A Assembleia Legislativa Regional dos Açores deu parecer desfavorável à proposta de lei do Governo de António Costa que altera as Bases da Política de Ordenamento e de Gestão do Espaço Marítimo Nacional. Votaram contra as alterações previstas na proposta de diploma o PS/A, PSD/A, BE - Açores e PPM/A.
No entender do Governo da República, o ordenamento e a gestão do espaço marítimo nacional “são essenciais para o reforço da cultura oceânica nacional e para o desenvolvimento da economia azul sustentável, sendo necessário um sistema de ordenamento e gestão que assegure a unidade do espaço marítimo nacional e a estabilidade das políticas públicas do mar cruciais para a implementação da Estratégia Nacional para o Mar 2021/2030”.
O Governo de António Costa constatou a necessidade de adaptar o regime jurídico do ordenamento, gestão e utilização “aos desafios que a governação do espaço marítimo coloca ao país”.
Considera que, no âmbito do sistema de ordenamento e gestão do espaço marítimo, “a existência de apenas um nível de ordenação coloca obstáculos a uma organização e regulação adaptativa do espaço marítimo e limita a margem de intervenção das Regiões Autónomas à atribuição de títulos de utilização privativa do espaço marítimo”.
Assim, lê-se na proposta de diploma do Governo da República, “constatando-se a possibilidade e vantagem de ampliar o domínio da gestão do espaço marítimo nacional, a presente lei cria um segundo nível de ordenação concretizado na nova figura dos planos de gestão, permitindo uma gestão flexível e adaptada e a intervenção das Regiões Autónomas na regulação do espaço marítimo”.
O Governo de António Costa considera que, “reservando o primeiro nível de ordenação ao Estado, mantém os poderes inerentes ao estatuto do domínio público na sua esfera de intervenção, garante a unidade e integridade do espaço marítimo nacional e a soberania do Estado”.
Acrescenta que, “com esta nova amplitude do domínio da gestão do espaço marítimo nacional, o sistema de ordenamento e gestão ajusta-se ao modelo preconizado para a classificação e gestão de Áreas Marinhas Protegidas (AMP), com a “orientação estratégica e recomendações para a implementação de uma Rede Nacional de Áreas Marinhas Protegidas, tornando-se possível que a regulação das aCtividades que ocorrem no mar e a ordenação subjacente às AMP se articulem e compatibilizem no quadro do ordenamento do espaço marítimo”.
Considera a proposta de diploma do Governo da República que as Áreas Marinhas Protegidas “são um instrumento para fazer face a diversas ameaças que os ecossistemas marinhos enfrentam, nomeadamente a perda de biodiversidade, a poluição e as alterações climáticas,.”
Refere que a alteração legislativa consagra as AMP como “instrumento de ordenamento do espaço marítimo nacional e garante a força jurídica necessária no contexto de organização do espaço marítimo para a conservação e protecção efectiva de valores naturais, estendendo-se este instrumento à proteCção e conservação dos valores culturais”.
As alterações à Lei do Mar propostas pelo Governo da República prevê ainda a criação de “títulos de utilização privativa do espaço marítimo nacional e na adaptação dos procedimentos ao paradigma de utilização do espaço marítimo da presente década”.
PS/Açores vota contra proposta
de Lei do Mar do Governo
de António Costa
O Grupo Parlamentar do PS/A na Assembleia Legislativa Regional emitiu parecer desfavorável às propostas de alteração à designada Lei do Mar, há nove anos em vigor, por se constatar “a necessidade de adaptar o regime jurídico do ordenamento, gestão e utilização aos desafios que a governação do espaço marítimo coloca ao país.” Contudo, referem os socialistas açorianos, “não podemos ignorar que a mesma, no que às regiões autónomas concerne, aparenta querer dar resposta ao Acórdão do Tribunal Constitucional n.º 484/2022, de 21 de Setembro, que declarou a inconstitucionalidade, com força obrigatória geral, de uma série de normas da Lei que estabelece as Bases da Política de Ordenamento e de Gestão do Espaço Marítimo Nacional”.
