Sandra Faria, Presidente da Junta de Freguesia dos Arrifes

“É necessário implementar uma rede de suporte para pessoas com consumos de substâncias psicoactivas”

Começando pela vertente social, os Arrifes apresentam que tipo de problemas sociais?
A pandemia veio acentuar os problemas sociais, na sua larga maioria transversais ao concelho de Ponta Delgada, e que se prendem sobretudo com os constrangimentos no acesso à habitação, o agravamento dos consumos e outros comportamentos desviantes. Os grupos sociais que identificamos como alvos prioritários para uma intervenção são as famílias em situação de precariedade social; crianças e jovens com dificuldades de aprendizagem e de inclusão escolar; jovens em situação de risco ou inseridos em contextos sociais e de hábitos de vida quotidiana com elevado potencial de risco; jovens adultos desocupados, em dissociação com o sistema de ensino e de formação; e, por fim, grupos em situações específicas de risco social, como sejam os idosos isolados, pessoas com deficiência, toxicodependentes e vítimas de violência doméstica. A acção concertada entre diferentes entidades é, para nós, crucial para dar uma resposta efectiva a estes públicos. Por isso, estamos a trabalhar para potenciar projectos na área social que já existem na freguesia e a promover outros, de modo a contribuir para a mitigação desta que é uma realidade que carece de toda a nossa atenção e dedicação.

A toxicodependência tem vindo a aumentar? As drogas sintéticas preocupam-na enquanto Presidente de Junta?
Não tendo um levantamento dos casos que me permita apresentar números e com isso confirmar o aumento da toxicodependência, é certo que a realidade das designadas “drogas sintéticas” veio alterar a realidade. Perante tal cenário, acredito ser necessário implementar uma rede de suporte para pessoas com consumos de substâncias psicoactivas na comunidade. Este é um trabalho que carece da intervenção de equipas multidisciplinares, em que a Junta de Freguesia deverá ser um parceiro de ligação à comunidade e de apoio logístico para que os profissionais possam combater este que é um flagelo das sociedades modernas.  Enquanto houver jovens em situação de risco ou inseridos em contextos sociais e de hábitos de vida quotidiana potencialmente de elevado risco, não podemos descurar da nossa responsabilidade enquanto comunidade na construção de soluções. Estas terão de passar por acções orientadas para o combate e prevenção do consumo de substâncias psicoactivas e de comportamentos de risco.

São também conhecidos os problemas no Bairro da Piedade Jovem? Que tipo de intervenção poderia ser realizada nesse local?
As dificuldades sentidas neste Bairro são conhecidas, tendo sido feito, ao longo de anos e por parte de várias entidades, um trabalho em prol da sua mitigação e da efectiva integração da sua comunidade na freguesia. Mais uma vez, a pandemia veio criar sérias dificuldades à manutenção destes projectos, desde logo, pela dificuldade de se manterem dinâmicas de grupo e sessões de acompanhamento. Acredito que este tenha sido um dos factores que explica o agravamento dos problemas sociais nestas e noutras comunidades da Região. Chegados aqui, defendo ser emergente retomarmos políticas de combate a estes problemas, adequá-las à nova realidade e criar uma rede de acompanhamento e de apoio a estas famílias. É importante também concluir o processo de reabilitação/requalificação dos edifícios e investir na criação de serviços no bairro, de modo a transformar a imagem associada ao Empreendimento Piedade Jovem como sendo apenas um bairro social com problemas em diferentes vertentes. É necessário criar um sentimento de pertença ao bairro e à freguesia.

Existe falta de policiamento na freguesia?
Tal como o fenómeno das drogas sintéticas, este não é um problema exclusivo da freguesia dos Arrifes. No que diz respeito às acções de patrulhamento como forma de dissuadir a prática de actividades ilícitas, está longe do que seria desejável. No entanto, conhecemos as limitações que as forças de segurança enfrentam, nomeadamente no que respeita ao número de efectivos. É justo dizer que sempre que temos situações em que são chamados a intervir, a sua resposta tem sido irrepreensível, actuando dentro daquelas que são as suas competências e capacidades.

Tem sentido, tendo em conta que os Arrifes são uma freguesia situada na periferia da cidade, um aumento de procura de habitações? A população tem crescido nos últimos tempos?
O facto de sermos uma freguesia rural encostada ao centro urbano acarreta uma série de desafios e constrangimentos. Entre eles está a pressão exercida pela procura de habitações, o que se faz sentir claramente neste momento. De acordo com os Censos de 2021, a população residente nos Arrifes cresceu 2,9%, passando de 7.086 para 7.294 habitantes. A proximidade ao centro urbano e o desenvolvimento verificado na freguesia com o aparecimento de vários serviços, faz desta freguesia um lugar apetecível. Para nós, isso é motivo de orgulho e regozijo, mas temos de continuar a trabalhar para tratar as “dores de crescimento” e para dignificar o nome dos Arrifes. E, claro está, trabalhar tendo no centro da nossa acção as pessoas, os arrifenses de nascença ou os que aqui escolheram viver.

A falta de habitação é um problema na freguesia?
Tal como já referido, são cada vez mais os pedidos de apoio relativos à habitação, tanto pela escassez de oferta de habitação para arrendamento, quer ainda na resolução de processos relativos à habitação social ou com a habitação degradada. Outra preocupação nesta área prende-se com a habitação para os jovens que revelam grandes dificuldades na aquisição ou construção de habitação. Na actual conjuntura; com os custos dos materiais, com as taxas de juro a aumentar, com as crescentes dificuldades na obtenção de crédito, e ainda, com a falta de mão de obra, esta realidade torna-se ainda mais complexa, sendo, para muitos, proibitivo.

