O mariense Cláudio Reis tem 38 anos, é bombeiro voluntário em Santa Maria e presta serviços à ANA no aeroporto da ilha.
Como trabalha por turnos e tinha folgas semanais, Cláudio estava à procura de um part-time que lhe preenchesse o tempo livre. Ao explorar as lacunas existentes no mercado em Santa Maria, verificou que não havia nenhum produtor de cogumelos na ilha e decidiu apostar nesse ramo. E assim surgiu a Santa Maria Mushrooms, uma produção de cogumelos biológicos. Além de ser o primeiro e o único produtor de cogumelos em Santa Maria, há quatro anos, quando iniciou o negócio, Cláudio era o segundo produtor a nível regional, visto que apenas existia outro, no Faial. Actualmente, além de Cláudio, existem produtores de cogumelos nas ilhas do Faial, Terceira e São Miguel.
No início, o mariense deparou-se com alguns impedimentos, nomeadamente a dificuldade em arranjar matéria-prima e outros materiais necessários à produção, que tinha de mandar vir do continente.
“No início ainda consegui arranjar bons preços, mas neste momento o transporte sai mais caro do que a própria matéria-prima. Há dois anos, mandei vir uma palete de material em que a mercadoria custou 100 euros e o transporte atingiu quase os 200 euros, o que encarece um pouco a produção”, explica Cláudio.
E prossegue: “Felizmente, o ano passado, estava à procura de novos fornecedores e consegui um em Santa Maria que tinha o material que eu precisava. Agora, compro na ilha, à excepção das sementes que têm de vir de fora, porque não tenho capacidade nem maquinaria para produzir o micélio, que são as sementes do cogumelo.”
A Santa Maria Mushrooms produz várias espécies de cogumelos, designadamente Pleurotus ostreatus (cinzentos), Ulmarius (brancos), Pleurotus djamor (rosa/salmão), Pleurotus citrinos (amarelos), Pleurotus pulmonarius (castanhos).
Explica que as variedades Pleurotus ostreatus e Ulmarius são produzidas ao longo de todo o ano, enquanto que as restantes são espécies sazonais que se desenvolvem especialmente no Verão. Actualmente, Cláudio Reis é o único produtor nos Açores da espécie shiitake em troncos de eucalipto.
Cláudio tem uma estufa de aproximadamente 20 metros quadrados, onde produz os pleurotus, inserida noutra de 300 metros quadrados onde estão os “mil e tal troncos de madeira de um metro” que se destinam à produção de cogumelos shiitake. Aí, de forma artificial, o produtor tenta recriar o ambiente em que as espécies crescem naturalmente.
Para a espécie pleurotus, o mariense faz o seu próprio substrato biológico à moda antiga, isto é, de forma manual, sem a presença de químicos ou conservantes. Para tal, utiliza serragem de madeira misturada com ração de animal, adicionando nutrientes e as quantidades certas de água. Cláudio revela que o processo é melindroso, “não pode ser a olho, aliás tem de ser tudo à miligrama, porque com mais água os cogumelos não se dão e com menos água não se produzem” e tem que ser feito com a maior higiene possível, “em baldes esterilizados, porque o cogumelo é um fungo e se não tiver os devidos cuidados pode criar bolor.”
O tempo de produção dos cogumelos pleurotus, desde o dia em que é feita a substância até à sua colheita, prontos para entrega ao cliente, é de cerca de um mês.
Por sua vez, os shiitake são uma espécie mais melindrosa e requerem outros cuidados que os pleurotus não necessitam. O produtor elucida que “o shiitake demora mais um pouco porque, como é em madeira, tem de inocular os fungos.” O tempo de inoculação dos cogumelos desta espécie é de 12 meses e o tempo de produção é de aproximadamente três anos, até ao final de vida do tronco: “Quando os troncos começam a dar, dão durante 45 dias, param outros 45 dias e voltam a dar e assim sucessivamente durante o tempo útil do tronco. Quando o tronco perde a sua rigidez, fica podre, a madeira seca e já não presta.”
