Diogo Caetano, dos Amigos dos Açores, em Dia Mundial do Ambiente

O aumento do Turismo “tem trazido excesso de pessoas concentradas em determinados locais prejudicando o meio ambiente dos Açores”

 Correio dos Açores – Qual a importância da existência de um Dia Mundial do Ambiente?
Diogo Caetano (Presidente da Associação Amigos dos Açores) – Os dias comemorativos, no geral, são dias que permitem reflectir ou fazer chamadas de atenção à comunidade, e a todas a demais autoridades e entidades, de forma a que possam ficar naquele dia, simbolicamente, mais sensibilizadas para um determinado assunto.Normalmente, são assuntos importantes todos os dias, pelo que os dias comemorativos devem ser apenas entendidos como dias de fazer lembrar, comemorar, festejar e, de certa maneira,sensibilizar a população para a temática em si. Portanto, temos que pensar que não devem ser dias excepcionais, onde tudo se faz bem nesses dias, como se nos restantes não se fizesse. Devem ser dias dos quais se devem lembrar as boas práticas, os bons comportamentos e as preocupações, que se devem ter ao longo de todo o ano. O Dia do Ambiente não é excepção, é um dia onde devem ser lembradas todas as questões, sensibilizando a população para as questões ambientais. Por mais que pensemos que temos evoluído, ainda há muito para evoluir.

Em relação à problemática da Lagoa do Fogo, nomeadamente o excesso de pessoas e a falta de vigilância. O que considera que pode ser feito?
Na Lagoa do Fogo tem-se falado muito, nos últimos tempos, sobre a construção de um miradouro. Consideramos que, acima de tudo, há uma necessidade muito grande de disciplinar o uso da área. Quando falo da área, não me refiro apenas à área do miradouro, mas a toda a reserva natural. Consideramos importante disciplinar não só do ponto de vista de visitação, mas também do ponto de vista de acessibilidades.
Independentemente do projecto que possa ser feito para resolver a questão do miradouro, do qual desconhecemos a última versão, ou seja, por muito que possa ser melhorada a situação do miradouro, ainda existe um grande leque de situações que deve ser atendido, nomeadamente a questão do transporte, da mobilidade, entre outros.Em termos de estratégias de gestão do miradouro, não fará muito sentido se não tivermos uma alteração de um paradigma da mobilidade. Isto é, devemos pensar antes que mobilidade queremos para as pessoas chegarem àquele local. Temos que pensar se devemos privilegiar mais veículos públicos, se devemos pôr um valor para os carros que acedem àquela zona, de maneira a incentivar o transporte público. Parece-nos importante fazer, antes de mais, um estudo capaz, a nível dos transportes públicos da acessibilidade àquela zona e, posteriormente, que toda a acção na zona pudesse ser feita em função dessa análise. Não é propriamente chegar e propor uma solução, quando esta depois pode não ser verificada pelos dados de visitação e com a pressão que o local sofre, conhecendo-se o número de pessoas em questão.

Do ponto de vista do ambiente, o que tem sido feito ao nível da regularização das linhas de água das construções urbanísticas, junto à orla costeira?
Não temos um conhecimento profundo da situação generalizada no arquipélago. Pensamos, no entanto, que a nível da zona costeira, na generalidade, nos últimos anos, com o funcionamento dos planos da orla costeira tem havido uma maior disciplina do uso desses locais. Relativamente às linhas de água, a nível das novas construções, penso que também tem sido algo tido em conta.Sendo que, todavia, existem situações em zonas ameaçadas, que são normalmente pré-existências, edifícios antigos, que apresentam algumas lacunas e que podem apresentar riscos.Mas, não temos conhecimento de haver mais construção em qualquer um desses domínios. Apesar de poder haver situações de risco, pensamos que estas possam advir, principalmente, de construções já existentes, anteriormente, à entrada em vigor dos instrumentos de gestão do território, como os planos da orla costeira e outros.