O desemprego tem crescido?
Continuamos a ter pessoas com dificuldade em encontrar emprego, normalmente por falta de habilitações/perfil que coincida com as necessidades de mercado, ou ainda de pessoas que se encontram em situações de menor aptidão, quer seja pela idade já avançada, quer seja por limitações físicas resultantes de diferentes situações. Havendo falta de mão-de-obra, é certo que em muitos casos o sector privado não absorve estas pessoas exactamente por apresentarem estes constrangimentos, pelo que defendo que os programas ocupacionais continuam a ser necessários para dar resposta a estes casos.

A principal actividade económica ainda continua a ser a agro-pecuária. O que poderia ser ainda feito para “acarinhar” mais essa actividade? Há necessidade de melhorar alguns caminhos agrícolas?
A lavoura e a agricultura continuam a ter uma importância fundamental nesta freguesia e são o motor de desenvolvimento de muitas outras actividades e empresas. A importância deste sector tem-se mantido ao longo do tempo e hoje é também considerado um produto turístico da Região, uma vez que quem nos visita aprecia e valoriza esta actividade. Consciente do papel desta actividade na nossa freguesia, a Junta mantém-se ao lado dos lavradores e agricultores naquelas que são as suas lutas, procurando corresponder às expectativas do sector, dentro daquelas que são as suas competências. No caso das competências que saiam do seu raio de ação, continuará a exercer a sua influência junto dos responsáveis, de modo a fomentar a discussão pública destas matérias, reclamando sempre o justo tratamento destas actividades. Numa das primeiras acções deste novo Executivo promovemos uma visita à freguesia junto com a Câmara Municipal de Ponta Delgada e com a IROA para a clarificação daquelas que eram as zonas de acção de cada entidade e alertando para a importância e urgência em manter a manutenção e limpeza dos caminhos agrícolas e municipais. No entanto, e por muitas que tenham sido as nossas advertências, as respostas não têm sido as necessárias e aquelas que os nossos lavradores e agricultores merecem. Continuamos a trabalhar para que a atenção que é devida seja reposta.

As cheias são outro dos problemas recorrentes nos Arrifes? Há algum plano para minimizar essa situação?
São um problema recorrente e, devido à falta de manutenção, de limpeza dos sumidouros e dos esgotos pelas entidades competentes, tem vindo a sentir-se com maior intensidade. É para nós motivo de grande preocupação, pelo que no passado mês de Julho pedimos audiência à Secretaria do Turismo, Mobilidade e Infraestruturas, tendo recebido a garantia de que a intervenção num dos sumidouros das Arribanas e a construção de um paredão para controlo de uma linha de água seria iniciada em julho. Tal não aconteceu devido a constrangimentos da construtora, mas ainda durante o mês de Setembro será iniciada, esperando que possa concluir-se a tempo de fazer face ao próximo Inverno.

Por outro lado, os Arrifes vêm assumindo um papel importante ao nível industrial e comercial com a fixação de algumas empresas. Qual a relevância disso para o futuro da freguesia?
Os Arrifes deixaram de ser uma grande freguesia apenas devido à sua dimensão territorial e ao número de habitantes, para passarem a ser também uma grande freguesia no que respeita à sua capacidade produtiva e competitiva. Esta é uma realidade que nos oferece oportunidades que teremos de agarrar e para que este seja um lugar onde é bom viver, onde o sentido de comunidade é forte. Isso dá-nos alento para ir sempre mais longe!

Tem alguma informação sobre a conclusão das obras na Escola dos Arrifes? Que tipo de constrangimento tem causado essa intervenção?
Até ao momento não fomos informados de qualquer alteração ao inicialmente programado. As obras avançam tendo, claro, oferecido alguns constrangimentos. Desde logo ao nível do ensino com a acomodação dos alunos em parte ainda edificada da velha escola e outros na Escola Profissional EPROSEC. Para além destes, constrangimentos junto dos moradores, mas que temos procurado mitigar, apelando a quem de direito para a correcção de algumas situações de modo a minimizar os impactos negativos causados pela mesma.

Que outras obras/reivindicações existem para a freguesia?
Para além das obras necessárias para contornar os desafios colocados pela nossa geografia, com a construção e manutenção das infraestruturas existentes para garantir a eficaz drenagem dos terrenos, temos o projecto da construção de uma praça na Saúde. Este projecto está dependente da aquisição de um imóvel, sendo esta a última oportunidade de concretizar este projecto por não haver localização alternativa. A Junta está em negociações com a Câmara Municipal de Ponta Delgada e com o Governo Regional dos Açores, e, tendo havido anteriores manifestações de interesse, acreditamos que será um projecto a levar por diante. A construção de um pavilhão multiusos é também uma necessidade premente na freguesia que, com a sua dimensão, não oferece nenhum equipamento desta natureza à sua comunidade.

Para terminar, como perspectiva o futuro e o papel da freguesia nos próximos anos?
Perspectivo um futuro próspero quer pela actividade que hoje tem, quer pela natureza aguerrida e lutadora dos arrifenses. Sabemos que os desafios são muitos, as dificuldades também, mas os Arrifes têm tudo para continuarem a ser uma referência no concelho e na região. Saibamos nós aproveitar este potencial, saibam os governantes reconhecer a nossa importância e valor.     

 

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