No actual cenário de alta inflação e com a subida das taxas Euribor, acha que o valor emprestado pelos bancos para comprar casa pode diminuir?
Gustavo Frazão (Economista): Sim, é possível que o valor emprestado pelos bancos para a compra de imóveis diminua em cenários de alta inflação e aumento das taxas Euribor. Isso ocorre porque, nesse tipo de ambiente económico, os bancos tendem a ser mais cautelosos na concessão de empréstimos e a aumentar as taxas de juros para compensar o risco de inadimplência, isto é, da existência de incumprimento e de perda de valor do dinheiro emprestado devido à inflação. Além disso, em cenários de alta inflação, os preços dos imóveis podem subir rapidamente, o que pode limitar a capacidade dos compradores de suportarem as prestações do empréstimo e reduzir a disponibilidade de crédito imobiliário.
No entanto, é importante referir que as condições dos empréstimos podem variar de banco para banco, dependendo das políticas económicas e das regulamentações financeiras vigentes. Portanto, é sempre recomendável consultar as condições do empréstimo específico de cada instituição financeira antes de tomar uma decisão de compra de imóvel.
Depois da crise pandémica, fala-se que havia uma poupança. Qual o ponto da situação das famílias, em seu entender? É possível continuar a poupar, ou é mais difícil?
Durante a crise pandémica, muitas famílias tiveram as suas finanças afectadas devido à redução dos rendimentos e ao aumento de gastos com saúde e outros itens essenciais. No entanto, com a retoma gradual das actividades económicas e o auxílio emergencial ( moratórias no crédito, subsídios, etc.) concedido pelos governos, muitas famílias conseguiram criar as suas poupanças, até mesmo porque alguns hábitos de consumo alteraram-se.
Em relação à possibilidade de continuar poupando, isso depende de vários factores, como a estabilidade do rendimento, o nível de endividamento, o custo de vida e a capacidade de controle das despesas. Em alguns casos, pode ser mais difícil manter um nível de poupança adequado, em virtude do aumento de preços de produtos e serviços essenciais, mas é sempre possível adoptar medidas de controle de despesas e planeamento financeiro para equilibrar as contas e manter uma poupança interessante. Mas, é importante lembrar que poupar é uma estratégia importante para garantir a segurança financeira no futuro, permitindo que as pessoas tenham recursos para lidar com imprevistos e realizem seus objectivos a longo prazo, como a compra de uma casa, a educação dos filhos e a reforma.
Qual o caminho que as famílias devem percorrer para não serem apanhadas desprevenidas no que ao crédito diz respeito?
Existem algumas medidas que as famílias podem tomar. Em primeiro lugar, conheça as suas finanças. Antes de assumir qualquer dívida, é importante que as famílias tenham uma visão clara de sua situação financeira actual, com informações sobre os rendimentos disponíveis, gastos e dívidas existentes. Isso permitirá que elas avaliem com mais precisão sua capacidade de assumir novas dívidas.
É importante criar um orçamento. Um orçamento detalhado é essencial para ajudar as famílias a controlar os seus gastos e evitar o endividamento excessivo. É importante que o orçamento inclua não apenas as despesas regulares, mas também as despesas imprevistas e a poupança para emergências. Compare as opções de crédito. Antes de obter um empréstimo ou cartões de crédito, é importante pesquisar e comparar as diferentes opções disponíveis. Isso permitirá que as famílias encontrem as melhores taxas de juros e as características mais adequadas às suas necessidades.
Deve-se evitar o endividamento excessivo, pois este pode levar a dificuldades financeiras e pode ser difícil de reverter. É importante que as famílias evitem obter um empréstimo ou cartões de crédito em excesso e que estejam atentas aos sinais de dificuldades financeiras. Também manter um fundo de emergência é muito importante. Manter uma poupança financeira pode ajudar as famílias a lidar com os imprevistos e a evitar o endividamento excessivo. É recomendável que a reserva financeira seja equivalente a pelo menos três a seis meses de despesas regulares.
Seguindo essas medidas, as famílias podem-se proteger melhor contra os riscos do endividamento excessivo e manter uma situação financeira saudável.
Acha que vai haver limitação de crédito ao consumo?
A limitação de crédito ao consumo pode ocorrer em cenários económicos em que os bancos consideram que os riscos de inadimplência, isto é, do não cumprimento, estão aumentando ou que a economia está passando por uma fase de incerteza. No entanto, é importante lembrar que a disponibilidade de crédito ao consumo também pode ser afectada por factores macro-económicos, como a taxa de juro, a inflação e o desempenho do mercado financeiro.
