“Nuvens” dos Açores ganham forma em livro de Diamantino Henriques, Fernanda Carvalho e Patrícia Navarro, com fotos de Alberto Plácido

Correio dos Açores - O livro “Nuvens” reúne textos da sua autoria, de Fernanda Carvalho e de Patrícia Navarro. Por que motivo decidiram escrever este livro?
Diamantino Henriques (Meteorologista no Instituto Português do Mar e da Atmosfera) - Foi um desafio da editora da Araucária, Blanca Martin-Calero. As nuvens são algo omnipresente na paisagem dos Açores. Há algum tempo que queríamos escrever algo sobre as nuvens dos Açores, porque havia muito pouca coisa escrita sobre o assunto. Havia, também, as magníficas fotografias de Alberto Plácido, pelo que propusemos uma abordagem técnico-científica do tema, com a descrição possível, do ponto de vista meteorológico, das nuvens que fazem parte do livro. Foi um exercício interessante, pois na prática profissional as nuvens são identificadas em tempo real e ao vivo, e não a partir de fotografias.

Como se lê o tempo através das nuvens?
As nuvens são o resultado de um conjunto de mecanismos físicos que ocorrem na atmosfera e que podem explicar o seu estado. Por exemplo, a forma que possuem, o seu aspecto, a altura da base, a sua espessura, entre outros, são aspectos que estão relacionados com a estabilidade estática da atmosfera, humidade, velocidade vertical e perfil vertical do vento, etc. Por outro lado, a sua evolução pode dar-nos dicas sobre a aproximação de sistemas frontais e de outras situações meteorológicas.

Quais são as nuvens mais perigosas?
Certamente os Cumulonimbus, que são nuvens baixas, mas que se desenvolvem na vertical, podendo atingir entre 10 (latitudes altas) a 18 km (trópicos) de altitude. Geralmente, causam precipitação forte, granizo e trovoada. Só há trovoada na presença de um cumulonimbus. A maioria dos fenómenos de precipitação extrema têm origem em nuvens do género Cumulonimbus.

Qual a relação entre relâmpagos e nuvens?
Os relâmpagos são descargas eléctricas resultantes da acumulação de cargas eléctricas de sinais contrários dentro e/ou fora de uma nuvem. Dentro de uma nuvem há movimentos verticais ascendentes que levam ao arrefecimento e a condensação do vapor de água em pequenas gotículas de água. Quando esses movimentos são mais intensos, essas gotículas sobem mais alto e acabam por congelar. As partículas de gelo podem crescer ainda mais, acabando por ceder à gravidade e começar a descer dentro da nuvem. Durante a descida, essas gotas colidem com outras que, entretanto, sobem, ficando carregadas com electricidade estática. Esse mecanismo é multiplicado por milhões de milhões de partículas de gelo, e quando localmente a concentração de carga eléctrica é suficiente elevada para vencer o dieléctrico com outro ponto, dá-se a descarga eléctrica, mais conhecida como relâmpago.

Se tivesse de escolher as melhores nuvens, quais seriam?
Gosto particularmente das Cirrus, que são nuvens constituídas por cristais de gelo e apresentam-se em muitas formas e configurações. São especialmente luminosas durante os ocasos e as auroras, e podem reflectir colorações muito interessantes.

Por que razão há nuvens de vários tamanhos e feitios?
Basicamente, tem a ver com a estabilidade da atmosfera, com a intensidade dos movimentos verticais e ainda com o perfil vertical do vento. O vento age como um escultor, produzindo e moldando as nuvens, mas de uma forma contínua e ininterrupta.

Resumindo, há nuvens e nuvens. Consegue levar uma nuvem no bolso?
O conceito de nuvem não é exclusivo da meteorologia. Desde nuvens de galáxias  até à nuvem de electrões de um átomo, passando pelas nuvens do mundo digital, há uma infinidade de escalas onde as podemos imaginar. No entanto, as nuvens são como que objectos intangíveis, bem definidos a distância, mas demasiado difusos na proximidade. Não consigo levar uma nuvem no bolso, mas possivelmente somos parte de alguma nuvem à escala planetária.

Há algo mais que queira acrescentar?
Gostava apenas de citar um versículo do Livro do Génesis que reflecte um pouco a nossa relação com as nuvens desde os primórdios da humanidade: “Hei de colocar o meu arco-íris nas nuvens e esse será o sinal de aliança entre mim e a terra.” (Génesis, 9.13)

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Na contra-capa do livro pode ler-se: “Da previsão meteorológica à fruição estética, as nuvens fazem parte da vida e do imaginário de muitos de nós: um fenómeno sugestivo tanto pela mudança constante das suas formas como pela complexidade de linhas que nos mostra. Neste livro juntam-se dois olhares. Um estritamente científico, com textos de Diamantino Henriques, Fernanda Carvalho e Patricia Vicens Navaro, que nos permite perceber o que são as nuvens, como se formam, quais as suas variedades, espécies e géneros; e outro artístico, de contemplação estética, através das poderosas fotografias a preto e branco de Alberto Plácido. A introdução de Eduardo Brito é a abertura poética que todas as nuvens merecem e, graças a José Albergaria, que materializou em papel e tinta as múltiplas camadas que compõem este livro, quase podemos mergulhar nelas. Uma publicação recomendada para nefelibatas, e não só.”
                             

Carlota Pimentel

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Autor: CA

Categorias: Regional

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