Fruto de uma parceria estabelecida entre a Fábrica de Chá Gorreana e a Universidade dos Açores, motivada pelo projecto TEAhealth, financiado pelo Programa Operacional para os Açores 2020 e liderado pelo professor e investigador José Baptista e pela investigadora Lisete Paiva, a passada Sexta-feira ficou marcada pela apresentação e lançamento de dois novos chás únicos no mundo, tendo em conta o alto nível de L-teanina presente na sua composição.
Isto é, estes dois chás – preto e verde – contêm, de forma natural, mais 70% deste aminoácido reconhecido há muito no chá dos Açores, quando em comparação com as restantes gamas de chá produzido por esta fábrica secular, conforme aponta o resultado deste estudo que teve a duração de quatro anos e que exigiu uma grande colaboração e comunicação entre a academia e a indústria.
O Projecto TEAhealth, explicou a investigadora Lisete Paiva, tendo como objectivo o desenvolvimento de metodologias para a produção de um chá rico em L-teanina, único no mundo e com vários benefícios para a saúde humana, levou ao estudo das condições de produção e de processamento do chá Gorreana, “actuando sobre o tempo de murchamento das folhas, sobre a temperatura e o tempo de secagem das folhas, a localização – em termos de altitude, para vermos se havia diferenças ou não –, e sobre o estudo da época da colheita das folhas”.
O aminoácido em questão é encontrado apenas nas folhas do chá da Camellia sinensis e numa variedade muito rara de cogumelos que até nem é comestível, explicou ainda Lisete Paiva, sendo também conhecido por “aumentar os níveis das substâncias calmantes do nosso cérebro” e por reduzir a quantidade de substâncias que estão ligadas ao stress e à ansiedade, promovendo o relaxamento, a memória, a intuição e a criatividade, benefícios estes que podem ser encontrados através deste novo chá promovido pela Gorreana.
Graças a este projecto, a Fábrica de Chá Gorreana considera que conquistou um lugar que até ao momento não tinha, passando “das provas cegas de chá” que lhe asseguravam qualidade para o mundo da ciência, onde os dados científicos reunidos pelos investigadores da Universidade dos Açores permitem reafirmar a sua qualidade como um chá único no mundo e com propriedades muito valiosas para a preservação da função cognitiva dos seus consumidores.
Para além do aprofundado estudo que foi realizado ao longo de vários anos nas plantações de chá, e tendo em conta a embalagem cuidada e diferenciada que este novo tipo de chá apresenta, Madalena Motta refere que foi feito um investimento numa nova máquina de saquetas, que embrulha o chá em pequenas pirâmides, sendo esta também uma forma de mostrar o quão a sério este produto é levado.
Num primeiro momento, explica a proprietária da Fábrica de Chá, tendo em conta que o primeiro lote é muito pequeno em número, este produto diferenciado será vendido através do site da plantação, embora haja o desejo de, ao longo dos próximos anos, através do conhecimento reunido, aumentar a produção.
Ainda de acordo com Madalena Motta, este chá é “fruto de um estudo muito sério, aprofundado e trabalhoso” com a duração de vários anos, e que permite agora que a Fábrica de Chá Gorreana possa “produzir chá com sabedoria”, conforme adiantou na apresentação do novo produto.
Falando da forma como os trabalhadores da plantação se envolveram também em todo o processo, adianta que estes “sabiam que só podiam apanhar o chá numa altura específica do ano, com pouco sol e, dentro da fábrica, na parte da indústria, quem secava o chá sabia que tinha que ter cuidados muito acrescentados” para que a secagem não ocorresse a grandes temperaturas.
Descreve ainda como o chá, por vezes, tinha que ser secado entre três a quatro vezes a temperaturas mais baixas até ficar completamente seco sem perder a sua riqueza em L-teanina, principalmente no que diz respeito ao chá verde, uma vez que este vem molhado da máquina a vapor, bem como os cuidados para que ocorresse uma oxidação perfeita, sem que esta acabasse por se tornar numa fermentação.
