Artur Rocha, produtor agrícola na Lagoa

“Já vendo bananas a 60 cêntimos o quilo há 20 anos”

O Correio dos Açores esteve na freguesia de Santa Cruz, no concelho da Lagoa, num dos quatro terrenos de onde Artur Rocha, de 58 anos de idade, tira da terra o seu sustento. Este produtor agrícola, sempre com um sorriso no rosto, começa por contar que “o meu pai já fazia este tipo de trabalho”.         
“Larguei os estudos - sabe como é a rapaziada nova - e quando cheguei ao 9º ano acabei por vir para aqui”, lembra.
Artur Rocha recorda também os tempos de criança, época em que começou a trabalhar na agricultura.
“Não podia fugir (risos). A escola acabava ao meio-dia e à tarde vinha ajudar o meu pai, que fazia umas terras. As horas disponíveis eram para isto”, diz.
Centrando a conversa no presente, este produtor agrícola, actualmente com 4 hectares de terras, conduz-nos por um dos seus prédios onde, para além da banana, produz outros hortícolas como “batatas, batata-doce, pimentas ou tomates”.
“Sou polivalente e produzo praticamente de tudo”, refere antes de destacar que a sua maior produção se fixa na batata.
“A produção varia de ano para ano porque faço muito durante o Inverno, o que se torna complicado e depende dos anos e do tempo. A questão da tonelagem varia muito tendo em conta o facto de produzir de Inverno (…) O Inverno passado não foi mau e devo ter tirado à volta de 30 a 35 toneladas de batata”, salienta.
Já no que diz respeito à produção de banana, a que dedica 4 alqueires, Artur Rocha admite que apenas a mantém “porque este terreno é do meu pai. Se não fosse por isso, para ser sincero, não tinha”.
As razões para esta ‘desilusão’ prendem-se essencialmente com o actual modelo de subsidiação. “O Governo atribuiu um subsídio, se não estou em erro, a rondar os 60 cêntimos por quilo, mas é obrigatório a existência de uma cooperativa. Se não existir não há nada para ninguém e já fizemos força para que esse pagamento fosse feito mediante a apresentação de factura. Não sei qual a razão, mas deve haver um lóbi qualquer, porque o Governo não aceita”, atira.
Admitindo que “é preciso ter um movimento muito grande” para avançar para a criação de uma cooperativa, este produtor considera ainda que “sem o subsídio este negócio não dá muito”.
“Para mim vai dando alguma coisa porque este terreno é do meu pai e praticamente não pago renda, mas se tivermos de arrendar um terreno, sem o pagamento do subsídio não compensa.  A banana está no mercado entre 1,20 euros e 1,40 euros e o comerciante compra a banana a 60 cêntimos, não paga mais do que isso”, alerta.
Artur Rocha atira ainda, em jeito de crítica, que “já vendo banana a 60 cêntimos o quilo há 20 anos” e não tem dúvidas de que “se o Governo não desse o subsídio, ninguém produzia banana”.
Relativamente ao mercado, realça que opta por vender os seus produtos “a comerciantes locais há muitos anos e, vamos fazendo negócios com um e com outro”. Este agricultor da Lagoa revela porque optou por não colocar os seus produtos nas grandes superfícies: “As grandes superfícies estão agora a exigir certificações da parte dos agricultores e não sou certificado porque não quis”, afirma antes de concretizar que “a certificação é mais um custo. Não estou a dizer que é mau, é bom, mas é mais um custo. Um caderno de campo bem feito, algo que é obrigatório para todos, faz o mesmo e considero que a certificação é mais um acréscimo para darmos dinheiro aos técnicos que vêm do continente, porque somos nós quem tem de lhes pagar estadia. Se não arranjar mais 4 ou 5 pessoas para diluir as passagens, fica-me em mais de 700 euros”.
Ainda a este propósito, Artur Rocha questiona ainda; “Qual a vantagem para o consumidor em ingerir um produto de uma semente certificada ao invés de uma não certificada? É zero. Quando semeio batatas de Inverno, a semente é minha, e se a comprar vai-me custar 1,20 euros ou 1,30 euros o quilo”, acrescenta.
Salientando que gosta “de falar aquilo que penso e o sobre o que acho ser a realidade”, este agricultor de 58 anos, aponta para uma das grandes dificuldades encontradas nesta actividade.
“Praticamente não há mão de obra. Trabalham comigo pessoas quando aparecem e, de há uns dois anos para cá, a situação está cada vez pior. Penso que só podemos ultrapassar isto através da imigração, porque não há trabalhadores e os que existem estão a receber rendimentos ou subsídios e fazem uns biscates por fora. Infelizmente é assim”, lamenta.
Outro dos grandes problemas com que se depara está relacionado com a realidade internacional e com o, já muito falado, aumento dos custos de produção.
“Os adubos aumentaram mais de 100% e havia adubos que custavam 8 euros e que agora custam 18 ou 19 euros. É impressionante, representa uma fatia muito grande e ainda há umas semanas atrás semeei 4 alqueires de terra e foram-se logo embora uns 1.000 euros. Tenho que fazer 1.000 euros para pagar esse investimento e o resto? O Governo está ciente disso e sabe que este é um fardo muito grande”, acredita.
Artur Rocha sublinha que “esta é uma vida complicada”, embora admita que “actualmente até é menos puxada, porque existe mais maquinaria”. Por outro lado, refere que “o trabalho manual é agora dividido por menos pessoas”.
“Antigamente, no tempo do meu pai, estavam 5 ou 6 homens a carregar batata. Hoje em dia, as máquinas tiram a batata, mas quando chega a altura de carregar, só existem dois homens”, realça.
Ainda sobre a maquinaria, revela que estas “são essenciais e que, sem isso, mais vale a pena desistir e ir ganhar ao dia”.
Quando questionado sobre a possível falta de união existente no sector, considera que “o agricultor micaelense é mais individualista”.
“Conheço várias outras ilhas e já visitamos, com a Terra Verde, várias cooperativas no continente e inclusivamente já estivemos na Holanda, na Bélgica e percebemos que as pessoas se unem. Aqui, não sei qual a razão, mas o micaelense é diferente mesmo dos produtores das outras ilhas dos Açores. Temos também alguns exemplos de experiências que deram para o torto como a Anazor e a ProFrutos”, lembra.          
                                     

 

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