A grande festa da família para os madeirenses é o Natal. Assente em arreigadas tradições a sua celebração, tão calorosa, transmite, inclusivamente, aos visitantes esse espírito natalício único que, em muitos casos, os fazem regressar, todos os anos, para celebrarem esta época tão marcante. “A Festa”, como costumam dizer os madeirenses, estende-se até 15 de janeiro, Dia de Santo Amaro, ocasião para se varrerem os armários, deixando-os vazios até que, de novo, se encham no Natal seguinte. Mas “A Festa”, transporta em si uma série de rituais que, felizmente, têm-se mantidos vivos durante todos estes anos.
A Festa começa no início de dezembro, com a preparação, pelas famílias, dos bolos de mel: uma amassadura em que se misturam vários ingredientes, entre esses a cidra, os frutos secos, nozes e mel de cana. Os bolos devem conservar uma certa humidade. Conforme as receitas, eles conservam-se inalteráveis durante um ano. Em franco convívio, muitas famílias reúnem-se nas padarias onde cozem os bolos. Na mesma altura, começa a preparação dos licores tradicionais: de tangerina, de limão, de banana, de maracujá, o aniz e o misterioso Tin-Tan-Tum. A estes junta-se a confeção dos pickles. No dia 8 de dezembro, já a Madeira está inundada de luz, nas ruas, montanhas e praças, deitam-se de molho as searas de trigo e de milho. Searas que ornamentam as “lapinhas”, as “escadinhas” e os presépios, estes feitos com socas de cana vieira. No dia 15 começam as Missas do Parto que cada vez reúnem mais fiéis, muitos jovens. São 9 novenas que geralmente se celebram a partir das 5 da manhã, nas diferentes igrejas da Região com cânticos, antecedendo o dia de Natal. No final da celebração os fiéis juntam-se nos adros das igrejas. Aí, por entre cantares, alusivos à época, distribuem-se bolos, broas e licores. É a parte pagã da festa.
Nas ruas do Funchal todos os dias à mistura com milhares de pessoas, tocadores e bailadoras, dos grupos folclóricos, com seus trajes garridos e vozes bem timbradas, enfeitam de alegria a cidade.
Na véspera do dia 25 de dezembro celebra-se a Missa do Galo. As igrejas enchem-se de cânticos, flores e luzes. Nas casas dos madeirenses, logo após as missas, servem-se a canja, a carne de vinho e alhos, o cacau quente, os bolos e as broas de mel.
Uma tradição que se mantém ainda viva é a das visitas às casas uns dos outros para verem as tradicionais “lapinhas”. Um convívio sempre agradável, onde não faltam os tradicionais licores e bolos. Seguem-se os dias que antecedem o fim de ano, sempre com programas especiais, e com uma avalanche de turistas sentados nas esplanadas ou a correrem de um lado para o outro a fim de se integrarem no ritmo citadino e admirarem as decorações natalícias. Depois vem a última noite do ano, cuja beleza e grandiosidade do espetáculo pirotécnico, considerado dos mais belos do mundo, é indescritível. Nesse momento, em que o céu se ilumina com os fogos de artifício, assiste-se às cenas mais emocionantes que se possam imaginar: turistas e locais, mesmo sem se conhecerem, abraçam-se fraternamente e brindam com vinho ou espumante a entrada do novo ano. Cenas que se passam e repetem-se no Cais da Cidade e na Praça do Povo, lugares privilegiados para se assistir à passagem do ano.
A todos estes rituais segue-se o cantar dos Reis, de 6 para 7 de janeiro. Os amigos reúnem-se com os seus instrumentos e cantares vão batendo, de casa em casa, pela noite dentro, animando os donos das casas, obrigando-os a se levantarem das suas camas para lhes oferecerem de beber e comer. Depois integram-se na “peregrinação”. Há um aspeto que se repete de casa em casa: é do “assalto” aos armários dos ovos que no final, na última casa, servem para fazer uma deliciosa açorda. Geralmente chega-se à última casa, por volta das 7 horas da manhã.
Um ano levei para cantarem os Reis, uns amigos de Canárias, entre eles estava o Presidente Jerónimo Saavedra. Foi uma noite inesquecível, pela animação, pela novidade, pela confraternização. Há momentos na vida que não se repetem mais, como o dessa noite, por exemplo, por isso devemos aproveitar todas as ocasiões para se desfrutar da vida o mais intensamente possível. No dia 15 de janeiro celebra-se o Santo Amaro. Esta festa tem mais expressão no Concelho de Santa Cruz. Nesse dia varrem-se os armários que se enchem depois no Natal seguinte.
Aqui fica uma súmula do que é “A Festa” na Madeira. Se o leitor não tiver a oportunidade de viver esta nossa “Festa” este ano, marque já, para o ano próximo, a sua visita à Madeira e assim participará, nesta época, tão querida dos madeirenses.
Na terça-feira, dia 1 de dezembro, a Madeira inundou-se de luz: milhares de lâmpadas ziguezagueiam as montanhas e as ruas do Funchal apresentam-se com uma magia única. Uma cidade cuja beleza e poesia não cabe em qualquer descrição ou imagem. É preciso vivê-la em todo o seu esplendor e nos seus pormenores artísticos. É preciso senti-la no ritmo do seu coração que, nestes dias, é mais amada e admirada e mais acelera o seu andar. Uma cidade que adormece nos “braços gigantes” das araucárias e desperta num mar de buganvílias em flor, de todas as cores. É por tudo isto, que os madeirenses estão sempre apaixonados pela sua ilha. Parecendo inacreditável, mal termina o Natal, muitos deles, já estão pensando no próximo. É, em muitos casos, a sensação ilusória da eternidade que alimenta o sonho...
João Carlos Abreu