Correio dos Açores - Por que motivo abandonou os Açores e foi para Lisboa?
Bruno Silveira (Empresário) – No dia 10 de Junho faz 15 anos que fui para Lisboa, com o intuito de fazer televisão e teatro. Era militar, mas sempre gostei de representar e tinha jeito para fazer rir as pessoas. Então, fui para a capital, estudei representação e a oportunidade de representar acabou por surgir, tendo feito algumas novelas e teatro. Todavia, quando passei a trabalhar a recibos verdes, acabei por me desvincular um pouco da televisão, pois não era vantajoso economicamente, e por engrenar na restauração.
Como surgiu o restaurante Açores na Feira?
Primeiramente, fui trabalhar para a cozinha do restaurante Jardim da Luz e, mais tarde, passei a desempenhar funções de empregado de mesa, algo em que era muito bom, pois estava sempre a interagir e a brincar com os clientes, e eles gostavam imenso de mim.
Entretanto, um senhor foi ao restaurante e convidou-me para ir para a baixa de Lisboa, concretamente para as portas de Santo Antão e eu aceitei o convite, tendo em conta que ia ganhar mais dinheiro.
Numa fase inicial, trabalhei como empregado de mesa, mas, como ele viu que eu era bom comunicador, pôs-me a chamar os clientes para o restaurante. Comecei a fazê-lo e tornei-me muito bom nisso. Andava bem vestido, de fato de gravata, a chamar clientes e enchia o restaurante. Recordo-me que havia um senhor que era muito bom chamador, o Sr. Rodrigues, a quem chamavam Messi. Visto que me tornei no melhor chamador de todos, chamavam-me de Cristiano Ronaldo dos Açores.
Depois, fui convidado para ir trabalhar para o Fullest, um grupo muito grande que conta com muitos restaurantes. Fui trabalhar para eles, compraram-me um carro e eu andava na baixa lisboeta a encher os restaurantes do grupo, até que um senhor comentou comigo que havia um espaço na Feira da Ladra que estava vazio. Apesar de ter a experiência toda da restauração, não me sentia confiante para investir no restaurante sozinho, pelo que fiz a proposta a um amigo. E assim foi, abrimos o Açores na Feira a 20 de Setembro de 2017. Todavia, cerca de dois meses depois da abertura do restaurante, acabei por comprar a parte do meu amigo e tornei-me no único proprietário do restaurante.
Os meus pais foram para Lisboa ajudar-me no restaurante. Numa primeira fase, eles estavam na cozinha e eu estava na frente, a servir os clientes. A minha mãe e o meu pai ficaram até eu arranjar uma equipa para a cozinha, a quem ensinaram a confeccionar pratos típicos da Região Açores. Felizmente, as coisas começaram a correr muito bem e foram evoluindo.
Aprendeu também a cozinhar com os seus pais?
A minha mãe alertava-me e dizia-me para aprender tudo, caso algum dia faltasse o cozinheiro eu saber desenrascar-me. Há pouco tempo, estive na cozinha durante 15 dias a fazer as férias das cozinheiras que estiveram fora ao mesmo tempo.
Além disso, com os meus pais, aprendi a ser um homem honesto, honrado e humilde.
O Açores na Feira situa-se na Feira da Ladra. Está satisfeito com a escolha do local para o restaurante?
Antes de abrir o restaurante, fui inteirar-me sobre o local e sobre a Feira da Ladra. Esta feira conta já com muitos anos, e à Terça-feira e ao Sábado, tem muita gente. Lembro-me de pensar que, pelo menos, nestes dias havia de ter clientes suficientes. Aliás, escolhi designar o restaurante Açores na Feira, porque está mesmo inserido na Feira da Ladra.
Além disso, a zona começou a ficar cada vez mais turística por causa do Panteão Nacional que se situa em frente. Hoje em dia, orgulho-me de dizer que já somos conhecidos pelos Tuk Tuk e pela Câmara do Comércio de Lisboa, por termos uma ementa típica e também diferenciada.
Como se distingue a vossa ementa actual? As refeições são confeccionadas exclusivamente com produtos dos Açores?
Não fazemos só comida açoriana. Incluímos, também, na nossa ementa pratos da gastronomia portuguesa em geral.
De manhã, das 9h ao meio-dia, temos o brunch; ao meio-dia temos o menu do dia que inclui, de Segunda a Sexta-feira, um prato típico açoriano. Quem quiser também pode pedir um prato da carta. À tarde, temos os cocktails, depois o jantar e o estabelecimento encerra às 23h. Ao Domingo temos um brunch especial, porque dizemos, em jeito de brincadeira, que Domingo é o “Dia do Português”.
Desde a sua abertura, o que tem feito para inovar o restaurante?
Tenho implementado cada vez mais coisas. Em 2019, implementei o brunch todos os dias e tem resultado muito bem. Uma vez que o restaurante se insere numa zona turística, com muitos alojamentos locais perto, acabei por fazer parcerias com alguns dos alojamentos, em que os clientes têm um desconto para ir ao Açores na Feira tomar o pequeno-almoço.
Que iguarias dos Açores têm mais saída?
