29 de novembro de 2022

Inflação versus aproveitamento

 Todos nós sabemos que vivemos um período difícil. Porém, há quem diga que a dificuldade aguça o espírito na procura de soluções. Todavia, quando se envereda pela via mais fácil – aumento indiscriminado dos produtos – o resultado não é benéfico, nem para o comércio nem para o consumidor.
Estive ligado ao comércio várias décadas e tenho plena consciência de que uma subida de preços na origem obriga a uma revisão e actualização de preços, tanto nas vendas por grosso quando as há, como na venda a retalho, ou venda ao público, como queiram.
Mas quando me aparece pela frente um qualquer produto com o preço de venda ao público em etiqueta de fábrica, e, na prateleira do estabelecimento, uma outra etiqueta, com igual código de barras, mas com um preço quase a duplicar o indicado pela fábrica, é sinal que estão a aproveitar-se da onda de aumentos infelizmente generalizados.
Questionado o funcionário do estabelecimento este responde que o produto estava ainda com “embalagem antiga”.
Sem levantar qualquer espécie de problema, deixei para trás aquele artigo e optei por adquirir o mesmo produto de outra fábrica que, apesar de vir de fora e pagar transportes, era mais barato do que aquele sugerido pela fábrica local. 
Infelizmente, são muitos os artigos do ramo alimentar que, apesar de importados e com os custos inerentes a tal condição, são, ainda assim, vendidos a preços mais baixos do que os fabricados localmente. 
Em minha opinião, o estabelecimento em causa, estava a aproveitar-se “da moda”, para subir o preço.
No meu tempo de comerciante, havia legislação que condenava este tipo de procedimentos. Desconheço se, actualmente ainda existe a mesma lei, ou se, andamos em roda livre nesta matéria.
Porém, uma coisa é certa: havendo um organismo de fiscalização económica (como há) e acontecendo o que acabo de relatar, é sinal de que aquele organismo não está a conseguir cumprir a função que lhe está destinada e para a qual foi criado. 
Mas o aproveitamento, apesar de geral, tem tido especial relevância nos bens alimentares. Diga-se que, em abono da verdade que, muitos deles, sem justificação para subidas tão elevadas.
Exemplos?  É o caso dos produtos hortícolas locais que quase duplicaram os preços, assim como os produtos lácteos que subiram exponencialmente. Pelo que tem vindo a púbico, e no que aos lacticínios diz respeito, não parece ter havido grandes aumentos da matéria prima e o agravamento do custo dos combustíveis não justifica, por si só, o aumento destes bens de consumo.
Sou dos que pensam que, em tempos de crise como a que estamos a atravessar neste momento é necessária uma intensificação da fiscalização para não haver abusos como os que estão a acontecer presentemente, não só para os bens atrás citados, como também para as carnes e peixe de modo particular.
Por falar em peixe e carne não podemos, nem devemos, estar na mão de meia dúzia de exportadores que, tendo quem lhes pague melhor fora da região, esvaziam as lotas e os matadouros sem ter em linha de conta que, nestas ilhas, há toda uma população que também come. 
É do conhecimento público que os vencimentos dos trabalhadores da região não são altos não podendo, por isso mesmo, chegar aos preços correntes do peixe e da carne. Assim, limitam-se a comprar as variedades de peixe mais baratas, por isso menos nobres, fazendo o mesmo com as carnes.
Já tenho aqui defendido que o nosso governo, baseado em estudos de mercado credíveis, deveria legislar de modo a que as lotas e os matadouros reservassem determinadas quantidades de peixe e carne para o consumo local.
Se o nosso peixe e a nossa carne são de excelência, como há quem o afirme, pois que venham cá degustá-los.
O que está acontecendo agora, para mim, só tem um nome: aproveitamento!

 Carlos Rezendes Cabral
 P.S. Texto escrito pela antiga grafia.
27NOV2022

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Categorias: Opinião

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