Armando Moreira no ‘Gerações’

Gerações de hoje “não se sujeitam a tarefas subalternas e desejam salários ambiciosos desde cedo” com a base única do currículo

 Correio dos Açores - Como se cuidam as gerações nascidas nas décadas de 50, 60 e 70 e quais as diferenças que sentem nas gerações nascidas no novo milénio?
 Armando Moreira (Poeta e escritor) É preciso fazer algumas considerações sobre estas divisões. Não há um consenso sobre elas. A separação por anos não é estanque; os comportamentos variam a partir de vários factores: sítio de nascimento, grau de educação, situação socioeconómica, etc.
Temos que ter em conta que os nascidos de uma geração sofrem, em muitos casos, a influência da geração anterior, por isso alguns comportamentos se misturam.
Quanto a mim, as datas de nascimento tão aproximadas e essas separações geracionais são apenas tendências que identificam alguns grupos, mas que não podem ser generalizadas.

No trabalho?
A geração Y foi desta forma super-exposta a novo nível de informação, afastada dos trabalhos braçais e sobrecarregada de &quot (estudo que é feito à questão geracional das últimas quatro décadas); prémios " e facilidades materiais em troca de pouco ou nenhum esforço físico. Em parte, este processo ocorreu devido a uma aparente compensação a partir dos pais, originários da geração X, possivelmente tentando compensar a lacuna material pelo qual podem ter passado, se comparadas às prosperidades económicas da geração X com a da Y. Ao mesmo tempo, possivelmente tentando viver um nível de materialismo económico através de seus filhos e netos.
Eles cresceram vivendo em acção, estimulados por actividades, fazendo tarefas múltiplas. Acostumados a conseguirem o que querem sem esforço ou prazos consideráveis, não se sujeitam às tarefas subalternas de início de carreira e desejam salários ambiciosos desde cedo, em geral com a suposição de que conhecimento e currículo técnico tornam desnecessários outros atributos profissionais. É comum que os jovens desta geração troquem de emprego com frequência em busca de oportunidades que ofereçam mais desafios e crescimento profissional, ou em função de uma evasão de dificuldades típicas de muitas carreiras. A discrepância na percepção do significado sobre o trabalho e carreira é evidente em diversos fóruns na internet, onde se pode observar o confronto de gerações e o discurso divergente, em geral, criticando a postura da geração Y como " sem interesse " e diversos outros adjectivos.

Nas viagens?
Viajei muito, mas como trabalhador, desde muito cedo, na marinha mercante. O que quer dizer que, acabei por ter esta felicidade.
Sem dúvida, viajar é das experiências mais enriquecedoras e gratificantes das quais uma pessoa pode desfrutar ao longo da vida. Viajar apura os sentidos, abre horizontes, pinta o mundo com novas cores e desafia os seus limites. Antes, era um passatempo de que só algumas pessoas podiam beneficiar mas, hoje em dia, qualquer jovem pode e deve viajar, sem qualquer dúvida
Na minha opinião, quanto mais cedo melhor.
Viajar ajuda a decifrar o que quer fazer da sua vida: expor-se a novos lugares, pessoas e culturas pode definir o sentido da vida.
Aprender sobre o que existe pelo mundo fora pode dar pistas para descobrir o que é seu ou não. Percebe-se que se pode ir além dos limites imaginados e nos podermos surpreender com isso.
Cada cultura é diferente, assim como cada pessoa é diferente dentro da cultura em que está inserida. Adiando essa oportunidade, corre-se o risco de reconhecer o seu potencial tarde demais. Não se perca a oportunidade de explorar o mundo enquanto é jovem.

