O Presidente do Governo dos Açores, José Manuel Bolieiro, pretendeu ontem “desdramatizar” o impacto da redução do número de agricultores nos Açores e a existência de maiores concentrações durante a cerimónia de entrega dos Prémios de Excelência a 245 produtores micaelenses de leite pela Associação de Jovens Agricultores Micaelenses, presidida por Nélio Miranda.
José Manuel Bolieiro reforçou que redução de produtores “não é um drama”, mas sim “um sinal dos novos tempos”.
O que é preciso, referiu, “é garantir que este núcleo de excelência representado pelos jovens seja potenciador de valor acrescentado na distribuição, através de um preço justo, da cadeia de valor, de um rendimento equitativo para todos e, portanto, garantir a sustentabilidade”.
“Não é pois, drama, a diminuição da quantidade de produtores”, reforçou. “É, sim, o desafio de juntar o prestígio e excelência adquirida de capacidade adaptativa para a inovação, para as novas tecnologias e, sobretudo, para a influência que este governo, estrategicamente, tem promovido de intervir na cadeia de valor para a noção de preço justo e equidade na distribuição do rendimento. Sim, nós temos tido esta estratégia e temos promovido para que haja esta compreensão”, sublinhou.
“Contam connosco, políticas públicas, para este envolvimento formativo e empreendedor com base na ideia de sustentabilidade, na ideia da inovação, e da aplicação das novas tecnologias para mais rendimento, para mais valor acrescentado ao produtor”, afirmou.
O Presidente do Governo voltou ao tema, já no final da sua intervenção. “Não tenho dúvidas sobre esta exigência de caminharmos sempre, independentemente – por isso é que eu desdramatizo, da quantidade, mas sim da capacidade produtiva, da qualidade produtiva. Isto é uma evolução. As novas tecnologias também ditam a concentração, o emparcelamento. Todas estas questões são massa crítica para produzir mais com menos custos e com mais rendimento”, afirmou.
E, portanto, realçou o Presidente do Governo dos Açores, “queria concentrar-me nesta exigência da inovação, da sustentabilidade e de um diálogo justo, real, na cadeia de valor, produção, industrialização, distribuição e comercialização. No final da cadeia de valor está o consumidor. E o governo, interveio, no domínio das nossas competências, diminuímos a taxa do IVA nacional ao máximo possível, 30% para garantir também um acto solidário como consumidor para além das subvenções públicas, desde o começo da produção para tornar o preço compatível com as capacidades económicas e financeiras das nossa famílias e das nossas empresas”, completou.
Sustentabilidade ambiental
social e económica
O Presidente do Governo fez uma breve referência à criação, em curso, do Observatório Regional Agro-Alimentar que “estudará e promoverá em todas as ilhas e na cadeia de valor, acompanhar a compreensão da formação dos preços e, com isso, retirar o anátema da suspeição de que, na criação de rendimento e valor acrescentado, uns ficam com quase tudo e outros ficam com quase nada. É preciso ter esta compreensão do preço justo”, sublinhou.
“Estamos a potenciar este exercício com base no saber fazer e fazer bem em função e em razão deste valor acrescentado. E monitorizarmos – é esta a intervenção pública – a formação do preço para todos termos a possibilidade de, pedagogicamente, intervir na distribuição equitativa e justa do rendimento por toda a cadeia de valor”, disse.
José Manuel Bolieiro fez, depois, uma curta reflexão sobre a sustentabilidade que, no seu entender, “é ambiental, social e económica”. Como afirmou, no quadro da sustentabilidade “a agricultura é o pilar do desenvolvimento dos Açores. É marca e identidade do nosso ordenamento do território. É marca e identidade do prestígio dos Açores para os residentes mas também para, enquanto território de destino turístico, ter um valor acrescentado do seu património natural no que diz respeito à avaliação do nosso visitante.
Neste contexto, para o chefe do Executivo, a Agricultura “não é um sector primário por estar na base da cadeia de valor, é primário porque é mais importante.”