Em resposta à crise pandêmica, muitos governos adoptaram medidas de estímulo à economia, como a redução das taxas de juros e programas de empréstimos a juros baixos. Essas medidas podem ter contribuído para o aumento da disponibilidade de crédito ao consumo em alguns países.No entanto, é possível que, em um futuro próximo, com a retoma das actividades económicas e o aumento dos preços de bens e serviços, os bancos se tornem mais cautelosos na concessão de crédito ao consumo, a fim de reduzir o risco de incumprimento e prejuízos financeiros. Portanto, a limitação de crédito ao consumo pode ocorrer em diferentes situações, dependendo do cenário económico e das políticas adoptadas pelos governos e pelos bancos centrais. Em alguns casos, a disponibilidade de crédito ao consumo pode ser limitada devido ao aumento dos riscos de incumprimento, como já referi, ou à necessidade de controlar a inflação e manter a estabilidade financeira.
As medidas tomadas pelo Banco Central Europeu (BCE) de aumento de juros preocupam?
As medidas adotadas pelo BCE em relação às taxas de juros são importantes indicadores da política monetária na Zona €uro. O objetivo principal do BCE é controlar a inflação e manter a estabilidade financeira na região e para isso, eles usam diversas ferramentas, como ajustes nas taxas de juros e injeções de liquidez na economia. O aumento das taxas de juros pode ter algumas consequências negativas, como o encarecimento do crédito, o aumento dos custos de financiamento para as empresas e consumidores em geral, a redução do consumo e do investimento, entre outros. Por outro lado, o aumento das taxas de juros pode ajudar a controlar a inflação e a prevenir bolhas especulativas no mercado financeiro. No entanto, é importante lembrar que as medidas adotadas pelo BCE são baseadas em análises económicas e visam garantir a estabilidade financeira e a recuperação económica da Zona €uro. O BCE tem como objetivo alcançar uma inflação abaixo, mas próximo, de 2% a médio prazo e, por isso, pode precisar de ajustar as taxas de juros de acordo com a evolução dos indicadores económicos. Portanto, embora o aumento das taxas de juros possa gerar preocupações, é importante entender que essas medidas são tomadas com o objetivo de garantir a estabilidade financeira e económica da zona euro, e que o BCE continuará monitorizando de perto os indicadores económicos e tomando medidas apropriadas de acordo com a evolução da situação.
Numa economia pequena como a nossa, quais os principais factores a ter em conta para uma banca e economia saudáveis?
Em uma economia pequena como a dos Açores existem diversos factores que são importantes para garantir a saúde da economia e do sistema bancário. Algumas das principais considerações incluem:
Estabilidade macroeconómica: É fundamental para a economia que a Região mantenha uma política fiscal estável, adaptando a redução fiscal em relação ao Continente, o melhor possível, com uma baixa inflação e juros controlados e um ambiente de negócios favorável.
Regulação efetiva: É importante que haja uma regulação financeira eficiente, que proteja os consumidores e promova a estabilidade do sistema financeiro. As autoridades reguladoras devem ter a capacidade de monitorizar e responder rapidamente a mudanças no mercado financeiro e evitar práticas abusivas ou fraudulentas. Este tema é um imperativo nacional e consequentemente regional.
Investimento em tecnologia e inovação: A adopção de novas tecnologias e inovações é importante para garantir a competitividade do tecido empresarial dos Açores e para tornar a economia mais dinâmica e diversificada.
Educação financeira: Uma população bem informada e educada financeiramente é essencial para evitar o endividamento excessivo e garantir que as pessoas façam escolhas financeiras responsáveis. Esta minha entrevista visa precisamente este objectivo, ou seja, respostas simples e concisas de forma a que as pessoas com menos literacia financeira possam perceber quais as melhores praticas a utilizar.
Acesso a financiamento: O acesso a financiamento é importante para empresas e indivíduos que precisam de crédito para investir e crescer. E agora mais do que nunca, com a disponibilidade dos Fundos do PRR, disponíveis para a Região. É importante que os bancos ofereçam produtos financeiros adequados às necessidades dos seus clientes e que haja uma concorrência saudável entre as instituições financeiras, que irão complementar as necessidades de financiamento agora respondidas com os Fundos do PRR, extremamente importante para os diversos sectores das actividades económicas desenvolvidas nos Açores.
Estabilidade política: A estabilidade política é importante para manter a confiança dos investidores e garantir um ambiente de negócios seguro e estável. Esses são alguns dos principais factores a serem considerados para garantir um sistema económico saudável numa economia pequena como a dos Açores e fortemente influenciada economicamente e socialmente pelo sector público, quer estatal e regional, bem como pela forte dependência dos fundos estruturais.
N.C.