Relativamente às entradas, as lapas e a morcela são as mais pedidas. No que toca a peixe, tenho que nomear o bife de atum. Quanto à carne, o bife regional sai muito bem assim como a alcatra regional da Terceira. Aliás, a alcatra é o nosso ex-libris. Quando abri o restaurante, fazíamos 10 quilos de alcatra e dava para uma semana; hoje em dia fazemos 10 quilos por dia. Dada a sua popularidade, a alcatra pode-se pedir todos os dias como prato do dia.
Que feedback têm dos clientes?
Infelizmente, não conseguimos contentar todas as pessoas, porém, na generalidade, o feedback é muito bom. O facto de irem lá muitos artistas, nomeadamente actores e malta da televisão, conhecida do público em geral, que trabalharam comigo e que me conhecem de outras andanças, acaba por ser uma ajuda, visto que as pessoas, por curiosidade, acabam por ir atrás dos famosos.
Que famosos já frequentaram o Açores na Feira?
Oceana Basílio, Paulo Pires, Fernando Rocha, Pedro Teixeira, Cristina Ferreira, entre outros. Aliás, considero a Oceana Basílio uma grande amiga e tornei-me também amigo do Pedro Teixeira, com quem jogo póquer. Não posso deixar de referir o meu grande amigo Flávio Furtado que leva imensa gente ao restaurante e ajuda-me bastante nesse sentido.
No entanto, apesar de agradecer muito a presença deles no Açores na Feira, importa salvaguardar que não pago a ninguém para ir comer ao restaurante. Posso até oferecer um café ou um licor dos Açores, mas o restante é pago como os outros clientes. “Amigos, amigos, negócios à parte.” Quando convido é diferente.
Quem vos procura mais, turistas ou locais?
Os turistas procuram-nos muito, mas também já temos a nossa clientela fidelizada. Temos clientes que trabalham próximo do restaurante que vão, pelo menos, quatro vezes por semana lá almoçar. Muitos turistas procuram-nos por ser um tipo de comida típico. Muitos destes até pensam que é comida típica de Lisboa, mas nós explicamos-lhes que é dos Açores. Assim, damos a conhecer a Região. Tenho fotografias expostas no restaurante das nove ilhas e os clientes, especialmente os turistas, gostam de imenso de ver. Acabo por promover, de certa forma, o arquipélago, ao ponto de ter criado a Happy Azor.
Em que consiste a Happy Azor?
O grupo Happy Azor é um projecto que inclui alojamento, restauração e lazer. Comecei a comprar casas velhas na minha terra natal, a Terceira, e a restaura-las para fazer alojamento local. Embora remodelemos tudo, tentamos manter-nos fiel à arquitectura inicial dos imóveis, deixando determinadas características e aspectos que mantém a sua identidade.
Neste momento, temos oito casas de alojamento local. Temos cinco propriedades no Porto Judeu; duas casas nos Biscoitos; na Agualva temos habitações florestais situadas no meio do mato; e na Fonte do Bastardo temos uma quinta que apesar de ter uma casa, não serve para pernoitar, mas sim para as pessoas estarem em contacto com a terra e alguns animais, como as galinhas por exemplo.
Agora, pretendemos focar-nos e desenvolver actividades relacionadas com a parte do lazer. Adquirimos dois barcos e eu tenho um irmão, o João, que tem carta de patrão local e costa. Fazemos isso como skipper. Os clientes podem usufruir deste serviço caso queiram ir pescar ou fazer mergulho de apneia, por exemplo. Também há a possibilidade de alugarmos o barco.
Em que outros projectos se encontra envolvido?
Entrei numa parceria com dois amigos, nomeadamente o Pedro e o Diogo, que é o meu melhor amigo e é chef de cozinha. Juntos abrimos o La Partilla Tapas Bar no Bairro Alto, cujo conceito é tapas e petiscos. Os turistas, especialmente, gostam do conceito.
Que expectativas tem para este ano?
Acredito que vamos ter um bom ano. Por virmos de uma pandemia, as pessoas estão com vontade de sair e viajar e, até à data, o mês de Fevereiro está a correr bem. Contudo, confesso que tive que fazer uma carta nova para o restaurante, que entra em vigor a 15 de Fevereiro, porque o preço dos bens aumentou muito. A título exemplificativo, posso adiantar que as nossas lapas, que custavam 15 euros, passam a custar 17 euros e o bife regional, que estava a 16 euros, passou para 18 euros. Infelizmente, vi-me obrigado a subir os preços, visto que está tudo caro.
Que projectos tem em carteira e quais são as suas perspectivas relativamente ao futuro?
De momento, estou a restaurar uma casa nos Biscoitos que pretendo que seja alojamento local com um restaurante ao lado. A minha ideia é que este restaurante seja típico e com poucos pratos: um prato de peixe, outro de carne, quatro entradas e mais nada.
Além disso, o contrato de arrendamento do espaço, onde se situa o Açores na Feira, foi renovado por oito anos. Embora não me queira desfazer do Açores na Feira, quero focar-me nos meus negócios na Terceira, porque o meu objectivo é regressar permanentemente à ilha daqui a nove a dez anos. O Açores na Feira é muito importante para mim, porque tudo o que tenho hoje deve-se a este restaurante, designadamente os investimentos na Terceira e o investimento no La Partilla. Ou seja, o maior impulso em termos de investimento deve-se ao Açores na Feira.
Carlota Pimentel