Segundo o PS/A, a Proposta de Lei em apreciação, do Governo de António Costa, “é extemporâneo, face ao processo de revisão constitucional ordinária, que decorre na Assembleia da República”.
É que a recente proposta de revisão constitucional dos Açores, recentemente aprovada, por ampla maioria na Assembleia Legislativa, e já entregue no parlamento nacional prevê, sobre o exercício da gestão partilhada do Mar pelas Regiões Autónomas, a seguinte alteração à redação do artigo 84.º da Constituição, relativo ao domínio público: “A lei define quais os bens que integram o domínio público do Estado, o domínio público das Regiões Autónomas e o domínio público das autarquias locais, bem como o seu regime, condições de utilização e limites”.
É estabelecido na proposta de revisão constitucional dos Açores que as Regiões Autónomas “têm o direito de exercer poderes de ordenamento e gestão sobre as águas interiores e o mar territorial, com os seus leitos e os fundos marinhos contíguos, que pertençam ao respectivo território”.
Estabelece também que “os poderes do Estado Português sobre as zonas marítimas, e fundos contíguos, sob soberania ou jurisdição nacional adjacentes aos territórios dos arquipélagos dos Açores e da Madeira, são exercidos no quadro de uma gestão partilhada, quanto às competências, recursos e proveitos, com as regiões autónomas, definida nos termos da lei, sem prejuízo dos princípios de defesa e segurança nacional”.
Na proposta de revisão constitucional dos Açores “entendE-se por gestão partilhada o mútuo acordo, entre o Estado e a respectiva região autónoma, quanto ao regime jurídico de ordenamento, gestão e exploração do espaço marítimo, nas zonas marítimas, e fundos contíguos, para além das 200 milhas.”
O Partido Socialista dos Açores renova a sua posição de 2022, ao considerar que, “ sem prejuízo da relevância das questões jurídicas que se podem colocar nesta matéria, esta é uma questão política que deve merecer, numa primeira análise, uma solução política, respeitando o escopo da alteração à Lei n.º 17/2014, de 10 de Abril, pela Lei n.º 1/2021, de 11 de Janeiro, que se constituiu como um importante e decisivo marco no processo de desenvolvimento das autonomias regionais, no que respeita, desde logo, às suas competências de ordenamento e gestão sobre o mar”.
O Grupo Parlamentar do PS/Açores justifica, assim, o seu parecer desfavorável, uma vez que o diploma que pretende alterar a Lei do Mar “surge, de forma injustificada, a meio de um processo político que decorre na Assembleia da República com vista a consolidar uma posição constitucional consensual sobre o papel das Regiões Autónomas no ordenamento e gestão do espaço marítimo nacional”.
PSD/Açores considera que
proposta de alteração da
Lei do Mar “é centralista”
O Grupo Parlamentar do PSD/A, por sua vez, justifica o seu parecer desfavorável às alterações à Lei de Bases da Política de Ordenamento e de Gestão do Espaço Marítimo Nacional, por a proposta de lei “manter o pendor fortemente centralista, não respeitando aquelas que são as competências das Regiões Autónomas em matéria de gestão do mar e constituir um evidente retrocesso neste domínio”.
Realça que “ao invés de cumprir o quadro legal de partilha de competências administrativas entre o Estado e as Regiões Autónomas”, a proposta de lei do Governo da República “reserva em absoluto para as autoridades nacionais a competência decisória no âmbito da adoção de instrumentos de ordenamento do espaço marítimo”.
Desta feita, o papel das Regiões Autónomas, refere o PSD/A, “é reduzido à mera faculdade de elaborar e propor parte do plano de situação ou de afectação em relação ao espaço marítimo adjacente, excluindo os Açores e Madeira do processo de decisão sobre projectos ou infraestruturas desenvolvidas no mar contíguo ao seu território. Esta situação não é admissível e configura uma clara restrição face à gestão partilhada do Mar dos Açores prevista no Estatuto Político Administrativo”, concluem os sociais-democratas açorianos.
Em conclusão, o PSD/Açores salienta que a nova versão da proposta de lei do Governo da República que pretende alterar a chamada Lei do Mar “continua a não acautelar os direitos da Região Autónoma dos Açores sobre as zonas marítimas nacionais”, e “não considera a anterior posição unânime da Assembleia Legislativa da Região Autónoma dos Açores sobre esta matéria.”
