José Carlos Carreiro, Presidente do CA da Escola Profissional de Nordeste

“É necessário fazer mais para se salvar a tempo o ensino profissional dos Açores”

Qual o papel desempenhado pela Escola Profissional do Nordeste no desenvolvimento do concelho?   
Antes de responder à primeira questão colocada, cumpre-nos saudar a iniciativa do vosso jornal para com o ensino profissional, nomeadamente para com a nossa escola, prestando um serviço que, de há muito, deveria ter sido feito e, possivelmente, o ensino profissional na Região não estaria como se apresenta. Um olhar mais atento ao ensino profissional pela comunicação social poderia ter sido uma aposta na busca de soluções com que este tipo de ensino se debate nesta Região. Relativamente à pergunta, a Escola Profissional de Nordeste foi e é, desde a sua criação, há 25 anos, e a nosso ver deverá continuar a ser, não vemos razão para o não ser, pilar fundamental do e para o desenvolvimento do concelho de Nordeste e da educação e qualificação dos seus/as munícipes e todos/as aqueles/as que queiram realizar a sua formação na nossa escola. Reveste-se, assim, de grande importância, nem sempre, infelizmente, reconhecida pelos poderes vigentes no combate ao processo continuado de desertificação que assola as zonas rurais dos Açores, nomeadamente, o concelho de Nordeste.

818 formandos

Quantas pessoas formaram ao longo destes anos?
Recordamos que, ao longo destes 25 anos, a Escola Profissional do Nordeste formou 818 formandos, o que tendo em consideração a dimensão demográfica do concelho, é digno de registo.   

Actualmente quantos alunos frequentam os vossos cursos? Que cursos leccionam presentemente?
Actualmente a escola lecciona para 40 formandos distribuídos pelos cursos de Técnico/a de Comunicação e Serviço Digital, Técnico/a de Design de Comunicação Gráfica, Técnico/a Auxiliar de Saúde, Técnico/a de Desporto e de Animador/a Sociocultural.

O número de alunos inscritos tem vindo a diminuir nos últimos anos?
À semelhança do que acontece em toda a parte, não somos excepção no que respeita à diminuição acentuada do número de candidatos à frequência dos cursos profissionais. Recorde-se que em cada ano lectivo a Região perde cerca de 1.000 alunos e este facto repercute-se numa escola e num concelho de pequena dimensão como o nosso.

Relativamente aos trabalhadores (auxiliares, administrativos e professores), quantos estão afectos à Escola?
Neste momento estão afectos à escola 7 funcionários entre pessoal administrativo, auxiliar e dirigente.

Entrando concretamente na vertente financeira, qual é, à data de hoje, a situação da Escola? Qual o montante exacto do passivo?
A situação financeira desta escola é idêntica à situação da maioria das escolas profissionais da Região. Se colocarmos esta questão a cada uma delas, como nos foi colocada, verão, com a maior clareza, que as situações por que passamos são as mesmíssimas por que passam as escolas situadas, quer no Grupo Oriental, quer até mesmo, no Central. E a explicação, que não necessita de ser explicada, passe o pleonasmo, prende-se com uma política altamente desastrosa que concorrerá para o desaparecimento dessas instituições. Se assim não fosse, há muito já teriam sido tomadas medidas para evitar o que inevitavelmente irá acontecer. A história, como sempre, registará os autores de tamanha façanha. Isto porque, como sabem, as escolas são penalizadas em 4,35% do financiamento por cada aluno que desiste, sofrendo ainda uma dupla penalização quando os formandos não terminam o seu percurso formativo com sucesso. Em ambas as situações, as escolas não podem ser responsabilizadas, para já não falarmos de situações pontuais mal resolvidas e que acarretaram despesas incomportáveis para a escola.

Essas dificuldades financeiras já se refletem, concretamente, em atrasos no pagamento a fornecedores, a alunos e aos trabalhadores da Escola?
Ainda não. Felizmente!
 A Escola corre o risco concreto de encerrar?
A nós, não nos cabe prever o dia de amanhã. É uma questão que deverá ser colocada aos governantes que tutelam muito da vida das escolas profissionais. E encerrar um estabelecimento desta tipologia não pode ser uma decisão de ânimo leve, nem com intuitos eleitorais ou por pressões externas pouco ou nada abalizadas.

