Phil Hogan desafia os Açores a aproveitarem acordos com Canadá e México mas Governo diz não será fácil aumentar quotas naqueles mercados

No último dia da visita aos Açores do Comissário Europeu da Agricultura e Desenvolvimento Rural, Phil Hogan, foi lançado o desafio para que se aproveite a localização da Região para se conseguirem alcançar novos mercados. Depois de mais um dia de visitas a uma fábrica de lacticínios, a duas explorações agrícolas e a uma plantação de ananás, Phil Hogan disse que se lembrou muito da sua Irlanda natal e da quinta e 40 hectares onde cresceu, e por isso mostrou-se sensível às dificuldades de uma Região Ultraperiférica como os Açores. Trouxe à Região o mais esperado anúncio dos últimos tempos para a agricultura, que os cortes de 3,9% anunciados para o POSEI não seguiriam em frente, e salientou que a União Europeia “apoia” o trabalho que se vai fazendo nos Açores e nas Regiões Ultraperiféricas (RUP) na agricultura e no sector agro-alimentar. “Entendemos especialmente a problemática das pessoas que têm negócios na agricultura, que têm de trabalhar com as condições atmosféricas e com a topografia. E os questões dos transportes de e para as ilhas, que faz com que seja uma tarefa difícil para quem trabalha e vive aqui”, reconheceu o Comissário Europeu para a Agricultura. Por isso entende que é necessário “ver como podemos diversificar e com a ajuda de boas políticas de promoção podemos ajudar o sector agro-pecuário e os nossos agricultores a fazer mais”, acrescentou. Por isso Phil Hogan revelou que houve conversas com o Governo Regional e com os eurodeputados “para saber como podemos fazer mais aqui nos Açores”, afirmando que “temos de aproveitar a vossa localização para os acordos que conseguimos com o Canadá [Acordo Económico e Comercial Global (CETA)] e com o México. Temos de olhar para o futuro em termos de transportes para os mercados onde 98% de todos os produtos agrícolas que exportarmos da União Europeia para o Canadá serão livres de taxas de transporte, e 93% do que exportarmos para o México serão livres de taxas de transportes e veremos como os Açores, que estão bem localizados, podem usufruírem destes acordos”. Além destes acordos que podem ser úteis enquanto novos mercados para os Açores, Phil Hogan garante que a União Europeia “vai continuar com os apoios financeiros para garantir que os nossos agricultores são viáveis”. No final, Phil Hogan disse-se “satisfeito porque fomos capazes de assegurar a proposta de orçamento sem cortes no POSEI e estou satisfeito com o apoio do Parlamento, porque valorizamos o trabalho das RUP e percebemos as suas dificuldades”, disse. Perante o desafio do Comissário da Agricultura, o Secretário Regional da Agricultura e Florestas, João Ponte, referiu que o CETA e o acordo da União Europeia com o México “são oportunidades”, no entanto lembrou que “não é a primeira vez que a Região exporta para o Canadá”. Mas o que está em causa actualmente, o CETA, é um acordo que “já foi implementado mas não se está a sentir porque não tem sido fácil aumentar as quotas de exportação de produtos. Temos aqui novas oportunidades e temos uma estratégia que terá de ser sempre afinada em relação aos desafios quanto ao futuro”, disse. Mas o Secretário Regional da Agricultura lembrou que “cabe ao Governo criar instrumentos e apoiar as cooperativas e a indústria, mas o desafio de entrar nos mercados, bater às portas, está nas indústrias. Cabe ao Governo acompanhar e isso vamos continuar a fazer”, garantiu. João Ponte que se mostrou satisfeito com o facto da primeira visita oficial de Phil Hogan a uma RUP ter sido aos Açores, referindo que esta visita serviu “para mostrar o bom trabalho feito pelos agricultores no aproveitamento dos fundos comunitários dos últimos Quadros Comunitários de Apoio (QCA), mas a oportunidade para mostrar que a Região precisa de mais investimento e de aplicar mais fundos que o próximo QCA irá trazer, para termos agricultura mais competitiva e mais bem preparada para vencer os desafios do futuro que são grandes e não depende da acção dos agricultores”, referiu. Comissário é “um aliado dos Açores” Por seu lado, o Presidente da Federação Agrícola dos Açores e da Associação Agrícola de São Miguel, Jorge Rita, destacou que nos próximos nove meses de negociações do próximo orçamento da Política Agrícola Comum (PAC) é sempre tempo de lutar por mais verbas. Apesar de ter sido anunciado que o corte de 3,9% deixaria de existir, Jorge Rita continua a defender que “em relação ao POSEI vamos sempre pretender que possa haver mais ajudas. Em relação ao segundo pilar, deve haver correcções, sabendo que o Estado-Membro tem um papel determinante pois o Comissário só dá o que tem. Se os Estados-Membros aumentarem as suas comparticipações, o Comissário sabe que o segundo pilar pode e deve ser reforçado”. Jorge Rita ressalvou que “quando se falar em coesão e