O consumo de Oxicodona (OxyContin, como é denominada nos países de língua inglesa) é conhecido por ser um grande flagelo em países como os Estados Unidos da América, onde se sabe que mais de 500 mil norte-americanos perderam as suas vidas devido a este psicotrópico, conhecido por ser também um analgésico potente e altamente viciante. Ao mesmo tempo, surgem também relatos inquietantes provenientes do Brasil, o que leva a que este seja um problema, em certa parte, “ocidental”, como afirmam alguns especialistas.
De acordo com os números fornecidos pela Secretaria Regional da Saúde e Desporto, nos Açores, é possível perceber que entre 2021 e 2022 tem havido um aumento da prescrição médica deste analgésico.
Isto é, durante o ano de 2021, foram vendidas através das farmácias da Região um total de 388 caixas de Oxicodona, contrastando com as 1.226 caixas de Oxicodona + Naloxona vendidas no mesmo ano, o que perfaz um total de 1.614 caixas vendidas nos Açores deste analgésico. Em relação ao ano de 2022, a secretaria em questão dispõe de dados referentes até ao passado mês de Junho, adiantando que de Oxicodona foram vendidas 239 caixas, enquanto de Oxicodona + Naloxona foram aviadas nas farmácias açorianas 667 caixas desta combinação de princípios activos, correspondendo a um total de 906 unidades, mais de metade do valor total acumulado em 2021 em apenas seis meses.
Em termos monetários, a venda de Oxicodona em 2021 representou nos Açores um total de 10.766 mil euros, enquanto a venda de Oxicodona + Naloxona representou um total de 31.816 mil euros, perfazendo um total de 42.582 mil euros entre estes.
Em relação ao ano de 2022, com dados até ao passado mês de Junho, a Secretaria Regional da Saúde e Desporto refere que a venda de Oxicodona representou 6.502 mil euros, e que a venda de Oxicodona + Naloxona representou um total de 19.062 mil euros, perfazendo um total de 25.564 mil euros, valor este que se apresenta superior à metade do valor arrecadado em 2021 num espaço de seis meses.
Norte-americanos procuram medicamento nas farmácias açorianas
Na Europa, conforme apontam os dados, a segurança relativamente à obtenção deste medicamento é apertada, sendo assegurada apenas por receita médica, tal como acontece também nos Açores, explicou ao nosso jornal uma farmacêutica que preferiu permanecer no anonimato.
Porém, partilhou um facto curioso e indicador da dimensão do problema que existe nos Estados Unidos da América, uma vez que os turistas norte-americanos, “sobretudo os que vêm nos barcos”, tantam obter este medicamento nas farmácias de Ponta Delgada, sem sorte, uma vez que não se fazem acompanhar de qualquer receita médica.
Oxicodona ajuda em casos de dor crónica ou oncológica
Contudo, explica que em Ponta Delgada, não existe “muita compra deste tipo de medicamento” e que existem vários motivos que levam a este tipo de prescrição médica que estão longe do estereótipo das toxicodependências. Porém, na costa norte da ilha de São Miguel, adianta que a prescrição e levantamento deste tipo de medicamento são mais frequentes.
“Nesta zona, em Ponta Delgada, não há muita compra mas as pessoas têm um histórico, nas suas zonas, na compra desse tipo de medicamentos, e normalmente, são ex-toxicodependentes que fazem essa medicação. Porém, muitas vezes, chegam também casos do foro da neurocirurgia, pessoas que têm dores crónicas, com dores oncológicas, etc.. Na outra farmácia (na costa norte da ilha de São Miguel) vende-se um bocadinho mais”, afirma a farmacêutica.
Questionada se este é um medicamente “altamente viciante” na realidade que conhece, responde que “não tem essa percepção”, tendo em conta que muito do consumo de oxicodona ocorre devido a dores oncológicas, crónicas ou provenientes de neurocirurgias. “Quem o toma nem sabe o que está a tomar, muitas vezes. É algo que tira as dores e ponto final”, adianta. No caso dos toxicodependentes é que a situação pode diferir, porque “eles realmente precisam da oxicodona para retirar as dores” que surgem durante a privação de certas drogas.
Apesar de o consumo de oxicodona aparentar ser maior no concelho da Ribeira Grande, a farmacêutica realça que a grande parte dos casos não está tão ligada à toxicodependência mas sim ao facto de esta ser uma zona com muitos doentes crónicos.
“Na Ribeira Grande é pior do que em Ponta Delgada, porque para além da toxicodependência também há mais doentes crónicos. Esta é uma zona de trabalhadores rurais e as pessoas têm dores crónicas decorrentes das suas profissões pesadas ao longo de uma vida: dores ciáticas, dores da parte da neurocirurgia, hérnias discais que são incapacitantes, etc.. As pessoas têm dores terríveis devido também a uma vida dura, derivadas de um estilo de vida mais gravoso que não é o estado da cidade que se baseia em serviços”, adianta. Assim, considera que o maior perigo para a saúde provocado pela oxicodona ocorrerá se esta for obtida ilicitamente, nomeadamente através da internet ou do mercado negro: “Torna-se um perigo para a saúde só se realmente estiver no mercado negro e a pessoa tiver acessibilidade a ele sem passar pelas farmácias. Na internet vende-se tudo e mais alguma coisa, o que vem nós não sabemos, e o que as pessoas usam também não sabemos, é um circuito que às farmácias é alheio”.
Factos sobre a oxicodona
No que diz respeito à origem da oxicodona, esta vem da papoila, planta com registo de utilização pela humanidade desde 3.400 a.C., conhecida como “a planta da alegria” por muitos, sendo também um dos principais componentes da oxicodona e que a torna “no remédio mais perigoso do mundo”, conforme apontam alguns especialistas.
O princípio activo da planta foi baptizado de “morphium” pelo cientista Friedrich Sertürner, no século XIX, depois de o ter identificado em vários testes. O cientista em questão descobriu que a sua acção ocorria sobre os receptores de opioides do cérebro, assim como a maior parte dos analgésicos. No entanto, quando em comparação com outros medicamentos, “morpheus” revelou ter um poder “incrivelmente maior ao de outros similares”.
Em acréscimo, de acordo com os estudos existentes, este é um medicamento que apresenta uma grande capacidade de tornar alguém dependente com muito mais facilidade quando em comparação com outros analgésicos. Entre os motivos que a levam a ser considerada o medicamento mais perigoso do mundo, está o facto de exercer um forte controlo psíquico, por ser – como referido – altamente viciante e por fazer com que a pessoa sinta a necessidade de consumir uma dose cada vez maior, tornando a pessoa dependente quer fisicamente, quer mentalmente, obcecando facilmente em relação à toma da próxima dose, sendo até comparada à dependência por crack. Há ainda o elevado risco de provocar overdose, salientam os especialistas. Ou seja, adianta-se, é muito comum que uma pessoa tome muitos mais comprimidos de oxicodona do que o organismo é capaz de processar em pouco tempo, o que faz com que as chances de causar a morte do seu utilizador em função de altas dosagens cresçam.
Em suma, o consumo desde medicamento para além do recomendado oferece riscos que vão de paragem cardio-respiratória a erupções alérgicas, estas últimas devido às alergias aos componentes que compõem a medicação, ou ainda interacções com outros remédios.
Joana Medeiros *