Na família?
Antes, havia um tempo em que a saída de casa era quase obrigatória que como se dizia: “ tens que fazer à vida” — fosse isso imigração ou na procura de trabalho (emprego).
Apesar de estas tendências, visíveis no prolongamento da fase juvenil da vida, serem centrais nas sociedades contemporâneas, o cenário é, ainda assim, muito diversificado. Como se constata no seguinte: os jovens organizam e vivem a sua vida familiar de formas muito diferentes, notando-se, ainda hoje, o contraste marcado entre os países da Europa do Norte e os países da Europa do Sul. Enquanto nos primeiros, os homens e as mulheres saem de casa dos pais muito cedo (pouco depois dos 20 anos) e tendem, frequentemente, a viver sozinhos, nos segundos, a estadia em casa dos pais tende a prolongar-se até quase aos 30 anos, sendo também muito pequena a proporção daqueles que vivem a sós entre os 18 e os 28 anos.
Evidentemente, a falta de apoios públicos no acesso à autonomia residencial, o menor desenvolvimento e riqueza económica do país e a precariedade laboral persistente entre os jovens constituem o pano de fundo desta realidade, explicando a maior dependência da população mais nova face aos pais. A par da eventual influência de um maior familiaríssimo que ainda persiste em termos normativos, a falta de recursos financeiros aparece como principal constrangimento para a não permanência na casa dos pais. Afinal, segundo dados de 2007 (Eurostat), cerca de dois terços dos jovens portugueses apontava a falta de recursos financeiros próprios como principal motivo para a não saída da casa paterna.

Nos amigos?
Amizade é uma relação de afinidade, reciprocidade, ajuda mútua, respeito e confiança criada entre duas ou mais pessoas. Segundo Winnicott, a amizade remete às noções de intimidade, espaço potencial, reconhecimento da alteridade e concernimento.
Criar uma relação de amizade é um vínculo que se escolhe, por isso tem um peso diferente da família. Os amigos contribuem para a construção da nossa própria identidade, ideias e valores, sensação de pertencimento e objectivos de vida. Além disso, bons amigos são um antídoto para doenças físicas e emocionais. Isso mesmo,  a amizade faz bem à saúde, quando é saudável.

A relação com a internet?
Para mim, a internet tem dois lados.
O lado positivo é que eu posso comunicar facilmente com instituições e com meu banco pela Internet ou quando quero fazer uma viagem. Já não preciso de esperar numa fila e eu posso fazer as minhas coisas online na hora em que eu quero e que me apetece. Isto dá-me uma sensação de liberdade.
O lado negativo é que a Internet, às vezes, é insegura e perigosa. É preciso estar sempre atento aos dados pessoais e verificar se todos os e-mails que se recebe são confiáveis

A relação com os filhos?
Ressalvo a relação maravilhosa que o meu filho mais velho tem com o seu primeiro filho; nos cuidados em geral, mas particularmente nos estímulos maravilhosos que lhe são ministrados, no dia-a-dia, ao longo do seu crescimento. Naturalmente, terá recolhido estes princípios na base da sua educação familiar.

A relação com os netos?
Há quem diga que duas vezes somos pais. A relação é sempre de protecção; num rever intemporal que perpassa o tempo e a mente — projectando-nos para uma experiência preciosa em termos emocionais; sem dúvida única.

O modo de vestir?
A adolescência é entendida por muitos como um momento de descobertas; pessoais e sobre o futuro profissional; e desafios. Também é a fase em que os jovens procuram comunidades para pertencer, compartilhando gostos e opiniões similares. E, quando falamos de gerações que nasceram na era da internet, as informações compartilhadas na rede podem representar esse papel de influência e inspiração.
No meu tempo de jovem também era um pouco assim mas, com a diferença em que estes estímulos eram menos ricos, pela falta de informação e meios económicos de então.

A alimentação?
A Revolução Industrial proporcionou uma série de mudanças no processo de produção de todos os alimentos. Surgiram produtos processados (preparados industrialmente), diversas versões enlatadas (leites, cereais, leguminosas, café e carnes), fora o processo de vendas e distribuição que se tornou mais dinâmico. Outro ponto interessante é que, no passado, as pessoas costumavam comer mais alimentos naturais - afinal, os agrotóxicos passaram a ser usados, de facto, só a partir da década de 1940.
                                     

Print
Autor: João Paz

Categorias: Regional

Tags:

Theme picker