Bel avança para projecto de agricultura regenerativa com cinco explorações pecuárias na procura de nutrientes no solo onde ainda não se chegou

 A Bel Formagerie lançou há cerca de seis meses, em São Miguel, um projecto de agricultura regenerativa em que estão envolvidas, actualmente, cinco explorações agrícolas em várias zonas da ilha e que a empresa pretende que chegue a todos os seus produtores até 2030, “num movimento para o bem do Planeta”.
O projecto foi apresentado ontem por Rui Calouro, manager da Bell, um dos elementos da equipa do programa ‘Vacas Felizes’, que faz de elo de ligação com os agricultores e que está também a trabalhar no projecto de agricultura regenerativa.
A equipa de trabalho, alicerçada uma série de consultores considerados “dos melhores do mundo que ajudam a tomar as decisões correctas”, está a aplicar um método de conservação ou reestruturação de ecossistemas onde são desenvolvidas diversas práticas agrícolas sustentáveis, aliadas também a uma gestão holística que contribui para a vitalidade do solo agrícola. O objectivo principal “é, de facto, aumentar a saúde do solo”, afirma Rui Calouro. 
No projecto de agricultura regenerativa, o solo “é o cerne que nós queremos estudar, que queremos melhorar porque é através dele que conseguimos melhores pastagens e conseguimos aumentar a área cultivada”, afirma.
“Muitas vezes, falamos com os nossos produtores sobre estarmos limitados pela ilha. A ilha não cresce. Mas, de facto, quando começamos a ver o que já fizemos , há de facto uma imensidão de solo que nós podemos explorar ainda mais. E esta exploração tem a ver com os próprios sistemas radiculares das plantas ao conseguir-se, com algumas práticas da agricultura regenerativa, penetrar mais no solo e ir buscar nutrientes onde, hoje em dia, não se consegue chegar. Tudo isto é um conceito de sustentabilidade  que vai fazer com que o produtor seja mais resiliente às alterações climáticas e às alterações dos factores de produção”, explica Rui Calouro.
Os técnicos começaram com uma fase de caracterização de cada das propriedades. “Fizemos já uma analítica de solo, que não era normal fazermos, que nos dá indicadores que antes não tínhamos. Com esta analítica conseguimos perceber que temos uma enorme reserva de nutrientes onde hoje em dia não conseguimos chegar”. 
“É através destas técnicas que vamos começar a utilizar que vamos ao encontro deste banco de nutrientes que está lá e que, presentemente, está inacessível”, acentua.
Nestas cinco explorações piloto já fizeram esta analítica de solo. “E estamos a melhorar as condições de solo, especificamente com a introdução de cálcio. Verificamos que precisávamos de mais cálcio do que estávamos a aplicar nos solos porque, de facto, - com a produção de leite -, exportámos muito cálcio e este cálcio não é reposto devidamente no ecossistema e tem de o ser. Com estas práticas, vamos começar a melhorar a saúde destes solos e, depois, vamos começar com a gestão holística, ou seja, vamos começar com um pastoreio planeado dos animais. Vamos introduzir pastagens biodiversas e, com estas pastagens, vamos ter outros tipos de sistemas radiculares que, hoje em dia, não temos.  São as chamadas raízes picotantes que conseguem penetrar no solo, criando-se canais com uma maior acessibilidade aos nutrientes, onde há mais arejamento do solo e mais infiltração da água”. 
Há uma técnica que vamos usar que é o cover crops, ou seja, não queremos que o solo fique descoberto nunca para que, de facto, os nutrientes não vão parar o mar e fiquem bem aproveitados com as práticas certas e com o gradiente pastoreio correcto”. 
“Estamos a trazer um conhecimento extra para o produtor para que consiga desenvolver melhor as suas técnicas e as suas práticas”. 

