O Presidente da Câmara do Comércio e Indústria dos Açores, Mário Fortuna, afirmou ontem, na feira ‘Lar, Campo e Mar’ que “demasiadas vezes se aponta, de forma imprópria, o dedo às empresas e aos empresários como responsáveis de tudo e mais alguma coisa, inclusive pelos baixos salários que vigoram na Região, sem se dar evidência de compreender que a estrutura salarial que temos é fabricada, em muito, pelas regras determinadas pelos governos (o nacional e o regional), que nunca abdicam da sua maquia de impostos, que não é pequena, (pese embora o esforço regional de diferenciação máxima) e impõem às empresas um sem número de obrigações que faz com que os custos salariais sejam muito superiores ao que os trabalhadores efectivamente vêem”.
“Gostaríamos de fazer mais mas precisamos de mais crescimento económico”, defendeu Mário Fortuna.
Mesmo assim, prosseguiu, “num contexto inflacionário difícil, entre Janeiro e Março, a Câmara do Comércio e Indústria de Ponta Delgada “conseguiu fechar 14 contratos colectivos de trabalho em entendimento entre empresas e sindicatos, sem nenhuma greve e sem nenhuma intermediação”.
Mário Fortuna revelou, a propósito, que os aumentos salariais acordados para 2023 variaram de um mínimo de 5,2 % para escalões mais elevados para um máximo de cerca de 9% para escalões mais baixos. O valor médio situou-se perto dos 8%. “Portanto, muito acima da inflação”, afirmou.
“Os empresários deram o seu melhor neste processo – estão de parabéns – e devem ser reconhecidos pelo esforço que se propuseram fazer”, salientou.
No entender do Presidente da Câmara do Comércio e Indústria, o acordo de parceria “previa não só contributos das empresas, mas também benefícios que caberiam ao Governo implementar”.
“Fizemos a nossa parte. Aguardamos que o Estado faça agora a sua parte de despenalização do contexto em que as empresas funcionam”, disse.
“Ouvimos com satisfação o compromisso do Sr. Secretário Regional das Finanças de regulamentar as deduções à colecta por lucros reinvestidos conforme previsto no Orçamento da Região, há mais de 20 anos, mas nunca concretizado. É um passo no sentido certo, mas há outros que têm de ser dados para que as empresas possam fazer o que lhes compete de forma mais competitiva” completou.
Falando ainda de contextos difíceis, afirmou Mário Fortuna, “é preciso elogiar os empresários pela sua resiliência e capacidade quando têm de lidar com pandemias, inflação galopante, energia com preço agravado em 80% num só ano, taxas de juro em escalada e, como se isto não bastasse, com pagamentos em atraso estrutural por parte do sector público e infraestruturas que penalizam o normal funcionamento das empresas”.
Sobre os pagamentos em atraso “já falamos há mais de uma década, mas o problema ainda está entre nós ao ponto de Portugal ter sido objecto de uma queixa da Comissão ao Tribunal de Justiça da União Europeia”.
Em seu entender, “para chegarmos a este ponto o assunto é mesmo grave e viola não só a lei como as boas práticas económicas e sociais. A nossa sociedade está assente no cumprimento de regras estabelecidas pelos legisladores e pelos governos. Não podem ser os governos os primeiros a violá-las. A dívida já está feita na forma de dívida comercial. Transformar-se-á em dívida financeira como fazem as empresas quando precisam cumprir as suas obrigações com o Estado ou quando não tenham liquidez”.
“Os privados”, prosseguiu, “não têm a opção de não pagar quando se trata de obrigações para com o Estado ou mesmo para com as empresas públicas – se não pagarmos a conta da electricidade, por exemplo, o serviço é desligado”.
Mário Fortuna disse ainda que os atrasos na operacionalização do PO2030 e “o arrastar das medidas do PRR dirigidas às empresas não têm ajudado ao ponto de já haver indicadores de quebra de registos de licenciamento de projectos turísticos de alojamento e restauração da ordem do 20%, quando o turismo está, novamente numa senda claramente ascendente”.
“Há oportunidades que passam só uma vez e podemos estar a perder algumas com estes desfasamentos”, relevou.
Segundo Mário Fortuna, as empresas “têm também sido as heroínas do processo de ajustamento ao agravamento dos custos dos factores de produção, numa situação em que são o primeiro ponto de embate”.
“É muito difícil gerir
em contexto de preços instáveis”
“É muito mais difícil gerir num contexto de preços instáveis em todas as cadeias de abastecimento, situação que persiste. É preciso deixar o mercado funcionar e compreender que quando se exigem salários mais altos e se cobra energia com aumentos de 80%, sem contrapartidas directas como acontece a nível nacional e na Madeira, não se pode esperar estabilidade de preços”, disse.
Realçou que as empresas que “foram apoiadas durante a pandemia foram ‘empurradas’ para um nível de endividamento ainda mais elevado” e que esta circunstância “está a ser agora penalizadora por virtude da subida das taxas de juro, numa tendência que ainda não foi invertida e promete manter-se durante mais tempo. As empresas também sofrem, e muito, as consequências das subidas das taxas de juro”, realçou.
Concluiu que a “lista das dificuldades” não se fecha sem que se fale “das infra-estruturas que temos de utilizar e falarei apenas das infra-estruturas portuárias públicas, em virtude das circunstâncias recentes com que fomos confrontados com barcos graneleiros a terem de esperar mais de uma semana para poderem descarregar a matéria-prima indispensável à indústria que nos alimenta e que alimenta as nossas exportações”.
O “crime económico”
“Ainda bem que o nosso porto está a ser bem-sucedido na atracção de mais actividade. É uma situação virtuosa que não podemos desperdiçar. Será um crime económico contra São Miguel e os Açores se este potencial não for aproveitado”, sublinhou Mário Fortuna.
Em sua opinião, “nenhuma ilha deve ser impedida de concretizar o seu potencial sustentável. Nunca aceitaremos que tal aconteça e por isso continuaremos a exigir infra-estruturas que suportem o potencial endógeno comprovado e em particular o potencial de São Miguel”.
Como disse, “e preciso rever regulamentos obsoletos – e nisto ficamos muito satisfeitos com as recentes declarações da Srª Secretária das Infraestruturas – mas é preciso fazer o resto e o resto é dotar devidamente o porto com equipamentos de terra e de mar para suportar operações competitivas. Mas não basta. É preciso, também, projectar esta infra-estrutura centenária para encarar o futuro com a capacidade necessária para o crescimento das operações portuárias e para a segurança da própria infra-estrutura”.
Por todo este contexto, disse, “temos de reconhecer a capacidade ímpar das nossas empresas para se manterem sustentáveis e para assegurarem os postos de trabalho que têm permitido à Região bater recordes de população activa e de população empregada”.
“As empresas são um pilar indispensável da nossa economia e da nossa sociedade. Sem elas não lograremos o desenvolvimento que desejamos”, realçou Mário Fortuna.
O Presidente da Câmara do Comércio e Indústria referiu-se, depois, à feira que se distribui por uma área de cerca de 4 000 metros quadrados mais 15%, comportando cerca de 180 stands (190 em 2019) ocupados por 69 empresas (68 em 2019), 54 artesãos (52 em 2019) e 5 associações (3 em 2019). A procura de espaços foi superior à oferta, não tendo sido possível satisfazer todas as empresas e entidades que pretendiam participar na feira. Fica a informação para o planeamento do próximo ano.