Sob o ponto de vista social, referiu que “é conhecido que, na história de cada uma das nossas ilhas, até para esforço de uma política demográfica adequada no sentido de reter populações aos territórios em cada ilha e, dentro de cada ilha, nos territórios rurais, mais periféricos, é essencial uma economia e um empreendedorismo agrícola, na sua totalidade, não apenas na fileira do leite ou da carne, mas em todo o agro-alimentar que importa valorizar”. Isto para a “fixação populacional e, sobretudo, de criação de rendimento para garantir a sustentabilidade social nos Açores.
Apelo aos jovens para a inovação
José Manuel Bolieiro realçou a estratégia do seu Governo que dirigiu a todas as gerações “de evitar a perda de distribuição e compensação do prémio aos produtores, acabando com o rateio do POSEI. Isto é estratégico, isto é compromisso. Isto é conhecimento das prioridades que queremos dar ao nosso agro-alimentar e à nossa capacidade produtiva no domínio agrícola e do sector primário. Estamos imbuídos em manter este alinhamento que não era feito no passado. Está no presente e tem compromisso de sustentabilidade no acordo de parceria”, que tem como um dos subscritores a Federação Agrícola dos Açores.
Deixou um apelo aos jovens que “no quadro da inovação, da investigação, associado, não só, à própria capacidade que a Administração Regional autónoma possa dar directamente e indirectamente, através dos seus institutos e empresas do sector público empresarial regional, também associado à Universidade dos Açores, esta capacitação da inovação para a descoberta de novos produtos comercializáveis e transaccionáveis, com valor acrescentado. E termos uma intervenção mais presente, mais pública e, por isso, mais transparente com toda a cadeia de valor, também a indústria, também a distribuição. E precisamos de ter este diálogo que é do interesse de todos. E que possam compreender que a economia de mercado tem estas variabilidade e temos todos que nos adaptar e contar com a solidária intervenção pública na subvenção para conter determinados riscos nos ciclos mais penosos do desenvolvimento da criação de riqueza. É esta a minha atitude, é esta a nossa linha estratégica para estar ao lado do futuro dos Açores”.
“Eu não olho para a Agricultura e para o sector agro-alimentar como uma coisa do passado”, afirmou o Presidente do Governo para, depois, considerar o sector como “identidade e, sobretudo, o futuro e garantia de um outro exercício que não podemos falhar: O da continuidade de uma autonomia progressiva alimentar. E, a propósito, deu como exemplo “a experiência terrífica da pandemia – de ficarmos com a globalização fechada. E, afinal de contas, é essencial termos capacidade produtiva. A agricultura nos Açores foi essencial. Não parou. Outros sectores pararam”.
A outra “essência”
José Manuel Bolieiro despertou o que considerou “outra essência”. É que cada vez mais, com a chamada população consumidora flutuante – constituída por turistas – podermos ter uma sensibilidade especial para o embalamento do nosso produto de excelência porque ela também ajudará na hotelaria e na restauração”. E chamou a atenção para o “entendimento que a nossa economia de distribuição e de consumo tem de ter: Poder valorizar o produto endógeno, poder valorizar o que é nosso para uma exportação sem custo de transporte. A exportação é consumida cá mesmo através deste valor. E aí o embalamento e a marca e identidade são essenciais.”
“Junto à excelência de produção um outro elemento decisivo, a confiança na qualidade do produto quanto à segurança alimentar, quanto à sua componente biológica, quanto ao seu controlo bacteriológico. É de fundamental importância mantermos esta identidade de confiança na qualidade do nosso produto neste domínio porque as novas gerações têm outros hábitos alimentares, mas não prescindirão, mesmo na evolução dos hábitos alimentares, da qualidade, da excelência e da segurança alimentar e confiança no produto. Com isto teremos sempre muito futuro”, concluiu.
