O Presidente da IP (Infraestruturas de Portugal) apresentou recentemente na Assembleia da República o projecto do novo Anel de Cabos Submarinos Ópticos CAM (Continente-Açores-Madeira).
O novo Anel CAM é um importante investimento nacional que, quando concluído, permitirá substituir os cabos submarinos ópticos em funcionamento desde o ano 2000. Espera-se que seja um sistema de última geração. Inclui uma interessante e avançada componente “SMART”, que permitirá a detecção sísmica e a obtenção de dados ambientais em profundidade no Atlântico Norte.
O novo Anel apresenta uma configuração diferente do CAM actual, nomeadamente com mais pontos de amarração e com mais estações terminais. No caso dos Açores, além da existente amarração e estação terminal da ilha de São Miguel, agora está previsto um local de amarração e uma estação na ilha Terceira. Na ilha da Madeira está preconizado um segmento terrestre, com dois locais de amarração e pelo menos uma estação terminal. No continente português estão projectadas amarrações em Carcavelos e Sines e respectivas estações.
Desconhecemos os estudos técnicos e económicos/financeiros que sustentam a solução apresentada, da qual temos dúvidas, porquanto:
1) A reutilização das estações terminais, nomeadamente a de Ponta Delgada (Fajã de Baixo) foi precavida de uma avaliação anti-sísmica à estrutura do edifico?
2) A utilização de infra-estruturas propriedade do Operador Incumbente (Altice) não porá em causa um dos anunciados desígnios do projecto, que pretende ser neutro e independente dos Operadores de Telecomunicações estabelecidos?
3) A introdução de mais pontos de amarração, nomeadamente nos Açores, teve em consideração os riscos geológicos, as agressões externas e as condições marítimas específicas (abrigo, natureza os fundos, batimétricas, etc.)?
4) O aumento de estações terminais de 3 para 5 (se não mesmo 6) não é contrária à simplicidade, introduzindo riscos desnecessários?
5) A localização das novas estações terminais foi coordenada com a comutação e processamento de tráfego dos Operadores de Telecomunicações?
6) A proliferação de pontos de amarração e de estações terminais, com os consequentes riscos operacionais, comerciais e de gestão, não será antagónica com outro dos objectivos do projecto, que é, justamente, contribuir para a plataforma atlântica de amarração, atraindo novos cabos submarinos internacionais para os Açores e Madeira?
7) Quais as consequências da coexistência de segmentos submarinos com amplificadores com segmentos sem amplificadores?
8) Quantos pares de fibras terá cada um dos segmentos submarinos? Terá o actual “standard” de 24 fibras?
9) Qual é o débito por cada comprimento de onda e qual o débito total do sistema?
10) Qual é a coordenação entre o projectado Anel CAM com a necessidade de urgente da substituição do Anel Açores Inter-Ilhas, que termina a sua vida útil já em 2023?
11) Terá o projecto o objectivo, não declarado, de transferir da ilha de São Miguel para a ilha Terceira o principal nó de amarração dos cabos submarinos (Anel CAM e Açores Inter-Ilhas) e em consequência o PoP (Point of Presence) dos Açores, em contraciclo com o tráfego?
12) Não será demasiado ambicioso, se não mesmo irrealista, anunciar um prazo de conclusão em 3 anos, para 2026, quando estamos perante um projecto de alguma envergadura e complexidade, desde logo, com um conjunto muito considerável de infra-estruturas terrestres e em diferentes geografias?
Projectado no final dos anos 90 do século passado, o actual Anel CAM tem tido uma elevada disponibilidade e qualidade de serviço, demostrando o acerto das opções então empreendidas. Pelo contrário, sem que haja explicações para as opções do novo Anel CAM, não parece que o sistema incorpore uma melhoria dos riscos, nem tão pouco, tenha coerência com os anunciados objectivos estratégicos.
Sem que se perceba os benefícios, estão a ser introduzidos riscos acrescidos injustificados, nos segmentos submarinos, nos segmentos terrestres e na quantidade de estações terminais. A dispersão na gestão e encaminhamento do tráfego, é prejudicial para a segurança, para a disponibilidade dos meios e qualidade de serviço, além de incrementar os prazos, os custos de instalação e de operação e ainda dificultar a gestão comercial do Anel.
Esperemos que o novo Anel CAM não seja uma oportunidade perdida, que só se repetirá daqui a 30 anos, muitas vezes, um fatal apanágio nacional!
Ponta Delgada, 02 de Dezembro 2022
João Quental Mota Vieira