BE: Proposta de alteração
da Lei do Mar do Governo
da República “não é aceitável”
O Grupo Parlamentar do BE na Assembleia Legislativa Regional também emitiu parecer desfavorável à proposta de Lei que pretende alterar as Bases da Política de Ordenamento e de Gestão do Espaço Marítimo Nacional, no que respeita às regiões autónomas e às suas competências sobre o espaço marítimo nacional.
Segundo o Bloco de Esquerda, as alterações à designada Lei do Mar “ atribui competências de elaboração e aprovação dos respetivos planos de ordenamento que passam a incluir uma nova tipologia de plano, os planos de gestão, que passam a poder ser elaborados e aprovados pelas Regiões Autónomas, excepto quando estejam em causa o “estatuto de domínio público e as relativas à integridade e soberania do Estado e a projectos ou infraestruturas de relevante interesse para o país.”
Refere o BE que esta versão da proposta de Lei do Mar , “permite, na prática, que qualquer projecto ou infraestrutura assim classificado pelo Governo da República possa ser desenvolvido à revelia dos órgãos de governo próprio das Regiões Autónomas”.
No seu parecer, o Bloco de Esquerda entende que “essa exclusão das Regiões Autónomas do processo de decisão sobre projectos ou infra-estruturas desenvolvidas no mar contíguo ao seu território é inaceitável e um ataque à Autonomia”.
“As eventuais consequências negativas desses projectos ou infra-estruturas, como parece ser evidente no caso da mineração do mar profundo, terão como principais afectados as populações insulares. Serão os açorianos e açorianas a viver com as consequências potencialmente negativas de decisões sobre as quais não são responsáveis”, refere o Bloco de Esquerda no seu parecer.
Acrescenta ainda que o poder de elaboração dos planos de gestão do espaço marítimo nacional no mar contíguo às Regiões Autónomas “não se estende ao mar para além das 200 milhas”, o que para o BE “não é aceitável”.
Os bloquistas açorianos citam o artigo 8.º das alterações à Lei do Mar onde, “embora se atribua o poder de elaboração dos planos de ordenamento do espaço marítimo nacional às Regiões Autónomas, novamente apenas até às 200 milhas, o que merece a nossa reprovação, a sua aprovação parece continuar a caber unicamente ao Governo da República, o que significa que a esse nível este projeto de proposta de lei mantém tudo como está, o que não pode ter a nossa concordância”.
O Grupo Parlamentar do BE reafirma, por fim, que as Regiões Autónomas “devem ter o poder de elaborar e aprovar os planos de ordenamento e gestão do espaço marítimo nacional contíguo ao seu território até às 200 milhas e para além destas, excepto no que respeita às questões relativas à integridade e soberania do Estado, o que este projecto de proposta de lei não garante, bem pelo contrário,” conclui.
PPM: Proposta de alteração
da Lei do Mar “desrespeita”
competências dos Açores
O Grupo Parlamentar do PPM emitiu, igualmente, parecer desfavorável à proposta de Lei que altera as Bases da Política de Ordenamento e de Gestão do Espaço Marítimo Nacional com o entendimento de que a presente proposta de lei “é mais uma vez centralizadora e, como tal, desrespeita as competências das Regiões Autónomas no âmbito da gestão do mar”.
O PPM entende que o papel das Regiões Autónomas “não se poderá limitar a elaborar e propor parte do plano de situação ou de afectação em relação ao espaço marítimo adjacente, ficando impedida qualquer competência decisória no contexto da adopção de instrumentos de ordenamento do espaço marítimo”.
Realça que a presente proposta de lei “não cumpre com o quadro legal de competências administrativas entre as Regiões Autónomas e o Estado e exclui o papel decisório dos arquipélagos dos Açores e da Madeira relativamente aos projectos e infra-estruturas desenvolvidas no mar afecto ao território português, o que que se configura num enorme retrocesso e uma evidente restrição no que concerne à gestão partilhada do Mar dos Açores, matéria que se encontra prevista no Estatuto Político-Administrativo da Região”.
João Paz