Do ponto de vista da agricultura, quais os efeitos e diferentes impactos da pecuária no meio ambiente dos Açores?
Nós sabemos que a pecuária intensiva acarreta bastantes problemas de poluição, quer a nível da produção de gases, uma vez que temos uma quantidade de bovinos muito grande.
Além disso, outra questão prende-se com o facto de termos a lavoura em regime extensivo. Muitas das vezes, pode haver uma poluição difusa, através da utilização de adubos fertilizantes, bem como da própria acção dos animais. Esta é uma questão que pensamos estar identificada e acreditamos que se tivéssemos em curso, no próximo quadro comunitário de apoio, uma maior especialização de determinados produtos, e orientássemos a agricultura ou a lavoura para uma produção de leite de maior qualidade, com menor efectivo, como se tem falado nos últimos tempos pelas próprias organizações de actividade agrícola, isto poderia levar a uma situação menos impactante, em termos ambientais, e também a uma maior valorização do produto económico, que é o leite e os seus derivados.
Acima de tudo, consideramos que tem que haver uma preocupação ambiental, mas os recursos têm que ser devidamente rentabilizados, da melhor forma, pois uma maior rentabilização constitui uma mais-valia, no sentido de valorizar os nossos produtos. Consideramos que tem que haver um trabalho conjunto de muita gente, nomeadamente das associações do sector, do Governo Regional, para encontrar a melhor solução, ou seja, o melhor compromisso entre o ambiente e a agricultura, e o rendimento económico que ela possa ter.

A mão humana tem prejudicado o meio ambiente dos Açores?
Prejudica sempre, em vários aspectos. Praticamente, quase desde o povoamento, porque alterámos algo que era natural, tal como a natureza havia construído sem acção humana. Essa alteração vê-se em muitos aspectos da alteração da paisagem, da fauna e da flora, da eliminação de determinadas espécies, ao longo dos tempos. Portanto, a mão humana foi, durante muito tempo, vocacionada para a sobrevivência e para o bem-estar das populações, que inutilizavaas questões ambientais.
Hoje em dia, julgo que há mais conhecimento e a mão humana pode ser tomada de outra forma, logo que, sempre que se façam intervenções, estas tenham atenção, o máximo possível, as condicionantes do local e os impactos que se possam apresentar.
De qualquer maneira, terão sempre impacto, porque qualquer actividade, por menor que seja, terá sempre o seu impacto no ambiente. Importa que este seja minimizado o máximo possível, em função da qualidade de vida e da actividade socioeconómica. Tem que haver sempre um meio termo e uma maior responsabilidade ambiental possível, sabendo que há sempre impacto associado à intervenção do homem. Mesmo para efectuar um trabalho de conservação, o homem está a alterar aquilo que é o decurso natural da evolução deste mesmo local.

De que forma o aumento do Turismo tem aumentado a poluição?
Consideramos que o aumento do Turismo tem trazido, fundamentalmente, uma ocupação que não é organizada suficientemente. Ou seja,temos, efectivamente, excesso de pessoas concentradas em determinados locais. As pessoas visitam muito os mesmos locais, às mesmas horas. Sem haver uma disciplina, que pode ser incutida por parte das autoridades, é difícil que as pessoas o façam de modo ordenado.
Pensamos que disciplinar o turismo, acima de tudo passa por organizar a distribuição dos turistas no território e depois gerir cada um dos locais, com regras específicas, com capacidade de carga definida, com modos de visitação, enquadrados com o próprio local a visitar.
Se chegarmos a um desses locais e se, eventualmente, não for possível visitar o local, porque este não permite mais visitantes, o visitante tem, naturalmente, que perceber que é uma condicionante do local que está a visitar. Ora, quando se visita um restaurante e o restaurante está cheio, ninguém reclama por um lugar que sabe que não existe. Temos que pensar que a natureza também nos presta serviços, que é um recurso que estamos a utilizar, pelo que deve haver uma disciplina, dentro do que a natureza nos condiciona. E temos que aceitar isso, de bom grado, no sentido de perceber que se hoje não é possível teremos que visitar no outro dia. Planear, reservar e perceber que só tendo esse compromisso podemos estar a fazer uma visitação sustentável dos locais, uma vez que são as regras definidas pelas autoridades.   