Um trabalho moroso
Rui Calouro fez questão em salientar que estão a iniciar o projecto nas cinco explorações piloto. Isto para explicar que “ainda não há uma grande prática que seja visível, até porque estamos a corrigir o solo nesta fase e temos de fazer as coisas por fases. Não podemos passar para uma cultura biodiversa, para um pastoreio alinhado quando existem ainda outras situações que temos de resolver primeiro”.
Todos estes processos de melhoria do solo “levam muito tempo. Estamos a falar de um processo que leva quatro anos a atingir o objectivo. Tudo isto para perceberem que este é um processo lento porque aumentar a vida do solo não é como estalar um dedo. Temos que criar condições para que isto aconteça”.
Neste tipo de agricultura, como refere, “não é só regenerar. Muitas das vezes pode ser só conservar. Ou seja, aquilo que já está bem, vamos manter e vamos implementar outras práticas. Há outros casos em que temos mesmo que regenerar. Aí temos que ter outras acções. Por isso é que as analíticas são demasiadamente importantes”.
Ivan Mendes intromete-se e afirma que “lavrar a terra pode ser feita de uma forma optimizada e diferente. Quando nós lavramos de três em três meses, aquilo é tudo desperdiçado e tudo destruído. Pode imaginar aquela vida que está ali, tudo aquilo que alimenta a terra, que faz crescer as plantas é um ecossistema vivo que nós estamos a desperdiçar. Não está mau. Mas existe é uma abordagem diferente”, refere.
E Rui Calouro concorda: “Temos de reservar estes ecossistemas”. E, depois, questiona: “como é que nós vemos se estamos correctos. Temos uma base de trabalho. Temos uma determinada área e, todos os anos vão lá medir como é que está a nossa cobertura de solos, se existe coberto vegetal ou não, como é que está a evoluir este coberto vegetal. Há uma série de indicadores que vamos analisar e vamos medir para ver a evolução do projecto em si”, concluiu.

Um dos produtores na
agricultura regenerativa
O produtor Luís Gonzaga tem uma exploração de 130 vacas de leite e aderiu ao projecto da agricultura regenerativa. Questionado sobre o que está a fazer de diferente, responde que, em primeiro lugar, entrou para o programa das ‘Vacas Felizes’ e para o modo de produção do leite biológico. “E, agora, com este novo projecto de agricultura regenerativa, estou a adoptar técnicas para melhorar aquelas que praticava para melhorar o solo. Estamos a procurar perceber melhor os solos. Em primeiro lugar, temos de perceber os solos”, reforçou.
“Estamos a deixar as técnicas que não são as mais correctas e eu acredito que vamos chegar a bom porto com esta agricultura regenerativa. Acredito neste sistema mais holístico de tratar os solos. Eu próprio acredito neste projecto”, reafirmou.
Explicou que o projecto “vem complementar o que já estava a fazer. Há três anos que já não utilizo nada de síntese nem químicos nos solos. Quando mudei para a agricultura biológica deixei de utilizar produtos de síntese. E, gora, a agricultura regenerativa veio complementar este modo de produção, não só deixando de usar produtos de síntese, mas também melhorando o desempenho e a performance do solo que é a parte mais importante em toda a cadeia do leite biológico”. 
“No meu caso”, prosseguiu Luís Gonzaga, “se eu tiver um bom planeamento de pastagem, se eu tiver uma boa variedade de plantas que compõem uma alimentação melhorar para os meus animais, eles, com certeza, vão produzir um leite de melhor qualidade ao mesmo tempo que proporciono o bem-estar dos animais”.
“Não se pode esquecer que o retorno de um bom solo, de um bom maneio do animal num sistema sustentável, isto vai proporcionar uma boa vida para mim e para os meus trabalhadores, disponibilizando um alimento de primeiríssima qualidade ao consumidor. Agora, o que seria bom é que o consumidor corresponda monetariamente ao valor do produto”, concluiu.
                                                    
 João Paz
 

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Autor: CA

Categorias: Regional

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