Após a audição de várias testemunhas, o Tribunal de Ponta Delgada deu ontem a conhecer a sentença deste processo que teve início em Fevereiro passado. O arguido de 69 anos, um antigo sub-chefe da Polícia de Segurança Pública (PSP), aposentado desde 2008, era acusado de crimes de ofensa à integridade física simples e agravada, ameaça (simples e agravada), de perseguição e de dano. O Colectivo de Juízes considerou ter ficado provada a quase totalidade dos factos apresentados pela acusação do Ministério Público e, na leitura do Acórdão, o Tribunal começou por destacar o seu lamento por “toda a situação”, aludindo ao facto de o arguido ter sido alguém ligado à Justiça durante um longo período de tempo. O homem de 69 anos acabou condenado a uma pena suspensa de 3 anos, sujeita a regime de prova, bem como ao pagamento de uma multa no valor total de 4.000 euros. Em termos de indemnização civil, o arguido terá ainda de pagar 10.500 euros ao ex-genro e 5.030 euros ao neto mais novo.
Recorde-se que este caso teve como ponto de partida a separação da filha do arguido e de um dos ofendidos neste processo (ex-genro). Os dois filhos do casal ficaram à guarda do progenitor, algo que não agradou ao homem de 69 anos de idade.
Agressões na Escola
A primeira situação pela qual o arguido acabou condenado remonta ao dia 25 de Maio de 2021 e ocorreu no Colégio do Castanheiro, em Ponta Delgada, estabelecimento de ensino frequentado pelo seu neto mais novo. Por volta das 17 horas desse dia, o arguido entrou com a sua viatura no interior da escola e, num primeiro momento, bloqueou a viatura do ex-genro que se encontrava estacionada no local. Após essa acção, o arguido agrediu o ofendido a soco e pontapé no interior do carro. O ex-genro de 41 anos, conseguiu abandonar o veículo e dirigir-se para o edifício da escola com a intenção de se refugiar e evitar a continuação das agressões. O evento foi filmado pelas câmaras de videovigilância que mostram ainda o arguido a deixar cair um objecto (não apurado exactamente qual durante o julgamento) enquanto se dirigia para o edifício principal da escola.
Já dentro desse local, o arguido tentou forçar a entrada para continuar as agressões. Entretanto, o Director do estabelecimento de ensino alertado para a ocorrência dirigiu-se ao local para tentar apurar o que se passava e tentar por cobro à situação. O arguido foi impedido de entrar na escola, tendo posteriormente agarrado e empurrado o Director até que um funcionário conseguiu intervir.
Sobre este episódio, o Juiz Presidente do Colectivo repudiou a tentativa de o arguido “inventar desculpas” e de se vitimizar durante o julgamento, dando como exemplo o facto de este ter insinuado que as imagens visionadas poderiam ter sido manipuladas por terceiros. O magistrado referiu ainda não ter ficado provado durante todo o julgamento que o objecto deixado cair pelo arguido fosse um martelo, mas condenou veementemente todo o episódio onde um pai e um Director de uma escola foram agredidos na presença de alunos e professores. Por esta situação, o homem acabou condenado pelo crime de ofensa à integridade física simples (ao ex-genro) e de ofensa à integridade física qualificada (ao Director). Para além disso, o Tribunal decidiu condenar o arguido a uma pena de 2 anos e 2 meses, suspensa por 3 anos, por um crime de ameaça agravada depois de este ter prometido ‘acertar contas’ com o Director numa outra ocasião e local.
Após o sucedido, o ex-genro interpôs uma providência cautelar que não foi respeitada pelo arguido.
Acusado de dois crimes
de perseguição
O Tribunal considerou mesmo não terem restado quaisquer dúvidas de que o homem de 69 anos incorreu, por duas ocasiões, num crime de perseguição. O Juiz fez mesmo questão de destacar que o arguido sabia que não devia ir ao Colégio ou ao Complexo da Fundação Pauleta (frequentado pelo neto mais novo). Uma publicação na página pessoal de Facebook do arguido, onde colocou uma foto do ofendido e referiu ‘premiar’ quem o encontrasse, é outro dos exemplos deixados pelo magistrado para sustentar a reiterada conduta persecutória do arguido.
Após a exposição dos vários factos de que vinha acusado este antigo sub-chefe da PSP, o Tribunal decidiu, tendo em conta a idade do arguido, aplicar-lhe uma pena de multa “elevada” de 500 dias e num valor total de 4.000 euros (8 euros ao dia).
Para além das indemnizações a pagar ao ex-genro de 41 anos (10.510 euros) e ao neto mais novo (5.030 euros), o Tribunal informou também o arguido de que esta decisão seria comunicada ao Director Nacional da PSP para uma eventual cassação da sua arma.
Dirigindo-se ao arguido, o Juiz Presidente do Colectivo referiu que este “não sabe reagir perante o fracasso” e que a premissa; “sou polícia e posso fazer tudo” não é aceitável. Avisando-o de que “se acontecer alguma coisa” durante o período de suspensão da pena, a mesma poderá ser revogada, o magistrado afirmou a finalizar.
“Uma pessoa com a sua formação e idade tinha obrigação de agir de outra forma”, realçou.
Em declarações ao Correio dos Açores, o advogado do arguido revelou que o seu cliente irá interpor recurso desta decisão.
“Pese embora o arguido tenha sido absolvido de parte substancial dos crimes de que vinha acusado (dois dos sete crimes) e pese embora tenha sido condenado em pena de multa em quatro deles, a Defesa vai analisar o Acórdão e interpor recurso”, garantiu.
Luís Lobão