, mas estas pessoas residiam todas na Ucrânia, são tão refugiadas como as pessoas ucranianas e amanhã pode acontecer isto consigo”.
O visado refugiou-se no argumento populista nazi-fascista costumeiro.
Da defesa dos contribuintes, dos portugueses pobres… de preferir proteger os portugueses a proteger aqueles que vêm de fora, sendo que a exceção é para os verdadeiros ucranianos, não é para migrantes económicos.
Oportuno recordar a “essa gente” a saga emigratória açoriana dos últimos dois séculos.
Salvo algumas excepções, foi sempre a necessidade duma vida melhor que os levou a partir.
Não eram migrantes económicos?
Os açorianos, que continuando a rumar ao Brasil Irmão, buscaram novas paragens na América, Bermudas, Venezuela ou Canadá.  
Embora sejam brasileiros, americanos ou canadianos os descendentes dos pioneiros não esquecem as suas raízes açorianas, que manifestam com grande galhardia.
Apesar de saberem que os seus antepassados sofreram segregações e marginalizações, acolhem com enorme humanidade os que hoje, em 2022, pioneiros também são.
Vêm do Panamá, das Honduras, do Kosovo, da Venezuela, do Myanmar, do Magreb, da Ucrânia, do Sudão ou das Filipinas.
Fogem da fome, da guerra, de perseguições religiosas e étnicas, de sistemas de governo ditatoriais, embora muitos com disfarce de democráticos, para ONU enganar.
Em nenhum momento quero acreditar, que descendentes dos pioneiros, alinhem ou apoiem, quem nos seus países, tomem posições persecutórias e racistas, ou os confundem com terroristas ou narcotraficantes, os que apenas procuram, tal como os seus pais e avós, uma nova oportunidade. 
Bem haja gente! Os que tratam gentes como gente. Os outros. São outros, que memória nenhuma recordará.
António Benjamim

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Autor: CA

Categorias: Opinião

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