Ana Silva esteve este fim-de-semana no Moda Madeira

Estilista açoriana regressa a Portugal com a colecção que estreou na Semana da Moda de Paris

 Correio dos Açores - Pode falar um pouco sobre si e sobre o seu percurso?
Ana Silva - Comecei há 13 anos com a minha marca, Anna Margarette. Em 2013, participei no International Feshion Showcase, em Londres, uma competição entre vários países. Em 2019 apresentei a minha colecção na Semana da Moda em Nova Iorque e em 2020 na semana da Moda de Paris.

Quais foram os momentos mais marcantes da sua carreira? Tem alguma história que queira partilhar?
O momento mais marcante foi a Semana da Moda em Paris, porque sempre foi um evento em que queria participar. Também nunca tinha estado em Paris e apresentar a minha colecção a toda uma imprensa estrangeira foi muito importante para mim. Embora tenha estado na Semana da Moda de Nova Iorque, Paris foi sem dúvida o mais marcante.
Tenho algumas histórias caricatas, aflições de última hora em relação à roupa. Em Nova Iorque, um dos zips rebentou e, como não conhecíamos a cidade, estivemos meio perdidas por lá. Enquanto estava nas provas finais, a minha mãe andava pelas ruas de Nova Iorque à procura de um zip. Felizmente conseguimos encontrar e remendamos o melhor que conseguimos.
Em Paris, uma das modelos atrasou-se muito e na folha de apresentação dela dizia que o número de calçado era o 40. Como os meus sapatos eram todos 39/40, à partida estava tudo bem. Quando a modelo chega, cerca de cinco horas atrasada, diz-me que é o 41. Tivemos de cortar a parte toda do sapato, fazer uma sandália, esconder, pintar tudo... Esta foi, sem dúvida, uma das histórias mais engraçadas dos bastidores.

No passado fim-de-semana esteve no Moda Madeira. Pode falar sobre a experiência?
Representar os Açores no Moda Madeira foi uma forma de voltar ao panorama nacional, porque ultimamente tenho apresentado sempre internacionalmente. Foi uma experiência muito boa, com uma organização maravilhosa, a equipa está toda de parabéns. Estavam presentes pessoas de vários países, inclusive, a impressa brasileira, o que foi muito interessante porque pude falar com eles sobre como funcionam, por exemplo, as semanas de moda em São Paulo.
A sensação de voltar a apresentar em Portugal foi muito boa, pois, como não apresentava cá há tantos anos, foi muito bom ter o reconhecimento do meu país, o reconhecimento de que estou a fazer um bom trabalho no estrangeiro. As pessoas fizerem com que me sentisse em casa e acho que foi uma escolha muito acertada para voltar.

Pode falar da sua colecção “Ascension”?
Em relação à colecção que levei ao Moda Madeira, como só soube dois meses antes do evento, não tive tempo de preparar uma colecção do início. Portanto, apresentei a da Semana da Moda de Paris, a “Ascension”. Esta colecção é inspirada no trabalho do artista Brian Dettmer, um escultor de livros. Ele trabalha com muitos materiais e, então, como eu queria juntar a parte tradicional ao tecnológico, usei tecidos como a cortiça, o latex, pvc, pele falsa metalizada e tecidos tecnológicos. A luz-sombra carismática pela tridimensionalidade da perspectiva é reforçada através da conjugação das cores: prateado, vermelho, preto, verde e castanho-claro. Queria que houvesse um contraste de cores mais dramático, muito industrial, conceptual e até mesmo vanguardista. Pensado também na simetria que a colecção pretendia, e também algo com o qual gosto muito de trabalhar, também recorri às camadas.

Quais são os planos para o futuro da sua marca?
Neste momento queria muito apresentar em Milão, e tenho também proposta para vender a minha colecção em Paris, na loja Flying Solo. Mas, antes de tratar de toda esta logística de vender nesta loja, quero tirar um curso em Paris na área da moda.

Fez o vestido da Miss Eco Europa e Portugal 2022. Que outras criações são inspiradas nos Açores?
A colecção que apresentei em Nova Iorque foi inspirada na marina da Horta, nas formas que retirei das pinturas. Portanto, os Açores são sempre uma inspiração para mim.
Em relação ao vestido da Cristina Carvalho, a Miss Eco Europa e Portugal, foi um projecto em que fizemos o vestido nacional para o concurso. Fiz vários desenhos e ela aprovou o desenho final. É uma criação com muito valor para mim porque, tanto eu, como a minha mãe, trabalhamos muito nele. Tivemos de colocar cada pétala de cada hortence e, portanto, foi um vestido que nos levou muitas horas a completar. É uma peça com muito significado para mim porque representa as nossas nove ilhas.

Como é que ser açoriana no mundo moda?
Fui a primeira pessoa no Faial a tirar Design de Moda e, na altura, não era um curso muito conhecido. Nós temos tantos artesãos maravilhosos nos Açores que é uma pena que não haja mais pessoas a seguir o nosso trabalho, porque, como açorianos, nós temos uma cultura tão rica e tão vasta e seria muito interessante que ela fosse mais mostrada. Quando digo que sou dos Açores, muitas pessoas ficam surpreendidas por existirem açorianos a apresentar colecções, por pertencerem ao meio da moda.  Tenho muito orgulho em estar no mundo da moda como açoriana porque nesta área não somos muitos a “mostrar a nossa casa” e, sempre que podemos fazê-lo, é muito importante. Temos alguns designers nos Açores, principalmente em São Miguel, que também tentam fazer o mesmo e acho isso muito importante, pois a nossa Região fica a ganhar com o reconhecimento internacional.

Os Açores fazem parte do futuro?
Para mim não. Quando saí do Faial, ainda muito novinha, disse que queria levar os Açores comigo e viver e trabalhar internacionalmente. Daqui a alguns anos, sinto que gostaria de voltar ao Faial e voltar aos Açores para realizar alguns projectos, mas não me vejo a voltar para viver, até porque a minha carreira já foi toda construída cá e, na verdade, já estou ambientada a Londres.

Que conselhos daria a quem queira seguir os seus passos?
Em primeiro lugar, é preciso ter muito espírito de sacrifício e muita vontade. Não é nada fácil, temos de dar muita luta e trabalhar até muito tarde. Temos de acreditar muito. Eu tenho essa força de vontade e essa paixão dentro de mim, eu adoro moda e se, quem quiser envergar por esta área tiver força de vontade e paixão pela moda, vai conseguir vingar, nem que seja daqui a 10 ou15 anos, mas vão conseguir.   Eu estar aqui hoje, é a prova de que é possível. Vamos ver mais açorianos a vingar no mundo da moda, porque os açorianos têm muito talento.

Daniela Canha

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Autor: CA

Categorias: Regional

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