No caso de encerramento, tendo em conta as particularidades do concelho, para onde seriam transferidos os alunos da Escola?
Se tal vier a acontecer, os formandos, como em tudo, serão livres de escolher isto porque esperamos que, nessa altura, a democracia ainda esteja em vigor.

Qual a sua opinião acerca do actual modelo de financiamento das escolas profissionais privadas e sociais?
Com o Açores 2020 foram implementadas as regras que criaram, de forma inevitável, a situação gravosa que define o actual panorama do ensino profissional na Região. Este Quadro Comunitário de Apoio (QCA) criou grandes constrangimentos à maioria das escolas profissionais, os quais não podem ser transpostos para o novo QCA e cujas ferramentas para a sua eliminação estão à disposição da vontade política que leva a cabo a negociação do Açores 2030. Para o efeito, os governantes mais directamente ligados a este processo deverão ter o cuidado de ouvir a tempo, para depois concretizar o parecer das escolas, porque é uma obrigação que lhes assiste e não deverão apresentar medidas para as quais as escolas não foram minimamente ouvidas. Convém referir, por aquilo que sabemos, que a maioria das escolas passa por idênticas dificuldades. Excepcionam-se as que recebem apoios de outras entidades, sem os quais estariam a passar pela mesmíssima situação e outras que gozam de benefícios que não são extensíveis à maioria dos comuns. É que milagres não acontecem!


“É necessário mais para
se salvar a tempo o ensino
profissional dos Açores”

Que alterações deveriam ser implementadas?
Relativamente às alterações que deviam ser implementadas, consideramos que as regras de penalização financeira por desistência e/ou não aproveitamento dos formandos não são minimamente consentâneas com o que deverá ser o modelo de educação/formação, seja em que contexto for. Tal como se verifica ao nível da formação profissional no ensino regular, onde as unidades orgânicas nunca são penalizadas financeiramente pelas desistências ou inaptidão dos alunos. Para eles… tanto faz terem 17 como 7 alunos, como que a dizer que uns são filhos e outros...    

O Governo publicou recentemente uma Resolução (Resolução do Conselho do Governo n.º 1-A/2023 de 6 de janeiro de 2023) onde é autorizada a concessão de um apoio financeiro com vista à comparticipação dos gastos de financiamento das escolas profissionais. De que forma esta medida pode ajudar a resolver ou a mitigar o problema da Escola Profissional do Nordeste?
Esta medida tão propalada e para os que a desconhecem, não ajuda rigorosamente em nada, porque nesta altura já deveria estar disponível o dinheiro do Fundo Social Europeu e, como esse dinheiro não está disponível - a culpa não é nossa e das escolas - o Governo teve de se chegar à frente para que as escolas pudessem funcionar. Até aqui, não há nada de extraordinário, nem nada se alterará no normal funcionamento das escolas. Rigorosamente, não há nenhuma mais-valia no que se refere à resolução dos problemas atrás referidos e com que as escolas se debatem.

O Governo (este e os anteriores) tem feito tudo ao seu alcance para evitar a deterioração deste tipo de ensino profissional na Região?
Têm feito alguma coisa, mas julgamos que é necessário mais para se salvar a tempo o ensino profissional dos Açores.

Sente que o ensino profissional privado e social pode estar em risco nos Açores?     
Perante este cenário, ultimamente tão badalado, não temos dúvidas de que o ensino profissional nos Açores está gravemente enfermo, a necessitar de terapias de choque, sob pena de se comprometer a formação das gerações vindouras e amanhã o ensino profissional já não fazer parte dos tão ambiciosos discursos eleitorais. Neste momento, a Região carece de gente positiva e resiliente que a tempo, saiba ainda corrigir o que está manifestamente a prejudicar as Escolas, isto é, o número de alunos por curso e o financiamento dos cursos, sem o qual não é possível a estes estabelecimentos de ensino subsistir.             

Luís Lobão

 

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Autor: CA

Categorias: Regional

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