Pedro Chagas Freitas afirma que “a literatura feita por açorianos está viva...”

Vem a Ponta Delgada apresentar o livro “Prometo amar” e dar uma sessão de autógrafos. Fale-me deste novo livro. Este livro é mais um na sequência da série “Prometo”. É um livro de fragmentos, que não tem princípio, meio e fim e que procura trazer, mais uma vez, um catálogo de pessoas, de humanos das mais diversas espécies, com os mais diversos objectivos e dores. A ideia desta série de livros é fazer com que todos estes humanos tenham algo em comum, nomeadamente primeiro falhar, depois perder e finalmente amar. Amar é o ponto mais positivo e se calhar aquele com que temos mais dificuldade em lidar, sobretudo ao nível da exposição do que sentimos. Se o falhar e o perder tornam-se factores menos positivos e que qualquer um pode encontrar, o amar acaba por ser o mais comum e o mais complicado de transmitir e de comunicar. Vem, também, apresentar o livro do Júlio Oliveira. O que lhe transmite este escritor e o livro em causa? Raramente aceito apresentar um livro, já não me lembro do último livro de outra pessoa que apresentei. Aceitei o desafio, porque vi algo de especial no Júlio; depois de ler o livro, percebi que o que tinha em mãos era diferente, que havia qualquer coisa que importava destacar. Se eu puder, de alguma forma, vou sempre incentivar e estimular a escrita e foi por isso que vim apresentar o livro do Júlio Oliveira. Já não vinha a Ponta Delgada há algum tempo, estando anteriormente cá aquando da realização das oficinas de Escrita Criativa do EscreVIVER (n) os Açores. O que espera encontrar desta vez? Estou entusiasmado com este meu regresso, porque acho muito importante voltar aos Açores. Vou estar atento às mudanças que São Miguel viveu, ao que cresceu, ao que deixou de crescer e ao que há para crescer ainda. A adesão ao projecto EscreVIVER (n) os Açores tem diminuído, comparativamente com o início do mesmo na Região, em 2010. Na sua opinião, há alguma diferença no interesse pela área da escrita entre os açorianos e os residentes no continente? Não tenho pontos de análise suficientes para fazer tal afirmação, que me permita dizer que sim ou que não. Quando estive aí, gostei muito e tive experiências que nunca esqueci e que nunca vou esquecer. Quanto às diferenças, eu espero que existam, pois é um sinal que as pessoas são, também, o lugar aonde vivem. Certamente que um workshop em Ponta Delgada será diferente de um em Lisboa, por exemplo. As pessoas são diferentes entre si e são o lugar aonde vivem. Agora, se estão mais abertas ou não à escrita criativa, isso não sei. O ponto de análise que eu tenho é ter estado aí há alguns anos e ter corrido muito bem. Que segredos possui para que os seus cursos de escrita criativa sejam tão conhecidos e bem-sucedidos? Realizar os meus cursos é algo que me dá um gozo tremendo. Enquanto conseguir e tiver tempo para isso vou prosseguir com as formações. O segredo é inventar sempre. Um workshop meu de há um ano é completamente diferente de um de hoje. O que é importante é nunca parar, nunca acreditar que temos uma fórmula que vai funcionar para sempre. Cada workshop é diferente e estou sempre a inventar novas metodologias. E é de tal maneira que quando olho para o que fazia há quatro ou cinco anos até sinto vergonha, pois vejo a evolução até agora. O que me dá gozo é mesmo inventar metodologia nova e perceber como chegar aos objectivos de cada novo grupo. Apesar de os cursos terem um intuito formativo, é, também, interessante perceber como as pessoas podem ver naquilo mais do que uma acção de formação, tornando-se aquele momento num espectáculo ou num momento de diversão. O filme baseado no livro “Prometo Falhar” sai a 5 de Julho. Como surgiu esta oportunidade e como se tornou possível realizar um filme de um livro tão singular e diverso nas histórias que conta? Tive a oportunidade de o ver na semana passada no cinema, na ante-estreia. Foi interessante ver o filme, porque sendo um livro fragmentado o que se pode esperar é exactamente isso, um filme fragmentado. Tal como acontece com o livro, não consigo dizer se é um romance, se é um livro de crónicas ou de poesia, não faço a mínima ideia. Nos livros do “Prometo” não coloco nenhuma etiqueta, deixo as pessoas decidirem. Quanto ao filme acontece o mesmo. Alguns vão vê-lo como um filme de ficção, outros como um documentário ou como um filme poético. Gostei muito da abordagem dada pelo Alberto Rocco, o realizador. Agora é preciso perceber como é que as pessoas o vão encarar. Acho importante fazer um alerta: as pessoas não podem esperar, tal como no livro, uma história linear, com princípio meio e fim. Podem esperar o que o livro é, um catálogo de humanos. O filme será rodado nos Açores? O filme estreia no dia 5 de Julho. Estamos a tentar levar o livro e o filme o mais longe possível; o livro vai agora para os Estados Unidos e para a Austrália e é nosso objectivo levar o filme ao público do livro, sendo que os Açores estão claramente neste mapa. Como reagiu a esta oportunidade de ver um dos seus livros em filme? Fiquei muito surpreendido com a ideia, mas aceitei logo, porque achei interessante e estava bastante curioso em perceber a abordagem que seria dada ao mesmo. Não fazia a mínima ideia de como o Alberto Rocco ia produzir o produto final. Gostei muito. Até porque algo que me apetece bastante é ligar o que escrevo a outras áreas, aliás chegaremos, também, ao teatro com este livro. O que me interessa perceber é como é que o livro se abre a outras abordagens e fico curioso com isso também. O filme conta com actores de teatro de reconhecimento na área, mas não tem muitos actores de televisão. Independentemente de serem conhecidos ou não, gostei muito do trabalho deles e dei-lhes os parabéns também! O Pedro teve um percurso muito diversificado desde que começou a escrever até agora, passando mesmo por diversas profissões. Alguma vez imaginou que chegaria a este ponto de sucesso aonde se encontra? Nunca escrevi para ser um best-seller. Aliás, é curioso, porque o “Prometo Falhar” é best-seller e esteve para não ser lançado, uma vez que pensamos que não ia vender muito. Os editores e as pessoas do mercado diziam que não ia ser vendável, por ser um livro diferente. Nunca tinha existido uma obra daquele registo, assim fragmentada, e poderia não ter havido sucesso comercial. Foi mesmo sem querer. É muito interessante chegar a um maior número de pessoas e é isso que procuramos quando escrevemos, mas nunca foi um objectivo atingir directamente este patamar. O que me interessa é escrever por gosto e depois logo se vê se escrevo para cinco mil ou para cinco milhões. Na sua opinião, como se tem desenvolvido a literatura açoriana nos últimos tempos? Muitas vezes nem sei de onde são os escritores que eu leio, não é nada que me preocupe efectivamente. Do que conheço, e tendo em conta que não estou muito focado na literatura açoriana em específico, tenho dois exemplos de escritores da Região que destaco: o Júlio Oliveira e o Joel Neto. Para mim, estes são dois exemplos de que a literatura feita por açorianos está viva. O Júlio Oliveira é um jovem ainda e tem muito caminho para fazer, e o Joel Neto também é um miúdo no que diz respeito à escrita, ainda tem muitos livros para escrever. Estes são dois exemplos de outros que com certeza existirão. Se eles motivarem outros a seguir este caminho será muito benéfico para os Açores. Não é por estar numa ilha que estamos isolados, longe disso, ainda mais nos dias de hoje. Julgo que a literatura açoriana se recomenda cada vez mais.
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