Afirma nunca ter recebido “um cêntimo de apoios” e que o que tem conseguido é fruto do seu trabalho. Cláudio Reis faz o melhor que consegue, tendo em conta as condições que tem ao seu dispor: “A minha é uma estufa hortícola normal, pelo que eu é que tenho de arranjar as condições ideais de arrefecimento. Os cogumelos nascem a aproximadamente 28 graus. Não pode ser muito calor nem pode ter muita luz solar. Se estiver muito calor tenho que pôr mais água para arrefecer a estufa, mas é preciso cuidado com a quantidade de água. Assim, vou jogando com abrir portas e janelas. Se fosse um contentor climatizado seleccionava a temperatura e estava resolvido, mas isto implica um grande investimento”, afirma.
E continua: “Faço das tripas coração para tentar manter a humidade, a quantidade de água e a temperatura correctas para que tudo corra bem, porque isto é um produto muito frágil que se não tiver as condições ideais para crescer não produz cogumelos como deve ser.”
Recentemente, o produtor de cogumelos esteve na incubadora de empresas de Santa Maria, de modo a “ter acesso a outras burocracias que são necessárias para colocar o produto no mercado”, porque “é preciso muita burocracia para ter o produto legalmente pronto a vender.”
Actualmente, Cláudio produz para as necessidades do mercado da ilha de Santa Maria, essencialmente para a restauração, alguns particulares e supermercados. Fornece, ainda, para alguns restaurantes em Ponta Delgada.
Conta com uma carteira de clientes fidedigna, cujo feedback é muito positivo, caso contrário “se não estivessem satisfeitos não voltavam a comprar.” Conforme a estação do ano, por vezes, Claúdio não consegue corresponder à procura, pois esta “é uma produção que não é constante.”
“Consigo prever, mais ou menos, que daqui a duas semanas vou ter 40 a 50 quilos de cogumelos, mas se me pedirem cogumelos para o dia seguinte, não consigo prever ou garantir nada”, explana.
Quanto ao lucro obtido, avança que apesar de dar lucro, “não dá para tirar um ordenado fixo por mês, mas vai dando para as despesas.”
Ao contrário das variedades que vulgarmente se encontram à venda nos supermercados, como “os cogumelos de Paris ou os Portobello que aguentam semanas” o produto de Cláudio, assim como “todas as variedades de Pleurotus nos Açores e no continente não aguentam mais do que dois a três dias à venda num supermercado”, ao passo que “em casa, onde as temperaturas dos frigoríficos são diferentes, se forem bem-acondicionadas, duram aproximadamente uma semana.”
Cláudio Reis refere que “o cogumelo até pode estar bom para consumir, mas a nível de apresentação fica com aspecto queimado e seco, e eu prefiro não vender assim, para não perder a qualidade do meu produto nem ganhar fama de que os cogumelos de Santa Maria Mushrooms estão no supermercado com péssimo aspecto.”
O produtor defende que os cogumelos estão na moda e que se verificou um aumento no seu consumo por parte da população, por haver cada vez mais pessoas vegetarianas ou vegan que estão a substituir a carne pelos cogumelos e a optar pelo consumo de produtos frescos.
“Tenho clientes cujos médicos recomendam o consumo de cogumelos, por terem feito alergia à carne e porque os cogumelos têm tantas ou até mais proteínas do que a carne. Hoje em dia cada vez mais as pessoas estão viradas para a cozinha alternativa”, completa.
Relativamente ao futuro, acredita que o negócio tem um bom potencial de crescimento, na medida em que “as pessoas estão cada vez mais abertas a este produto” e que o número de consumidores de cogumelos tem vindo a aumentar. Contudo, reconhece as limitações da produção ser feita numa ilha pequena como é o caso de Santa Maria: “Sei que posso vir a crescer mais um pouco, mas nada comparado a se este negócio fosse em São Miguel, por exemplo.”
O mariense partilha ter outros projectos em andamento que passam por rentabilizar e aproveitar o espaço ao máximo e que visam alcançar os mercados nacional e internacional. Aliás, os seus cogumelos marcaram presença na BTL – Bolsa de Turismo de Lisboa, a maior feira de turismo em Portugal. Questionado se deixaria o seu trabalho para se dedicar exclusivamente à produção de cogumelos, Cláudio Reis responde: “era bom, mas um emprego fixo é o meu suporte para investir mais nos cogumelos, além de que isso ocupa-me muito tempo e eu também tenho que tirar algum tempo para a família, inclusive para a minha filha de 6 anos.”
Carlota Pimentel