Correio dos Açores - Que referências tem de seu pai quando era criança?
Lizuarte Machado (Comandante da Marinha Mercante) - O meu pai era um ser humano e um pai extraordinário. Tenho as melhores referências; um cidadão integro, trabalhador exemplar, muito amigo da família e muito ligado à comunidade.
Como era a educação que recebeu de seu pai enquanto jovem até à sua formação universitária? O que fazia seu pai que o foi marcando ao longo deste período de vida?
A minha educação decorreu num ambiente familiar pobre, mas com muito amor. Sem violência e com muito diálogo. Sim, diálogo. Eu e minha irmã sempre tivemos direito e, até incentivo, para manifestarmos a nossa opinião. As ausências do meu pai no mar marcaram muito esta fase da minha vida tal, como suponho, as minhas terão marcado o meu filho. Foram tão marcantes que contribuíram decisivamente para a definição do meu futuro.
Sentiu o peso de uma educação rigorosa em casa?
Não. Num agregado familiar de quatro pessoas, grande parte do ano três, o diálogo sempre substituiu o rigor e, cimentou o respeito, a amizade e o amor, de todos por todos.
Quando começou sozinho a decidir mais o que fazer? Seguiu os passos de seu pai?
Com as ausências do meu pai no mar, eu e a minha irmã cedo, muito cedo, fomos chamados pela nossa querida mãe a participar em todas as decisões familiares, situação que moldou, de forma decisiva, as nossas personalidades. A influência do meu pai foi decisiva. O seu exemplo como cidadão e como profissional e, a forma como era respeitado pela sociedade e pelos seus pares, influenciou decisivamente o destino a dar ao meu futuro.
Até que chegou o dia em que foi pai. Como é ser pai?
Ser pai é a coisa mais maravilhosa do mundo. Ter um filho como o meu é uma bênção que, provavelmente, não mereço. O seu amor à família, o seu profissionalismo e sentido de responsabilidade talvez, repito, talvez, sejam o resultado de tudo o que em família foi possível fazermos. Ter sido criado com a presença permanente dos avós, estou em crer, terá tido grande relevância na formação da sua extraordinária personalidade.
Que valores incute aos seus filhos?
Se não os mesmos, pelos menos a continuidade dos mesmos que me foram transmitidos: o sentido de responsabilidade, nunca abdicar dos direitos e nunca esquecer os deveres, o profissionalismo, o respeito por todos, particularmente pelos que, por razões profissionais, possam ser nossos subordinados e que tantas, mas tantas vezes não têm voz e que, nessa circunstância, são os que mais de nós precisam.
Mantêm na relação com os seus filhos alguns dos métodos que seu pai adoptou na sua educação e forma de viver a vida? Quer explicar?
Sim, nas questões fundamentais, todos. Naturalmente, com os ajustamentos necessários a tempos muito diferentes dos meus. A resposta à pergunta anterior julgo ser bem o exemplo de que os valores fundamentais não mudam, quando muito adaptam-se a novas realidades.
Há cada vez mais a noção de um maior número de pais ausentes por razões diversas? Em seu entender, como conciliar um trabalho intenso com a função de ser pai?
É, por vezes, muito difícil. Sei-o bem. Todavia o amor, a tolerância, o respeito e um diálogo continuo, resolvem muita coisa.
Funciona compensar as ausências com ofertas? Quer explicar?
Do meu pai para mim nunca funcionou assim, aliás, a situação financeira da família também não o permitia. De mim para o meu filho, já não por razões financeiras, mas por questões de método e de princípio, também nunca funcionou assim. Diria, digo, graças a Deus. Pese embora tenha consciência de que não basta ser um bom pai, se é que fui e sou, - o meu foi -, para ter um bom filho. É preciso também uma pontinha de sorte. Todos conhecemos alguns exemplos.
Há quem diga que os filhos hoje são demasiado livres e que deviam sentir mais o poder paternal na sua formação e forma de viver a vida. Como comenta?
A sociedade mudou muito nas últimas décadas, todavia, os valores fundamentais não mudaram assim tanto. No contacto que tenho com os jovens de hoje, julgo perceber que não são muito diferentes do que eu fui. Julgo também perceber, pese embora possa estar errado, que em muitos casos possa haver uma profunda ausência e desresponsabilização do “poder” paternal.
Um bom pai é…
Não sei.
João Paz