Nem tudo o que aprendemos e ensinamos da História corresponde à realidade dos factos. Com efeito, existem alguns factos da História de Portugal que merecem destaque e a reposição da verdade. Existem, por exemplo, provas de que o Canadá foi descoberto por portugueses e não por Jean Cabot. Os educadores e historiadores do Canadá deviam ensinar a verdade à juventude canadiana e a todos os cidadãos canadenses, em vez de estarem a ensinar erradamente, favorecendo os colonos ingleses e franceses que chegaram muito tarde!
Vários autores referem que a primeira vez que o Canadá foi descoberto foi numa viagem de João Vaz Corte Real, iniciada em 1471, a partir da ilha Terceira, nos Açores. Em 1473, o mesmo navegador terá feito outra viagem à Terra Nova, desta vez em parceria com Álvaro Martins Homem, e pouco depois um terceira viagem com Pêro de Barcelos. Sozinho ou acompanhado, o certo é que Corte Real descobriu a Terra Nova, no início da década de 1470, seguramente antes de 1474, conforme provam os mapas. (1)
Historiadores como Las Casas (companheiro de Colombo) e Fernando Colon (filho do navegador) escreveram no início do século XVI que o almirante das Índias sabia que a família Corte Real tinha descoberto a Terra dos Bacalhaus ou Terra Nova, antes de 1484.
Gaspar Frutuoso, ainda no século XVI, escreveu em “Saudades da Terra” que João Vaz Corte Real andava em viagens de exploração no mar a noroeste em 1473 e aportou à ilha Terceira, vindo da Terra dos Bacalhaus, em 1474. Pouco tempo depois este navegador acabaria por receber a capitania de Angra, na ilha Terceira, e mais tarde a capitania da ilha de S. Jorge.
Curiosamente, a Câmara Municipal de Lisboa retirou a estátua de João Vaz Corte Real da Avenida da Liberdade, escondendo-a, enquanto uma estátua deste navegador é exibida no interior da igreja, integrada no Museu de Angra do Heroísmo, com a indicação de que se trata do descobridor da Terra Nova, no Canadá.
A própria palavra Canadá deriva da palavra portuguesa “canada”. João Vaz Corte Real era natural de Tavira, Algarve, onde tinha propriedades chamadas Canada. Perto de Tavira existe uma placa na estrada indicando o primeiro local no Mundo chamado Canada. Na ilha da Terceira, Açores, existem muitas canadas nomeadas pelos Cortes Reais. Estes navegadores fizeram a mesma coisa no Canadá.
Quem foi afinal Jean Cabot? João Fernandes, o Labrador, logo depois de D. João II ter falecido (em 1495), divulgou a descoberta da existência de terras a Ocidente ao rei de Inglaterra. Este contratou Jean Cabot, a 5 de maio de 1496, para realizar uma expedição às terras que os portugueses haviam visto a Ocidente.
A expedição partiu de Inglaterra no ano seguinte, a 2 de maio, tendo avistado a Terra Nova, levando a bordo vários portugueses, entre os quais João Fernandes.
Na segunda expedição de Cabot, veio a Lisboa em março de 1498, para recrutar marinheiros e pilotos, um procedimento que terá feito também na expedição anterior.
A segunda expedição chegou apenas à Gronelândia.D. Manuel I, numa carta régia datada de 28 de setembro de 1499, concede a João Fernandes Labrador, “morador da ilha Terceira”, a capitania de qualquer ilha que viesse a descobrir na zona do Labrador, desde que não estivesse naturalmente dentro dos domínios espanhóis definidos no Tratado de Tordesilhas. O que se revelou uma impossibilidade.
Como já alguém escreveu: “É realmente uma pena que os lusos canadianos não bradem aos céus e façam valer os seus direitos em reclamar na imprensa, rádio e TV do Canadá, afirmando que a primazia das descobertas daquela Nação foram feitas por portugueses idos dos Açores!
No ano letivo 2022-2023, foi lançado um repto às escolas no sentido de realizarem atividades que pudessem evocar a obra deste grandioso açoriano e ribeira-grandense. Penso que temos perdido uma boa oportunidade para aproveitar este grande escritor e historiador para revelar muitos factos que merecem maior divulgação, sobretudo a nível dos alunos do Ensino Secundário.
Na última década de vida, Gaspar Frutuoso (1522-1591) dedicou-se à composição do manuscrito, a que deu o título de Saudades da Terra, e no qual tratou de forma muito minuciosa e muito documentada, a história dos arquipélagos atlânticos (Madeira, ilhas das Canárias e Cabo Verde), mas, em especial, a história dos Açores.
Com efeito, a obra Saudades da Terra é considerada um dos mais notáveis empreendimentos do século XVI, a nível de crónica. Contudo, a obra de Gaspar Frutuoso tem sido negligenciada pela moderna historiografia portuguesa. É evidente que uma obra tão densa e tão abrangente teria de se basear numa ampla pesquisa arquivística e bibliográfica. A título de exemplo, no livro IV, de Saudades da Terra, toda a ilha de S. Miguel é descrita ao pormenor: nomes de famílias, ascendentes e descendentes, não escapando, inclusive o Lombo Gordo e as terras do “Cu de Judas” para os lados da Povoação (Povoação Velha como então se designava).
Como afirmou José Gomes Ferreira: “Fomos o que quisemos ser”. Colombo não foi o primeiro europeu a chegar à América do Norte. Esse feito é português e está à vista em mapas de 1490. Mas este tema daria para um outro artigo.
Nordeste, 27 de março de 2023
Eduardo Jorge Lima Melo
eduardo.melo@sapo.pt
(1) Ferreira, José Gomes, Factos Escondidos da História de Portugal, Alfragide, Artes Gráficas Ldª, 2021, pp 133 a 140.