Na sua intervenção, o Presidente do Governo começou por reconhecer o “mérito” dos agricultores e relevou a “consistência no nosso sector económico ligado ao sector primário e do agro-alimentar, deste percurso desde os avós, pais, filhos e netos, e, assim, na procura de melhoria e de atingir a excelência.
Realçou a “atitude” dos produtores, a “atitude” de quem é trabalhador, empreendedor activo no mercado de trabalho e criação de riqueza, que “é essencial para o sucesso”. Sem esta atitude, como disse, “não se alcança a excelência”. E a excelência “dá prestígio e isso dará rendimento”.
No seu entender, “o prestígio é o início da cadeia de valor do rendimento. É uma identidade, uma marca, que, depois, dá valor acrescentado”.
Deixou, sem sequência, uma mensagem aos jovens dos Açores: “É que podem potenciar e reconhecer a vontade de serem tão empreendedores quanto os pais e avós, mas terem agora uma especial sensibilidade – porque em cada tempo um novo ciclo – que é a da sustentabilidade, a da inovação, a de adaptação e formação para as novas tecnologias. É este o futuro. Se este futuro for bem preparado e compreendido, com a identidade, o prestígio, a excelência que recebem do património das gerações anteriores, então eu acredito que o agro-alimentar promovido por jovens agricultores dos Açores continuará a ter sucesso, sustentabilidade e, portanto, futuro”.
Pais sozinhos
A intervenção do Presidente do Governo quase que surgiu em sequência à do Presidente da Associação de Jovens Agricultores, Nélio Miranda, que, depois de sublinhar que a sustentabilidade “não é só o meio ambiente, não é só deixar o ambiente melhor para os nossos filhos, mas também ser sustentável a nível financeiro”, afirmou que no passado se via os filhos com os pais nas explorações agrícolas, numa passagem de geração para geração. E “Hoje em dia, vejo muitos pais sozinhos nas explorações. Falar do futuro destas explorações e dos jovens que nelas não estão…”
Nélio Miranda salientou, por outro lado, que o prémio ontem distribuído foi criado para a excelência do nosso produto. “Excelência que, cada vez mais, vai tendo mais critérios que fazem com que este produto seja cada vez melhor, o que nós todos achamos bem. Mas deixava aqui uma certa reflexão à sensibilidade a quem aplica estes critérios. Não sei se muita vez se eles estão assentes também naquilo que hoje muito se proclama que é a sustentabilidade…” E o Presidente da Associação de Jovens Agricultores ficaria por aqui.
Já no debate que se seguiu, apoiou as declarações do Presidente da Federação Agrícola dos Açores, Jorge Rita, em defesa dos jovens agricultores micaelenses.
Jorge Rita começou por considera o evento “de grande relevância para o sector leiteiro, pela dinâmica dos jovens e pela excelência do produto apresentado” como garantia do futuro.
Mas, prosseguiu o Presidente da Federação Agrícola, “para os jovens terem futuro, com a sustentabilidade que se pretende, com tudo aquilo que necessitam para terem rendimento, para terem confiança no investimento que têm que fazer para este futuro, há várias falhas que têm que ser identificadas e devidamente solucionadas”.
Jorge Rita falou do trabalho que tem sido feito para captar novos jovens agricultores, considerando que é necessário “criar-lhes condições e estímulos para eles perceberem que indo para o sector agrícola, para o sector leiteiro, têm futuro”.
Deu enfoque aos “brutais” valores que os jovens agricultores açorianos pagam às Finanças e à Segurança Social, além da crescente burocracia, que “desincentivam muito os jovens agricultores”.
Depois deixou mais um recado: “Raramente falam do bem-estar dos agricultores, mas todos falam muito no bem-estar animal”. Isto porque “somos obrigados fazer o investimento no bem-estar animal…”
Como afirmou, “não basta só estar no ADN dos açorianos gostar do sector leiteiro. Isto é muito importante porque é a base da transmissão na família que, ao longo dos anos, ficam apaixonados pelos animais…. Mas os jovens têm que ser cativados para o sector com ajudas nacionais e com majorações.”
João Paz