Ainda existe muita gente, nos Açores, que considera secundária a preocupação com o meio ambiente?  
Existirá, não só nos Açores, mas de um modo geral, em todos os quadrantes, alguns países serão mais evoluídos que outros. Mas sim, penso que ainda temos bastante para evoluir. De certa maneira, estes dias poderão sensibilizar e fazer com que as pessoas fiquem mais receptivas a determinadas temáticas.

Há uma maior consciencialização para a preservação do meio ambiente nos Açores, do que existia há alguns anos?
Estamos numa situação em que há mais informação. As pessoas estão mais informadas, têm mais conhecimento, pelo que cada vez que possam fazer algo de errado, têm mais compromisso e uma maior responsabilização.
Ou seja, se existe muito mais informação econsciência do que antes, do ponto de vista ambiental, temos que entender que, nesse aspecto, as pessoas estão mais formadas, logo têm mais responsabilidade e devem perceber que,o facto de não agirem bem, tem maior gravidade. O mesmo impacto ou a mesma actividade prejudicialao ambiente, quando não havia informação, é mais compreensível. Estando a fazer a mesma actividade, estará a fazer pior, uma vez que é uma acção, cujo conhecimento é tido pela própria pessoa. O ter consciência, estar sensibilizado, saber as questões ambientais fundamentais é algo que já está bastante acessível à generalidade da população. No entanto, é importante continuar o conhecimento de pessoas, que apesar de saberem, não têm propriamente os melhores comportamentos. Por exemplo, acham que não vale a pena separar os resíduos, não têm cuidado com determinados locais quando os visitam, entre outros.
Julgamos que estamos numa fase distinta, mas ainda há muito para fazer e muita consciência para mudar, neste sentido.

Que acções de sensibilização são desenvolvidas pela Associação Amigos dos Açores?
A nossa acção foca-se muito nas actividades no terreno, de maneira a sensibilizar as pessoas para as questões ambientais.No fundo, estas servem para as pessoas, por um lado, protegerem a paisagem, porque gostam dela, do ponto de vista afectivo, de usufruto; por outro lado, também, para contactarem com situações menos boas que se verificam nessas acções no terreno. Por exemplo, se encontramos um depósito de resíduos, encorajamos a pessoa a deslocar-se, para agir e denunciar ou tentar evitar que situações deste género se repitam.
A nível da nossa acção mais informativa e de sensibilização, focamos a questão da participação nos órgãos de comunicação social ou a participação nas consultas que periodicamente respondemos, por exemplo, ao Governo Regional e à Assembleia Legislativa Regional. O objectivo é sensibilizar para algumas das questões que possam estar a vir a ser publicadas em termos de lei, de modo a que possamos atender ou destacar algumas questões que nós entendemos ser importantes. Resumidamente, dando três incidências: uma será no terreno, com a sensibilização dos participantes nas nossas actividades; outra será a nível da sensibilização da comunidade, da população em geral, com enfoque nas escolas e toda a informação que possa haver, a nível de público mais jovem; por último,a nível da sensibilização e alerta das entidades políticas em diversos assuntos, sejam eles a nível da lei ou a nível de denúncias que possam ocorrer.     

Qual a mensagem que quer deixar neste Dia Mundial do Ambiente?
O Dia Mundial do Ambiente é um dia comemorativo, no qual podemos enfocar mais nas questões ambientais. No entanto, temos que pensar que este dia só serve para relembrar boas práticas, que têm de ser tomadas ao longo de todo o ano, pois o ambiente está connosco todos os dias e qualquer das nossas actividades tem sempre um impacto ambiental. Por isso, temos que pensar que devemos ter melhores actividades, melhores cuidados com as questões ambientais, de maneira a que possamos ter uma vida o mais saudável possível e que possamos contribuir para o equilíbrio do ambiente e do planeta, que muitas das vezes pode estar ameaçado pela nossa própria acção, enquanto homens.                                         

Carlota Pimentel

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Autor: CA

Categorias: Regional

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