Projecto-piloto arranca este ano no Nordeste e Praia da Vitória

Governo dos Açores cria Escola de Negócios para apoiar empreendedorismo, criação do próprio emprego e desenvolvimento local

Foi apresentada ontem, em Ponta Delgada, a Escola de Negócios, uma nova medida do Governo dos Açores para “promover a criação e postos de trabalho em zonas deficitárias de ofertas de emprego, desenvolvendo assim o tecido empresarial local e a fixação da população em zonas mais rurais e com perda de população,” anunciava, na ocasião, Maria João Carreiro, Secretária Regional da Juventude, Qualificação profissional e Emprego.
A nova medida destina-se a desempregados com a escolaridade obrigatória ou, no mínimo, o 9.º ano de escolaridade, a recém-diplomados com nível igual ou superior ao IV, e a estagiários que tenham concluído o seu estágio há menos de 6 meses, “sendo que esta selecção dos participantes na Escola de Negócios caberá às entidades formadoras, em articulação com o Centro de Qualificação e Emprego,” referiu a governante.
A Escola de Negócios é estruturada em três fases. Como explicou a Secretária Regional, “na primeira fase, designada “Ideia de Negócio”, o objectivo é capacitar os participantes em áreas essenciais ao empreendedorismo e à abertura de um negócio. Esta fase inclui formação específica, à medida, e motivacional, bem como sessões de brainstorming com empresas estabelecidas no mercado, elaboração de diagnóstico de necessidades locais e elaboração de uma ideia de negócio a apresentar a um júri que vai integrar, entre outros, membros da comunidade.”
Já na segunda fase, designada “Projecto de Negócio”, “e após a avaliação da ideia de negócio na fase anterior, o objectivo é elaborar um plano de negócios, que apresente viabilidade económica e financeira e que seja susceptível de criar o próprio emprego do participante. Sendo que nesta fase é assegurado o apoio técnico da entidade formadora, designadamente através do acompanhamento do projecto de negócio e da consultoria ao participante.”
A terceira e última fase é designada de “Abertura de Negócio”. Nesta etapa “é atribuído o apoio financeiro às micro e pequenas empresas que tendo sido implementadas na sequência das duas fases anteriores, tenham iniciado a sua actividade e gerado a criação do próprio emprego do participante. Este apoio corresponde a 18 vezes a atribuição mínima mensal garantida na Região e é acumulável com outras medidas de apoio ao investimento, como o Jovem Investidor e Pequenos Negócios integradas no novo sistema de incentivos Construir 2030,” clarificou a titular da pasta do Emprego, “Na primeira e segunda fases, com uma duração total de 3 meses, os participantes beneficiam de uma bolsa mensal no valor correspondente ao indexante dos apoios sociais.”
Para a governante, “a Escola de Negócios é uma resposta diferenciada e integrada. A Escola de Negócios pode contribuir para a fixação de população nos diferentes concelhos da Região com economias menos dinâmicas, integrando numa mesma fórmula empreendedorismo, auto-emprego e desenvolvimento do tecido empresarial local, com os benefícios que daí decorrem também para a coesão social e territorial e para a redução das assimetrias sociais e económicas.”
O projecto-piloto da Escola de Negócios iniciar-se-á até ao final deste ano nos concelhos doNordeste, em São Miguel, e Praia da Vitória, na ilha Terceira,“ adiantou Maria João Carreiro.