convergência, não podemos só fazer o desafio à União Europeia” e incluiu o Estado-Membro Portugal na discussão pois “o desafio tem de ser feito em cada país internamente. Temos o desafio de perante o Estado-Membro perceber que não pode haver reduções, mesmo no segundo pilar”, destacou. No geral, Jorge Rita mostrou-se “muito satisfeito” com a visita de Phil Hogan aos Açores. Primeiro porque assim o Comissário Europeu conseguiu perceber “as nossas realidades” e depois porque “mostrou sensibilidade” perante o conhecimento da situação da agricultura na Região. “A sua vinda cá foi o maior marco da Agricultura nos últimos 20 ou 30 anos. Temos que registar com muito agrado esta sua passagem pelos Açores. Sentimos que o Senhor Comissário é um aliado dos Açores e sendo um aliado, nada melhor do que foi a demonstração evidente do trabalho que fez para que a posição em relação ao POSEI fosse invertida. Foi mérito do Senhor Comissário”, concluiu o Presidente da Federação Agrícola dos Açores. Fim dos cortes “foi uma notícia que deixou os açorianos todos em paz e este sector precisa de paz”, diz agricultor Muito antes da hora marcada, já a família Martins se dirigia para o pasto que tem a caminho das Cumeeiras nas Sete Cidades. Já antes tinham saído de casa nas Capelas e se tinham embrenhado nos caminhos agrícolas que servem a exploração, para irem de madrugada tirar o leite às 100 vacas que têm em produção. Na exploração familiar de Nuno Martins, é o pai que é proprietário mas a esposa é o braço direito, juntamente com dois dos filhos mais novos, Dora e João, que vivem a lavoura com “paixão e dedicação”. Nuno Martins conta que quando soube da visita do Comissário Europeu para a Agricultura e Desenvolvimento Rural, Phil Hogan, à sua exploração, toda a família pôs mãos à obra para pintar o edifício de apoio. Foi também com esse espírito que foi preparada uma mesa com produtos regionais e caseiros, incluindo “bananas biológicas” produzidas pela família, para mostrar a Phil Hogan “que temos muitos produtos regionais de qualidade”. À hora marcada a comitiva chegou e o Comissário Europeu fez questão de saber mais pormenores sobre a exploração. Nuno Martins contou que começou “esta vida quando o meu pai me deu seis vacas e um cavalo”. Hoje o cavalo não terá tanta utilidade como as carrinhas e tractores que actualmente são usados, e as 100 vacas em produção que se juntam a um total de “190 cabeças” dão bem conta da evolução. Ali todos ajudam “pai, mãe e filhos. Temos mais duas filhas que também colaboram, dois genros e dois netinhos que já vêm para as vacas”, refere Nuno Martins que diz orgulhoso que os dois netos “já andam por aqui connosco”. Dora e João Martins fizeram questão de se vestir a rigor fazendo Phil Hogan sentir algumas saudades de casa. É que os dois irmãos estiveram há cerca de um mês de visita à Irlanda natal do Comissário Europeu, onde fizeram questão de contactar com a agricultura e modo de produção local. À medida que se encaminharam para o local onde se encontravam os animais, Phil Hogan quis saber mais sobre a exploração e sobre a média de vacas por exploração nos Açores. Satisfeita a curiosidade, o Comissário Europeu foi encaminhado para a prova de produtos regionais fazendo questão de conversar sobre a visita dos dois irmãos à Irlanda, sobre o que viram e que explorações visitaram. Os produtos regionais foram bastante apreciados e Nuno Martins mostrou-se emocionado com a escolha da sua exploração para esta visita de um Comissário Europeu que veio efectivamente ver as dificuldades com que se debate a lavoura na Região. Um pasto no interior da ilha onde, num dia de nevoeiro e de vento, o frio aperta, foi o local ideal para se demonstrar como se encaminham as vacas de um pasto para o outro e como as condições climatéricas podem condicionar a recolha do leite. Para Nuno Martins a visita de Phil Hogan à sua exploração “foi um marco de uma vida inteira e o exemplo está à vista. Não se deve só a mim, mas a todos que acreditaram neste projecto que colaboraram comigo e ganham os Açores”, explicou. “O Comissário vir cá foi uma sorte que todos os agricultores gostavam de ter. O meu pai, o meu avô nunca tiveram essa sorte e eu tive. Agradeço a quem escolheu um agricultor com esta singeleza de produzir leite”, disse emocionado. Relativamente ao facto de não se concretizarem os cortes anunciados de 3,9% para o POSEI, Nuno Martins diz que “foi uma notícia que deixou os açorianos todos em paz e este sector precisa de paz e união das pessoas quando os próprios agricultores se viram uns contra os outros, devem pôr a mão na consciência. Somos todos responsáveis, não vamos enterrar uns para outros se salvarem sozinhos. Toda a gente se salva e assim ganham os Açores”, concluiu satisfeito.
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Autor: Carla Dias

Categorias: Regional

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