Todo este processo permitiu que existisse uma grande aprendizagem “dentro e fora da fábrica”, sendo esta consciencialização uma grande oferta que a indústria recebeu através da Universidade dos Açores. Actualmente, mesmo em relação aos restantes chás produzidos até aqui pela plantação, há um maior saber em relação ao que pode prejudicar o solo e as propriedades do chá, sendo, por isso, um valioso estudo para o futuro da fábrica.
Uma vez que, até aqui, a Gorreana operava essencialmente com o saber transmitido de geração em geração, este projecto trouxe ainda uma maior abertura em relação ao mundo exterior, uma vez que fez com que esta plantação de chá dos Açores aparecesse em trabalhos científicos publicados internacionalmente e em revistas, permitindo que esta, embora “seja uma fábrica pequena, esteja no topo em termos de saber”, aspecto que interessa muito à quinta geração de proprietários do espaço.
“Não posso inventar o meu tamanho, mas posso inventar os meus valores e o meu saber, e a fábrica de Chá Gorreana é igual, aumentou o seu saber. Ganhámos muito com esta parceria com a Universidade dos Açores, e penso que vamos estar para sempre ligados numa simbiose”, acrescenta ainda a empresária.
Na sua grande parte, este trabalho surgiu devido ao Professor e investigador da Universidade dos Açores, José Baptista, que há vários anos percebeu que poderia existir uma relação entre o consumo de chá verde e a prevenção de doenças como o cancro, graças também a outros trabalhos desenvolvidos a nível internacional que se assentam nesta mesma teoria.
Depois de encontrar estas evidências na literatura científica que consultava, o investigador comprou chá verde de várias partes do mundo (China, Japão, Coreia, Taiwan e Sri Lanka, por exemplo), tendo como objectivo desenvolver uma metodologia que separasse os compostos existentes no chá de Camellia Sinensis, com “elevado poder antioxidante” que pudessem ter “acção quer sobre o cancro, quer sobre as doenças cardio-vasculares”, adianta.
Porém, nos Açores, onde trabalhava neste sentido, apercebeu-se de que o chá local “era menos amargo do que o chá da China ou do Japão”, levando-o a crer que o aminoácido presente no chá açoriano seria mais doce e, por isso, mais intenso na sua eficácia.
“Na altura não consegui fazer o trabalho porque precisava de ter esse aminoácido puro para servir de padrão, mas três anos depois consegui isso através do chá do Japão e depois desenvolvi uma metodologia para comparar os chás de diferentes origens, e cheguei à conclusão de que, realmente, o chá dos Açores tinha mais ou menos o dobro da quantidade desse aminoácido relativamente a 16 chás chineses. Fiquei entusiasmado, não por ele ser doce, mas porque este aminoácido altera-nos a química do cérebro”, explica o professor.
Assim, anos mais tarde, o projecto TEAhealth foi apresentado à Comunidade Europeia, tendo como objectivo o desenvolvimento de metodologias de produção que permitissem aumentar a quantidade deste aminoácido presente no chá, e, após a sua aprovação, José Baptista e Lisete Paiva começaram a trabalhar juntos neste objectivo.
“Chegámos a condições de aumentar este aminoácido em 70%”, explica ainda o professor, adiantando que este aminoácido é essencial para estimular a velocidade de comunicação dos neurónios presentes no nosso organismo através dos seus neurotransmissores, permitindo que “possamos chegar a idades mais avançadas com as nossas funções cognitivas a funcionar”.
Em acréscimo, salienta que estes aminoácidos estão a ser já utilizados pela comunidade científica a nível internacional para estudar problemas neuronais provocados por doenças degenerativas tal como Alzheimer e Parkinson, em casos de pessoas que sofrem de demência e também em pessoas com Esquizofrenia ou, ainda, em pessoas que procuram reduzir a sua ansiedade e níveis de stress.