Paula Rego e João Rocha deram
o exemplo e aconselharam
os alunos presentes
Na ocasião, houve também um momento de reflexão sobre empreendedorismo e criação do próprio emprego com Paula Rego, fundadora da Queijaria Furnense, João Rocha, fundador da The Barbershop by João Rocha, e Inésia Pontes, Directora Executiva da Cresaçor, moderado por Nuno Gomes, Director Regional da Qualificação Profissional e Emprego.
Paula Rego, de 24 anos, é a fundadora da Queijaria Furnense. É natural da freguesia das Furnas, Povoação, e tirou o curso de Mesa-Bar na Escola Profissional de Vila Franca do Campo. Sendo o seu pai lavrador, tem uma paixão pela lavoura desde criança, sendo que depois da escola, esta fazia parte do seu tempo livre. Com apenas 17 anos abriu o seu próprio negócio, com a ajuda da família, “criando o queijo feito com água azeda”, das Furnas. Em 2016 venceu o concurso Ideia Açor, com o Queijo do Vale. Dois anos depois venceu novamente, com os Bombons do Vale. Paula Rego é uma das caras do empreendedorismo jovem nos Açores.
Na sessão de apresentação da Escola de Negócios, a jovem furnense contou o seu percurso: ““Desde os oito anos que a minha primeira paixão sempre foi a lavoura. Quando cheguei ao secundário, na escola regular, no 11.º ano, a Matemática não ajudou ao meu sonho de ser veterinária. Havia sempre um fechar de uma janela, mas o abrir de uma porta. Quando não consegui atingir esta média para entrar na universidade, surgiu a oportunidade de entrar na Escola Profissional de Vila Franca do Campo, no curso de Mesa-Bar. Perguntei-me várias vezes o que estava a fazer naquele curso, mas de facto comecei a me aperceber que foi graças à escola profissional, e ao professor Eládio, que me deram o apoio e tiveram confiança em mim para começar a apostar num produto que nós, como família, já estávamos a começar a trabalhar.”
O negócio surgiu num contexto menos favorável à lavoura, em 2015, com o fim das quotas leiteiras. Assim, a família de Paula Rego apostou num derivado do leite: o queijo. Em retrospectiva, a jovem lembra que “não foi fácil. Passamos por vários processos. Tivemos um ano e meio em experiência. Tivemos um bocado de burocracia envolvida. Acho que uma das grandes dificuldades do jovem hoje em dia é, principalmente, a burocracia. O que me dá gozo, hoje em dia, é sermos exemplo e termos conseguido ultrapassar aqueles obstáculos, e nunca desistir. Também dou destaque à família, que nunca deixou de me apoiar. Estou onde estou graças ao meu pai, à minha mãe e aos meus irmãos.”
Para atingir o sucesso que tem hoje em dia, a empreendedora teve de ouvir vários “nãos” e viu-se face a vários entraves. “Aproveitei um recurso natural da nossa freguesia, a “água azeda”, que vem da nascente, com uma característica única, que é ter um teor de ferro elevadíssimo, que é transmitido para o queijo. Quando fomos meter isto em prática, para lançar no mercado, ouvi um ‘não’. Disseram-me que não podia usar aquela água. Não havia uma lei que dissesse que não podia utilizá-la. Mas uma das minhas grandes vantagens é nunca desistir,” conta, sendo que foi a sua persistência que a fez procurar sempre pelas soluções, não permitindo que os obstáculos pusessem fim ao seu objectivo.
Agora, passados vários anos, o projecto de Paula Rego conta com 16 colaboradores. A primeira queijaria tinha a capacidade máxima de 1.000 litros de leite, a segunda queijaria passou a ter 3.000, lembra a furnense. “Actualmente, estamos a transformar entre 25.00 a 3.000 litros de leite, por dia. Já andamos à volta de 900 queijos diários.”
João Rocha, fundador da icónica Barbershop by João Rocha, em Ponta Delgada, é natural da ilha Terceira. Por muito tempo, não sabia qual era a sua vocação. Tirou o curso de Informática, e começou a sua vida profissional numa agência funerária, onde trabalhou durante sete anos. Depois, criou um stand de motas na sua ilha natal, que infelizmente teve de fechar portas, em 2009, devido à crise bancária. Após esta primeira experiência por conta própria, teve trabalhos precários e fez animação de rua, aproveitando o facto de saber tocar música. A área da barbearia surgiu por acaso, quando João Rocha acompanhava a sua esposa, que fazia um curso na área da estética, a Lisboa.
O jovem empreendedor contava na ocasião que nunca teve o sonho de ser barbeiro ou de cortar cabelo: “Aos 17 anos, estava a terminar o 12.º ano, no curso de Informática, porque percebíamos que o futuro passava pelos computadores e como não havia nada que me concretizasse ou que fosse um sonho, fui para essa área. Estava com dúvidas se ia para a universidade ou se ia seguir essa carreira. Não havia nada em mim que dissesse que era isso que eu queria fazer.” Surgiu então a oportunidade de trabalhar numa agência funerária para fazer umas férias, acabando por ficar efectivo.
Depois, o gosto pelo motocross fê-lo tentar um negócio por sua conta, abrindo um stand. “Foi ai que senti que tinha alguma parte empreendedora dentro de mim. Vi ai uma oportunidade de negócio. Abri o stand,” com as suas poupanças do trabalho na agência funerária, conta. Apesar de fazer muitas vendas e te “ter tudo para dar certo”, veio a crise, em 2008/2009, e teve de fechar portas. “Na altura pensei que estava tudo contra mim e que nunca mais ia ter nada por minha conta. Tinha um funcionário e naquela altura senti-me mal com a situação,” lembra. João Rocha, ficou desempregado, com alguns trabalhos precários e sentia-se sem norte.
A possibilidade da área da barbearia surgiu-lhe em Lisboa, quando acompanhava a esposa a um curso de estética. O professor de barbearia daquela escola, descobrindo a situação de João, desafiou-o a tirar o curso de barbearia. “…decidi experimentar. Inscrevi-me nesse curso, sem paixão e sem saber que era aquilo que queria fazer, se tinha jeito. De certeza não tinha jeito. Nunca tinha tentado. A primeira vez que realmente senti que tinha paixão por aquilo que fazia, foi quando passamos da teoria para a prática.” Foi ao cortar o cabelo e a barba a um sem-abrigo, que João Rocha descobriu a sua verdadeira paixão, lembra: “Quando eu virei a cadeira para o espelho e o senhor viu a sua imagem, ele começou a chorar de felicidade. Aquilo mexeu comigo.”
Em 2014, abriu a sua primeira barbearia, na Terceira, e a partir daí, tornou-se cada vez mais conhecido.
Os dois empreendedores deixaram uma mensagem e conselhos aos alunos que assistiram à sessão. “A mensagem que eu deixo é que não existem caminhos novos, mas sim diferentes formas de caminhar(…) Tentem sempre fazer diferente,” foram algumas das palavras que  Paula Rego deixou aos jovens.
“O meu conselho é que invistam muito em vocês e procurem aproveitar o que a escola vos dá, mas vocês têm de procurar um pouco mais para se conseguirem diferenciar. Tem de haver paixão, tem de se investir mais na nossa formação, perceber quais são os pontos-chave do nosso produto, onde é que podemos acrescentar valor àquilo que fazemos para se tornar um trabalho diferenciado,” foram os conselhos deixados pelo barbeiro João Rocha.


Mariana Rovoredo

 

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Autor: CA

Categorias: Regional

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